Concessão do Eixo Anhanguera apresenta termos ilegais, diz MP
Redação DM
Publicado em 17 de janeiro de 2018 às 01:34 | Atualizado há 7 anos
Na última quinta-feira, 11, o presidente da Metrobus, Marlius Machado, anunciou que está prestes a assinar um contrato de administração consorciada do Eixo Anhanguera. Em novembro, a promotora do Ministério Público do Estado de Goiás (MPGO), Fabiana Lemes Zamalloa, recomendou que o pacto não fosse celebrado por violar, em diversos pontos, a Constituição Federal e o Estatuto Jurídico das Empresas Estatais. A Metrobus se propôs a alterar alguns pontos, mas deixou outros com fragilidades. O mais crítico e ainda deficiente, para Zamalloa, é quanto à admissão de funcionários.
O documento determina que a contratação de pessoal seja feita diretamente pela Viação Reunidas, empresa que deve compor o consórcio. A admissão de funcionários pela Metrobus já é regida pela CLT, porém a estatal precisa se submeter a algumas normas do serviço público, como, por exemplo, recrutar funcionários mediante a realização de um processo seletivo e não de livre escolha, como acontece no setor privado. A estatal também não pode demitir funcionários sem justa causa, como as empresas privadas podem. A Metrobus é uma empresa pública de economia mista, onde 0,5% de suas ações são destinadas ao setor privado.
Em julho de 2016, a Metrobus anunciou concurso público que oferecia 238 vagas com salários que variavam de R$ 2,2 mil, para nível médio, e mais de R$ 7 mil para nível superior. Em setembro do mesmo ano, o edital foi suspenso e, em janeiro de 2017, cancelado. De acordo com comunicado da estatal na época, a medida fazia parte do plano de cortes de gastos do governo. A concessionária disse, então, que iria formalizar uma parceria público-privada, o que impossibilitaria a realização de concurso público para contratação de servidores.
O motorista do Metrobus, Alan Cruz, de 26 anos, qualifica o processo como “meia privatização” e acredita que a medida será ruim para funcionários e usuários do transporte coletivo. “Quem vai perder mais com a consolidação desse contrato vai ser o usuário, que vai estar na mão de 100% do monopólio existente na região metropolitana de Goiânia. Isso não é novidade para ninguém, hoje a única empresa fora desse sistema é a Metrobus. Eles já estão visando lá na frente para ter 100% do monopólio do transporte”, afirma o funcionário.
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários no Estado de Goiás (Sindittransporte), Alberto Magno Borges, disse que o Governo de Goiás garantiu que “não vai deixar nenhum concursado desamparado”. Magno Borges disse ainda que “não vê problema” na mudança da forma de contratação que o consórcio pode vir a estabelecer. “Hoje, o concurso público não dá tantas garantias, então não vejo muita diferença”, afirmou.
A previsão é de que os funcionários que cuidam da operação de plataformas e terminais sejam transferidos para outros órgãos do Estado e a Viação Reunidas faça a contratação direta de empregados para essas funções. Esse é um dos principais objetivos da Metrobus, já que a medida significaria um corte de gastos significativo para a estatal, que, segundo o presidente, Marlius Machado, chegou a um déficit mensal de R$ 2 milhões.
Segundo Alberto Borges, em repasse de reunião com o governo, os empregados seriam encaminhados para a Secretaria de Gestão e Planejamento (Segplan), que faria a distribuição desses funcionários em cada órgão. A promotora Fabiana Zamalloa alerta que o consórcio não pode transferir para uma empresa privada a obrigação da Metrobus de realizar contratos que, apesar de serem celetistas e, portanto, seguirem as normas de arrecadação da CLT, precisam acontecer via processo seletivo e seguir normas do direito público.
“O que eles pretendem é contratar integralmente no regime celetista por meio do consórcio. O contrato transfere a obrigação para o consórcio que, segundo cláusulas contratuais, não teria essas amarras de contratar o empregado da Metrobus com as limitações previstas pela Constituição Federal”, explica Zamalloa. A promotora adiciona, ainda, que os participantes do contrato questionam esse formato porque ele não alcançaria o objetivo principal do consórcio, que é a redução do custo operacional.
Alan Cruz, que trabalha na Metrobus há 1 ano e 6 meses, afirma que ainda não recebeu nenhuma informação concreta sobre o futuro dos funcionários, mas discorda do que tem sido cogitado. “Eles querem mandar os funcionários concursados efetivos à disposição e fazer recontratações através da CLT com essa empresa, a empresa Reunidas. É uma perda muito grande para os funcionários, tendo vista que, pela constituição, a estatal que deveria contratar e isso através de concurso público, que seria o mais interessante e mais viável para os colaboradores”, argumenta.
