Feminismo x Machismo: entenda a complexidade dos temas
Diário da Manhã
Publicado em 12 de julho de 2018 às 01:38 | Atualizado há 4 meses
A conjuntura atual exige que estejamos em sintonia com temas atualizados como conceitos que definem o comportamento social como o feminismo e o machismo. Muitos se justificam usando a nomenclatura, mas, na verdade, não entendem o tema. Confira o que estas palavras significam e como podem servir para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.
ENTREVISTA–GLÁUCIA MARIA TEODORO REIS
O que é feminismo?
Feminismo é a luta pelo direito de igualdade entre homens e mulheres. É importante dizer que feminismo não se contrapõe ao machismo. Machismo é uma questão cultural, uma questão que prega simplesmente o ódio. O feminismo, ao contrário, prega a igualdade de gêneros. Estamos em um período em que muitas pessoas refutam a palavra feminismo, porque entendem que as mulheres querem se sobrepor aos homens ou que as mulheres estão fazendo apologia a outras questões como por exemplo à orientação sexual. Feminismo é a busca de igualdade de direitos, o que estamos ainda muito longe de alcançar. Sobre a igualdade de direitos entre homens e mulheres no Brasil principalmente, mas também em outros países, vivenciamos uma série de desigualdades, como por exemplo a desigualdade salarial, de direitos em relação a muitas legislações, etc. Mesmo que nós tenhamos uma constituição moderna, elaborada em 1988, que estabelece que homens e mulheres são iguais perante a lei, ainda as mulheres têm dificuldade de ocupar espaços de poder. As mulheres no Brasil tem uma representatividade no parlamento em torno de 10%, seja ela na Câmara Federal e nas Assembleias dos Estados federados. A participação no executivo é ainda menor. Goiás, por exemplo, nunca teve uma mulher eleita governadora. Temos uma Senadora mulher, o que sobe a nossa participação para 19%. Mas isso, no contexto do país, gira em torno de 10%. Se continuarmos nesse ritmo, apenas alcançaremos a igualdade de gênero em 100 ou 200 anos, dependendo da instituição, seja na Câmara dos Vereadores ou Federal. Enfim, precisaremos ainda de muitos anos de participação. E a lei de cotas em relação à participação no processo eleitoral, garante apenas a inscrição partidária do partido ou das próprias coligações. Então, a lei colocou um dispositivo que falava que há a necessidade de 30% de participação feminina nas chapas que concorrem ao pleito eleitoral, não no pleito eleitoral. Dessa forma, a regra geral contempla os homens, ou seja, 70% das vagas é masculina, embora a lei não fale em homens ou mulheres, mas participação entre os sexos. Nós ainda temos um processo eleitoral extremamente machista, além do que o processo eleitoral é determinado pelos caciques de todos os partidos. Isso ocorre tanto nos partidos de direita como de esquerda. Eles conseguem a cota de participação mínima das mulheres, e muitas vezes não apoiam as candidaturas femininas. Há uma prática machista sim no processo eleitoral brasileiro. Nas outras instituições, como o poder executivo, basta nós olharmos a composição, seja dos ministérios ou do secretariado. Quando eu fui Secretária de Políticas Para as Mulheres, eu era a única mulher do secretariado. Obviamente, numa Secretaria da Mulher, não seria colocado um homem, embora agora esteja um homem à frente da Secretaria da Cidadania, que se chama Secretaria da Mulher, do Trabalho, dos Direitos Humanos e Assistência Social, ou seja, é um homem ocupando uma Secretaria da Mulher. E no judiciário, a mesma coisa. A proporção nos tribunais superiores é mínima: no Supremo Tribunal Federal são 9 homens e 2 mulheres. Nos demais tribunais superiores ocorre o mesmo. O último exemplo foi o processo do quinto constitucional do Tribunal de Justiça de Goiás. A vaga foi preenchida por um homem. No judiciário, há o concurso público para ascensão ao cargo de juiz. Desta forma, está se igualando o ingresso de mulheres tanto no Ministério Público como no Judiciário. O número de mulheres advogadas é maior do que o de homens. Nunca tivemos uma mulher presidente da OAB/Go. De modo que nos três poderes, a participação da mulher é mínima, nos espaços superiores. Nos espaços intermediários ainda ocupamos cargos fundamentalmente pela nossa competência, e no ingresso por concurso público, somos a maioria. O número de mulheres matriculadas nas universidades é maior do que o dos homens nos cursos de graduação, nos cursos de pós-graduação, mestrados e doutorados. De outro modo, não há muitas reitoras no Brasil. As mulheres estão estudando mais, o que é comprovado por dados, inclusive na graduação. Então, por que nos espaços de poder somos ainda uma minoria ínfima? O Brasil, estatisticamente em colocação de espaços de poder, perde para países considerados machistas como a Turquia, onde as mulheres, mesmo de burca, vão para o Congresso e têm uma participação maior. O Brasil é um dos últimos da América Latina na participação especialmente no parlamento. Isto está relacionado ao machismo, que é um processo cultural que ainda se encontra nas famílias, nas escolas ou nas instituições públicas. Goiás é um estado extremamente machista, e dentro disso, chegamos a um processo extremo de violência contra a mulher, quando o homem brasileiro ainda se sente o proprietário dela.
