Cotidiano

Dois séculos de atraso

Diário da Manhã

Publicado em 2 de março de 2018 às 01:10 | Atualizado há 4 meses

  • Banco Mundial aponta que o sistema de ensino levaria 260 anos para igualar o nível de qualidade de leitura dos estudantes brasileiros com o dos estudantes de países mais ricos
  • Pisa classifica o Brasil entre os cinco últimos das nações avaliadas no aprendizado em matemática, e entre os últimos oito colocados no ensino de ciências

O Brasil tem uma das pio­res qualidades no ensi­no educacional, de acor­do com o Banco Mundial e o Pisa (Programa Internacional de Ava­liação de Estudantes). O Brasil te­ria que levar mais de 260 anos para que a proficiência em leitura dos estudantes daqui seja a mesma da dos estudantes de países mais ri­cos e desenvolvidos. E mais outros 75 anos para que possamos empa­tar com essas nações em relação à matemática. Os países líderes são os asiáticos, com Cingapura à fren­te, enquanto o Brasil fica atrás de países como Costa Rica, Colômbia, Indonésia e Trinidad e Tobago. O país ficou na 63ª posição entre as 70 nações avaliadas nessa discipli­na, de acordo com os últimos da­dos do PISA, relacionados a 2015.

A prova é feita em países mem­bros da Organização para a Coo­peração e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e nações con­vidadas, entre elas o Brasil. Naque­le ano ciências foi o enfoque, mas também foram avaliados os apren­dizados em matemática e portu­guês. O país teve baixo desempe­nho em todas as disciplinas.

Fazem a avaliação estudantes entre 15 anos e 3 meses (comple­tos) e 16 anos e 2 meses (comple­tos) no início do período de apli­cação, que estejam matriculados em instituições educacionais lo­calizadas no país participante e que estejam cursando no mínimo a 7ª série/ano. No Brasil, o PisaA foi feito em 2015 com 23.141 estu­dantes, de 841 escolas das 27 uni­dades federativas do Brasil.

O mais preocupante é o nível de aprendizado médio dos estu­dantes nessa disciplina. Entre os avaliados, 81,96% ficaram entre o nível mais baixo de conhecimen­to e o nível 2 – o nível básico. A média da OCDE para esses gru­pos é de 46,04% no total. O nível 2 de aprendizagem em ciências é o mínimo necessário para se tor­nar um cidadão “crítico” e “infor­mado”, segundo a OCDE. Nesse nível, os estudantes começam a demonstrar as competências que vão permitir que eles participem “efetivamente e produtivamen­te” nas situações cotidianas rela­cionadas a ciência e tecnologia.

Consequentemente, o Brasil teve poucos jovens nos níveis mais altos de aprendizado (do nível 3 ao 6), enquanto nos países da OCDE são esses grupos que concentram a maior parte dos alunos. Uma das razões para esse baixo desempe­nho é a distorção aluno-série, ou seja, alunos que estão em séries inferiores às correspondentes para suas idades e que, portanto, apren­deram menos que os demais.

Para se ter uma ideia, em 2015, o Brasil foi o terceiro país com a maior taxa de alunos avaliados no PISA que afirmam ter repetido ao menos uma série no primário ou ensino fundamental (36,4%), atrás apenas da Argélia (68,5%) e Colômbia (42,6%). “O fato de nós termos 70% dos alunos abaixo do nível dois – considerado o nível mínimo – em matemática, 56% abaixo desse patamar em ciên­cias e 51% abaixo em leitura é uma preocupação imensa porque sig­nifica que o Brasil não melhorou a qualidade e a equidade do siste­ma nos últimos 13 anos”, diz Ma­ria Helena Guimarães de Castro, secretária executiva do Ministé­rio da Educação.

LEITURA

Já em leitura, o Brasil ficou en­tre os 12 piores países, com uma média de 407, bem abaixo da mé­dia de 493 da OCDE. Cerca de 20% dos estudantes de países membros da OCDE, em geral, não atingem o nível mínimo de proficiência em leitura. Em países como o Brasil, o Peru e a Indonésia, há mais alunos no nível mais baixo de proficiência que em qualquer outro nível.