MUDANÇAS
A primeira proposta de contrato, apresentada em novembro, previa também a transferência de todos os bens da Metrobus para a Viação Reunidas, que faz parte da Companhia Metropolitana de Transportes Coletivos (CMTC). A Reunidas ficaria, inclusive, com toda a frota de veículos e as garagens. De acordo com a promotora Fabiana Zamalloa, a cláusula foi esclarecida e modificada e os bens adquiridos serão de posse do consórcio.
O acordo anterior também concedia à Viação Reunidas maior poder na tomada de decisões, incluindo a nomeação do presidente do Conselho Deliberativo, que decide pela contratação de empréstimos, alienação, vendas e transferências de ativos adquiridos. Em recomendação encaminhada em novembro, Fabiana Zamalloa, entendeu que isso configura ‘’submissão da estatal na administração do consórcio’’, que é inconstitucional. As cláusulas foram retificadas: o Conselho Deliberativo terá maioria da Metrobus e os bens adquiridos serão de posse do Consórcio.
Segundo o presidente da Metrobus, Malius Braga Machado, ‘’as despesas sobressaem o lucro’’ e a estatal tem um déficit mensal de R$ 2 milhões. Machado disse ainda que “a extensão do Eixo também colaborou com o afunilamento desse déficit”. O gestor se refere à ampliação do Eixo, que passou a interligar cidades da Região Metropolitana de Goiânia. O corredor, com a implantação de faixas exclusivas e semi exclusivas a partir do Terminal Padre Pelágio, no eixo Oeste, ganhou mais 16 quilômetros até Trindade. No eixo Noroeste, com mais 19km, interligou a capital com Goianira, ao longo da rodovia GO-070. Por fim, no eixo Leste, a partir do Terminal Novo Mundo, o corredor teve um acréscimo de 15km para interligar Goiânia com Senador Canedo. A extensão total da via atualmente é de 64 quilômetros.
“É muito bom você ter um programa social que liga as principais cidades da Região Metropolitana, mas triplicamos a quilometragem dos carros e continuamos recebendo a mesma receita. Uma série de fatores colaboram para o estado deficitário da empresa”, alega Machado. Atualmente, a empresa pública, que faz parte da RedMob Consórcio, é a responsável pela operação do Eixo. Com o novo contrato, a Viação Reunidas passará a ‘’compartilhar a gestão’’ da via com a Metrobus, que irá integrar o consórcio da Rede Metropolitana de Transportes Coletivo (RMTC). A Reunidas, além de atender o ramo rodoviário, faz parte da Companhia Metropolitana de Transportes Coletivo (CMTC).
De acordo com Marlius Machado, o déficit orçamentário da Metrobus é consequência de ‘’reajustes salariais, por força de Convenções Coletivas de Trabalho, aumentos de preço no combustível e outros insumos’’, afirmou o presidente por meio de sua assessoria. Apesar de a alta no preço dos combustíveis ser apontada como fator de endividamento, as empresas do transporte público possuem isenção do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Embora o preço dos combustíveis tenha oscilação diária, devido à política de preços da Petrobrás, no mês de dezembro as empresas pagaram, em média, R$ 2,45 pelo litro de diesel. O preço do diesel nos postos figurou em R$ 3,40.
O diretor da Viação Reunidas, Miguel ngelo Pricinote, disse que o objetivo do Consórcio é promover uma “associação para cuidar dos processos da garagem pra dentro”. A Reunidas ficaria responsável, segundo ele, por serviços como manutenção de veículos, compras de combustível e peças, além de recrutamento de motoristas. A Metrobus disse que, com a concretização do Consórcio “as empresas conseguirão colocar mais ônibus a disposição da população, com intervalos menores, cumprindo com efetividade as planilhas de horários”.
A ideia das empresas é que o Consórcio amenize, mas não resolva por completo a crise financeira. A perspectiva é de que o déficit mensal orçamentário caia para R$ 1 milhão. “O Consórcio não resolverá de uma hora para outra os problemas do transporte”, afirmou a Metrobus através da assessoria.
Quem vai perder mais com a consolidação desse contrato vai ser o usuário, que vai estar na mão de 100% do monopólio existente na Região Metropolitana de Goiânia”
Alan Cruz, 26 anos, motorista da Metrobus
O contrato transfere a obrigação para o consórcio, que não teria essas amarras de contratar o empregado com as limitações previstas pela Constituição Federal”
Fabiana Lemes Zamalloa, promotora do MPGO