Como está o feminicídio em Goiás?
Goiás ocupa o 3º lugar em feminicídio do Brasil, e o Brasil é o 5º do mundo.
O que é feminicídio?
É um crime que foi tipificado recentemente e que tem relação com o gênero. Por exemplo, se uma mulher for assassinada por latrocínio, que é o roubo seguido de morte, não é feminicídio. O feminicídio ocorre simplesmente pela sua condição de mulher, ou seja, ela é assassinada por ser mulher. Isso se torna um agravante para um homem que mata mulheres. Demonstra que houve uma necessidade de tipificar um crime tendo em vista o grau de regularidade e violência que a mulher sofre. O feminicídio é o último grau da violência doméstica. Mas a violência contra a mulher não se resume à violência física. Existe a violência moral, patrimonial, psíquica, a sexual e a morte (feminicídio). A lei Maria da Penha classificou todos esses tipos de violência, mas como ela não deu a nomenclatura ao feminicídio, veio uma lei própria para tipificar.
A lei Maria da Penha tem efetividade?
Pouca. É preciso que as instituições se unam para promover de fato uma proteção à mulher de acordo com o que a lei preconiza. A lei determina que devem haver varas específicas de atendimento à mulher e o executivo tem que ter os centros de apoio à mulher, mas tudo isso ainda é muito inicial dentro das instituições públicas. Na verdade há avanços. Hoje o judiciário tem uma comissão de enfrentamento à violência doméstica. Cada Tribunal de Justiça dos Estados tem. Outrora esse assunto não era tratado, que dirá dentro de um tribunal. Mas ainda precisamos da implantação de muito mais políticas públicas.
Por que a mulher não reage nos casos de violência física?
Há um grau de violência psíquica e moral enorme nas famílias. Por exemplo: se a mulher sofre uma violência física, por que ela não sai de casa? Porque ela tem filhos. E esse agressor, na maioria das vezes, faz ameaças, como “se você sair de casa eu mato você e mato os filhos”. Outrossim, muitas dessas mulheres não têm condições econômicas para sair de casa.
O que você pode dizer sobre a liberdade econômica da mulher?
É um dos pontos em que a política pública precisa abranger, no sentido de garantir salários iguais, a proteção contra a violência e criar condições de trabalho e boas condições para a garantia dessa autonomia econômica através de um processo de capacitação. Quando eu fui secretária, vivenciei esse processo muito de perto na secretaria que geri. O governo federal tinha uma proposta muito boa em todas essas áreas a que eu me referi, e criou um fórum de gestoras em todo o Brasil. Havia um propósito de implementação de políticas públicas para as mulheres, mas no governo Temer acabaram todas. E isso interrompe um processo de avanço para as mulheres.
Poderia citar algumas das políticas públicas para as mulheres?
O Centro Municipal de Educação Infantil (Cmei), por exemplo, que substitui a creche para crianças de 0 a 5 anos, ajuda as mulheres a irem para o mercado de trabalho. Saúde da mulher, educação dos filhos, creches, são políticas transversais que uma secretaria de política para as mulheres têm que atuar, seja no plano federal, estadual ou municipal. Há que se ter uma articulação dentro da estrutura de Estado para fazer essa transversalidade. A questão da saúde da mulher é tratada na secretaria da saúde, mas é importante que uma secretaria de política para as mulheres fomente essas políticas para que haja toda uma estrutura de estado, tendo em vista a especificidade das políticas para as mulheres.
Existe machismo institucional?
Sim, e é grande. Como Secretária da Mulher, eu mesma sofri essa violência. Eu vivenciei o machismo institucional porque era considerada uma Secretária de menor importância dentro desta estrutura de poder.
O que você tem a dizer sobre o conceito religioso da afirmação bíblica de que a mulher tem que ser submissa ao marido?
Eu não sou vinculada a nenhuma religião, mas já ouvi as duas polaridades sobre essa questão. Existem estudiosos da Bíblia que falam que Jesus sempre pregou a igualdade entre as pessoas. Então, esta questão da submissão, se está de fato colocada, é dentro de um contexto que deve ser analisado. O que eu vejo de nocivo dentro do contexto religioso é um fundamentalismo conservador que tem avançado nos dias de hoje, não só no Brasil mas no mundo todo, onde igrejas extremamente conservadoras fazem apologia ao machismo dentro delas, ou seja, que a mulher tem que se submeter a todos o tipos de humilhação dentro de uma vida em casal. E o mais importante que eu acho quando falamos em violência contra a mulher, seja qualquer tipo, e humilhação é uma violência, é que ela interfere em toda família. A violência contra a mulher é uma violência intrafamiliar. Os filhos sofrem e geralmente esse machista reproduz essa cultura inclusive em mulheres.
Há mulheres machistas?