Na média da OCDE, 80% dos estudantes chegam ao nível 2 ou mais. Em Hong Kong, mais de 90% dos estudantes ficam neste ou em níveis superiores. Já no Brasil, Peru e Indonésia, entre outros países, menos que um a cada dois estu­dantes ficam nesse patamar.

MATEMÁTICA

O pior desempenho geral do Brasil foi em Matemática, discipli­na em que aparece entre os cinco piores países, com uma média de 377 (ante uma média de 490 entre os países da OCDE). No país, 70,3% dos estudantes estão abaixo do nível 2 em Matemática, o mínimo neces­sário para que o aluno possa exer­cer plenamente sua cidadania. Em países desenvolvidos, como a Fin­lândia, essa taxa é de 13,6%.

O cenário é ainda mais desigual para as meninas, que tiveram um desempenho bem inferior que ao dos meninos nessa disciplina. Na média da OCDE, os garotos ficam cerca de oito pontos na frente das meninas. No entanto, um grupo de 28 países, entre eles o Brasil, Chile, Costa Rica, Alemanha, Ir­landa, Itália e Espanha, os rapa­zes superam as meninas em mais de 15 pontos. Em apenas nove paí­ses, entre eles Finlândia e Macau – que se destacam nos rankings -, as mulheres têm melhor desem­penho que os homens.

Nos dados divulgados pelo Mi­nistério da Educação (MEC) so­bre desempenho por estados no PISA, o Paraná apresentou o me­lhor desempenho (406 pontos) e Alagoas, o pior desempenho (339). Segundo o governo federal, os dados, no entanto, ficam com­prometidos pois o Paraná, bem como o Amapá, não atingiu a taxa de respostas exigida, prejudican­do, assim, uma análise fidedigna desses estados. Os dados reve­lam ainda que há grandes varia­ções de nível de proficiência entre as regiões do país. Por exemplo, enquanto 59,1% dos estudantes do estado do Espírito Santo estão abaixo do nível 2, em Alagoas esse percentual é de 83,2%.

DESIGUALDADE DE RESULTADOS

Para a secretaria executiva do MEC, o resultado geral do Brasil é alarmante, já que é inferior ao re­gistro de nações que investem me­nos que o país em educação. “Paí­ses como a Colômbia e o México, que tinham resultados similares aos nossos, nos deixaram para trás. Por­tugal e Polônia, que também esta­vam próximos, deram um salto de qualidade e superaram a média da OCDE”, diz Maria Helena.

De acordo com o ministério, é possível melhorar os números “se as políticas públicas funciona­rem”. Sobre a desigualdade inter­na, o estudo destaca que os núme­ros refletem as diferenças sociais e econômicas nas regiões do país. Enquanto o Espírito Santo foi o destaque positivo de 2015, Ala­goas amargou a “lanterna” do ran­king. “Alagoas, Bahia e Maranhão são os estados que apresentam o resultado mais decepcionante. Não podemos continuar repro­duzindo essa desigualdade”, afir­ma a secretaria executiva da pasta.

SOLUÇÕES

Como possível solução, Ma­ria Helena acredita que é pre­ciso atualizar a base curricular comum por ser essencial à qua­lidade e à equidade do sistema. “É preciso investir na formação dos professores, nos materiais de apoio, nos materiais didáticos e nas plataformas digitais”, afirma. Além disso, a secretaria executiva do MEC destacou que os núme­ros do estudo da OCDE reforçam a necessidade do estabelecimen­to da reforma do ensino médio.

“O que esses materiais indicam é que os alunos não têm aprofun­damento em nenhuma área. O que estamos propondo com a re­forma do ensino médio é garantir uma base curricular nacional co­mum, que vai melhorar a qualida­de do conjunto do sistema de ensi­no fundamental e médio, além do aprofundamento nas áreas e estu­do para que o aluno possa conti­nuar sua formação geral e apren­der mais”, diz Maria Helena.


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