Cotas vão contra Constituição
Redação DM
Publicado em 24 de janeiro de 2016 às 21:45 | Atualizado há 5 meses
Criada na tentativa de ampliar as oportunidades sociais e educacionais no Brasil, a Lei de Cotas nº 12.711 sancionada pela presidente Dilma Rousseff em agosto de 2012, vem lutando para ser precursora de mudanças na democratização do acesso ao ensino superior e na redução dos impactos da desigualdade social no país. É uma forma de reservar vagas para dar acesso a negros, índios, portadores de necessidades especiais, estudantes de escola pública e de baixa renda em universidades, concursos públicos e mercado de trabalho. Enquanto as discussões ganham proporção, a política de costas continua dividindo opiniões e sendo polêmica. De um lado, existe a defesa de que a Lei fere a autonomia e o princípio de igualdade. Do outro, estão os que acreditam na medida como ferramenta de integração social e combate a discriminação.
O juiz Adriano Dantas, da 8ª Vara do Trabalho de João Pessoa da Paraíba decidiu em sentença na semana passada que a aplicação da lei de cotas raciais em concursos públicos é inconstitucional. A informação foi publicada no site do Tribunal Regional do Trabalho da Paraíba. Segundo determina a Lei 12.990/14, 20% das vagas são reservadas a candidatos que se autodefinem pretos ou pardos.
Mas para o magistrado a determinação fere artigos da Constituição. Ele considera que a cota no serviço público envolve valores e pontos polêmicos que não foram discutidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF) quando tratou da legalidade da reserva de vagas nas universidades públicas. A sentença foi publicada no Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho da Paraíba e suscitou debate sobre o tema.
O professor de direito constitucional da PUC Goiás, Marcos César, disse que o sistema pouco corrige as desigualdades, mas explica que a política de cotas precisa ser avaliada em suas particularidades. “Acho difícil à correção da desigualdade. Mas, por outro lado, precisamos entender as variadas aplicações do sistema”, afirma. Segundo ele, o sistema de cotas colabora para a adoção de negros nas universidades públicas. “Nas universidades eu entendo que é louvável e que o sistema tem condições de modificar a nossa divisão de classe”, completa.
Pelo critério de descendência (negro, pardo, branco, índio), o professor garante que o sistema é falho. “O fundamental deveria ser o critério social de classes – se é pobre ou rico -, e não as condições de cor, orientação sexual e religião”, explicou. Para o professor Marcos César, as cotas para cargos públicos por questões sociais e raciais ferem princípios constitucionais. “Cotas para cargos públicos ferem princípios da Constituição, de eficiência, da moralidade e, mais que isso, distorce a finalidade de concursos públicos que é a capacidade profissional. Independente da cor e da condição social, o Estado precisa selecionar a pessoa para o cargo público pela sua capacidade”, afirmou.
O juiz Adriano Dantas também afirma que o sistema de cotas é discriminatório e viola princípios da Constituição. “É fundamental o recrutamento dos mais capacitados, independentemente de origem, raça, sexo, cor, idade, religião, orientação sexual ou política, entre outras características pessoais”.
Falta consenso
O modo como a sociedade e o governo devem tratar a questão, seja como sistema de cotas raciais ou outra proposta, ainda não é consenso no país. “Políticas públicas que beneficiam uma raça historicamente hostilizada gera extremo desconforto para a classe dominante. Soa como revoltante, absurdo ou privilégio. Nós sabemos que não. Só nós sabemos que não. Só queria deixar enfatizado que jamais quis algum sucesso promovido por redes sociais em cima de qualquer pessoa”, explica a estudante Lorena Cristina de Oliveira Barbosa, 20 anos, militante negra e aprovada com 920 pontos na redação pelo sistema de cotas para o curso de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Seu comentário rebatia críticas, realizado em redes sociais, contra o sistema e ganhou repercussão na mídia nacional na última semana ampliando o debate sobre o tema.
Sua resposta foi à estudante Bruna Terroni, que fez um comentário na internet contra a política de cotas, por não ter tido a mesma sorte que Lorena. Das 260 vagas oferecidas, ela ficou na 239ª colocação, e por conta das cotas, Bruna não irá para a Universidade Federal de Minas Gerais, que destina 50% das vagas para estudantes de escolas públicas. “Para o curso de Letras na UFMG há 260 vagas. Fiquei na posição 239. Mas não vou entrar por quê?”, questiona revoltada a estudante reprovada no processo.
Os movimentos sociais em prol de direitos humanos têm comemorado a aplicação da Lei de Cotas, e a consideram uma importante progressão para o país. O assunto sempre ganha destaque quando é debatido porque há divergências de opiniões entre especialistas do campo jurídico, universidades e instituições que trabalham com políticas de inclusão social.