O centro de Goiânia para além do comércio
Diário da Manhã
Publicado em 26 de janeiro de 2018 às 01:47 | Atualizado há 4 meses
O bairro mais antigo de Goiânia, reconhecido por sua arquitetura em art decó, eventos, locais e fatos históricos determinantes para a construção da Capital, é também uma referência regional em comércio. O Setor Central é o bairro que tem a maior atividade comercial de Goiânia, segundo a Secretaria de Planejamento e Habitação (Seplanh). Em contrapartida, o Centro já deixou de ser um bairro populoso. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 1991, a população de Goiânia figurava na faixa de 900 mil habitantes, dos quais 26 mil estavam no Setor Central. Em 2010, quase 20 anos depois, a população da capital saltou para 1,3 milhão, enquanto o número de moradores do Centro regrediu para 24 mil.
De segunda a sexta, entre 08h e 18h, veículos e pedestres congestionam as principais ruas, avenidas e calçadas do Centro. Com prédios públicos importantes, estabelecimentos comerciais, feiras abertas, camelódromo e grandes vias de tráfego, a região atrai milhares de pessoas todos os dias. Fora do horário comercial, a violência toma conta daquelas ruas, avenidas e calçadas, outrora vivas e ocupadas, agora escuras e vazias. Enquanto a população de Goiânia cresceu 44% em 20 anos, o Centro teve 7% de queda no número de habitantes. O destaque, neste período, é para o Setor Bueno, que teve um crescimento populacional de 56%, saltando de 25 para 39 mil habitantes, de acordo com o IBGE.
O novo Plano Diretor Municipal (PDM) de Goiânia, que deve ser apreciado pela Câmara Municipal em fevereiro, prevê facilitações para construções no Centro, através da isenção das taxas urbanísticas. As principais são outorga onerosa, uso de solo e alvará. A ideia é que os empreendimentos residenciais sejam atraídos e, ao mesmo, o comércio local fortalecido. O PDM também garante, segundo o coordenador do projeto, o superintendente da Seplanh, Henrique Alves, a proteção do patrimônio histórico e cultural do bairro.
“Todo bem tombado vai ter no seu entorno uma área envoltória de proteção do patrimônio histórico. Não significa que a pessoa não vai poder construir, mas que ela vai ter algumas restrições de altura nesta área do entorno”, explica Alves. Construções localizadas nessas áreas envoltórias possuem um limite de altura que varia entre 6 e 9 metros. Na prática, os prédios não ultrapassaram dois pavimentos nestas áreas. A medida funciona para garantir a visibilidade e segurança dos prédios tombados.
O líder comunitário Senivaldo, integrante do projeto Viva o Centro, acredita que a principal deficiência do Setor Central é a falta de opções de lazer e cultura, sobretudo aos finais de semana e durante as noites, período em que a atividade comercial é, geralmente, restrita a bares e restaurantes. “Ficou uma característica do Centro como bairro comercial. Na hora que o comerciante baixa a porta, você não tem mais para onde ir, aí você precisa sair da sua casa para ir até o Novo Horizonte, Nova Suiça, para ir em um bar. O que a gente reivindica é que a Prefeitura estimule essas pessoas a fazer uso do centro também para que essa região aqui, que não são todos comerciais, boa parte são residenciais, possam usufruir desse processo”, afirma o líder comunitário, que participa de movimentos comunitários também na Cidade Jardim e, atualmente, mora no Centro.
Embora o Plano Diretor não seja responsável pela promoção de lazer e cultura, Henrique Alves, alega que a criação de novos empreendimentos residenciais irá aumentar, por consequência, as opções de recreação na região. “Automaticamente essa demanda vai crescer, como uma consequência natural, medidas culturais tanto na parte de empreendimentos privados de estabelecimentos voltados para a área de lazer e cultura como também ações por parte do poder público, como ampliação dos programas que já existem no Grande Hotel, dos mercados e do Teatro (Goiânia)”, analisa.
Já para Senivaldo, a prioridade não é aumentar a quantidade de moradores do bairro, mas sim de estimular os moradores do local com atividades culturais e de lazer. Ele lamenta a retirada da feira Hippie, na década de 90, da Avenida Goiás para a Praça do Trabalhador, mas ressalta a importância de novidades. “Se tiver ação de lazer, de cultura e outras ações tenho certeza que estimula as pessoas a descer dos seus apartamentos e ir para lá pra participar. Basta você ver a semana de natal na Praça Cívica para você ver a quantidade de pessoas que tem. Se você passar na Praça Cívica depois das 17h você vai ver a quantidade de pessoas que estão lá, fazendo uso da praça. Famílias com crianças, pessoas com patins, fazendo caminhadas diárias e ciclistas”, aponta o líder comunitário.
Henrique Alves assume que a deficiência do Centro está em não ser um bairro dinâmico, ou seja, não apresentar diversificação entre atividades comerciais e estabelecimentos residenciais. A aposta é que, com a aprovação do PDM, essa situação comece a mudar. “Estudos do Plano Diretor e da equipe de planejamento identificaram que a grande deficiência é que o Centro tem um comércio forte durante o dia, mas durante a noite ele pára. Acabou que ficou voltado para o comércio, principalmente de vestuario, e a gente quer tentar dinamizar mais o centro com essa iniciativa”, explica.
O PLANO
O Plano Diretor, que é de responsabilidade da Secretaria de Planejamento e Habitação (Seplanh), é um instrumento da política urbana que procura orientar a ocupação do solo urbano, a partir de interesses coletivos e mantendo a preservação da natureza, memória, patrimônios histórico e cultural. O PDM tinha previsão inicial para entrar em vigor no início deste ano, mas o prazo para ser entregue foi estendido para fevereiro, quando a Câmara Municipal volta às atividades normais e poderá apreciá-lo.
A sustentabilidade é a principal base do novo Plano Diretor. O maior desafio é quanto à crise hídrica, que se desencadeou na capital em outubro do ano passado. A primeira saída encontrada foi a restrição do rebaixamento permanente do lençol freático, que é prática comum na construção de edifícios. Nesses casos, o curso hídrico é rebaixado para que seja construído os pavimentos de subsolo. O novo Plano prevê que as construtoras utilizem técnicas de rebaixamento provisório do lençol freático, que funcione somente durante a execução das obras. Após a finalização, o curso hídrico deve ser reposicionado em seu local de origem.
Ainda no intuito, mesmo que distante, de construir uma cidade sustentável, o projeto pretende estabelecer Zonas de Proteção nas áreas de captação de água, que hoje estão concentradas nas bacias de São Domingos, João Leite (Sistema Muro Borges), Meia Ponte e Anicuns. O Plano Diretor estabelece um raio de proteção para preservação dessas regiões. O Código Florestal Brasileiro determina que essas áreas, chamadas de Área de Preservação Permanente (APPs) tenham um raio de 30 a 50 metros, a depender da largura do rio. Em Goiânia, essas medidas variam de 50 a 100 metros.
Para a construção do novo PDM, foram pesquisados Planos de outros municípios do Brasil, com destaque para as cidades de São Paulo, Campinas, Belo Horizonte e Salvador. São Paulo teve seu PDM aprovado em 2014 e, em Campinas, o projeto não registrou atrasos e foi aprovado no mês passado. Os pontos positivos encontrados nessas cidades foram adaptados para a realidade de Goiânia, de acordo com a Seplanh.