Não considero que há mulheres machistas, mas considero que existem mulheres que reproduzem uma cultura machista na educação dos seus próprios filhos, quando ela não enxerga que homens e mulheres têm os mesmo direitos, quando desde a educação do bebê ela começa a distinguir pela própria cor: rosa é de menina, azul é de menino. Isso vai colocando dentro da própria família uma educação sexista. A luta é por uma educação não sexista. Até os brinquedos são distintos entre homens e mulheres. A mulher recebe toda uma carga de machismo dentro da própria casa. Então quais são os brinquedos? Fogãozinho, vassourinha, liquidificador e bonequinha. Qual a mãe que presenteia com uma boneca o seu filho homem? E ela tem medo, pois acha que se der uma bonequinha para o seu filho, ele vai virar ‘gay’. Sabemos que ninguém vira nada. A questão LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais ou transgêneros) trata-se de uma orientação sexual. E ademais, ela teria sim que colocar um bebezinho para essa criança brincar, independente do sexo. E se for menino, para despertar o instinto paterno dele, para que ele se torne um pai melhor promovendo uma educação não sexista dentro da casa. Hoje eu vejo que se nós não trabalharmos a família e as escolas, não venceremos essa cultura machista. Por mais que tenhamos delegacias, várias especializadas de enfrentamento à violência doméstica, centros especializados de atendimento à mulher, ainda estaremos correndo atrás da violência. Para que haja uma prevenção à violência contra mulher temos que trabalhar com crianças e adolescentes e com as famílias.
Isso é fundamental. Na época que eu estava à frente da Secretaria da mulher, nós criamos um projeto que chamava “Cidadania e Direitos Humanos”. Este projeto visava fomentar discussões nas escolas sobre igualdade de direitos, sobre a violência doméstica e sobre outras questões relativas às mulheres, como bullying por exemplo. Infelizmente não conseguimos implementar, porque políticas públicas para as mulheres ainda não são vistas como prioridade nos governos.
A mulher por ser mulher já sofre um preconceito de gênero?
Sim, isso se chama sexismo. A mulher por si só já sofre, apenas pela sua condição de mulher.
E a mulher negra?
Ela sofre duplamente: ela sofre o sexismo e o racismo. A mulher negra sofre o racismo muito mais intenso do que o homem negro, pelo fato dela ser mulher e pelo fato de muitos homens colocarem no seu imaginário que a mulher negra é sexualmente mais interessante, etc. E a mulher negra e pobre, sofre também em razão da classe social. E também é bom que se mencione as mulheres lésbicas e as mulheres trans ou as travestis, que sofrem mais ainda preconceito e discriminação ao longo de sua vida.
A legislação de proteção às mulheres funciona?
As pessoas acham que a legislação que pune o agressor não adianta porque há uma cultura introjetada nesse aspecto. Mas adianta no sentido que nós temos uma lei que nos protege. Desta forma, se a pessoa for enquadrada, a vítima tem a lei a sua disposição. Por isso é importante a garantia da legislação no sentido de resguardar mulheres vítimas de violência doméstica e leis que garantam cotas eleitorais. São leis importantes que precisam ter a garantia da aplicabilidade. A lei Maria da Penha tutela vários setores, inclusive preconiza que se trabalhe com os agressores. Em Goiás, fizemos um trabalho que se chamou ‘grupo reflexivo dos autores dos crimes de violência doméstica’. Eram encontros semanais direcionados para pessoas encaminhadas pelas varas criminais do Tribunal de Justiça que haviam sido sentenciados por violência doméstica. Na própria sentença havia a determinação de que eles participassem desses grupos. Esse grupo tinha em torno de 300 homens e apenas 3 rescindiram ao crime. O crime da violência rescinde: o homem começa com a violência moral e vai até o feminicídio. Implantei o programa por determinação da Lei Maria da Penha que previa que o trabalho com os agressores deveria ser feito, com a instituição pelo poder público de políticas de proteção às mulheres, a participação do Ministério Público no processo posterior às delegacias, com a participação dos juízes, enfim, a Lei Maria da Penha determina que todas as instituições participem, cada uma na sua competência, no intuito de se reduzir a violência doméstica.
A feminista é femina?
De fato já escutei muitas mulheres dizendo a seguinte frase: “eu não sou feminista, sou feminina”. Isso não tem nada a ver. Já ser feminina, vai na subjetividade da mulher, se ela quer usar brinco ou anel, ter cabelo comprido ou usar o que a mídia determina, ou estar na moda, imposta pela conjuntura, etc. O conceito de ser feminina se encontra dentro da subjetividade da mulher. Mas uma coisa é certa: ser feminista é buscar direitos iguais, é entender que homens e mulheres têm os mesmos direitos.
Feminismo é a luta pelo direito de igualdade entre homens e mulheres. É importante dizer que feminismo não se contrapõe ao machismo. Machismo é uma questão cultural, uma questão que prega simplesmente o ódio”
ENTREVISTA–MARCOS ELIAS MOREIRA
O que é machismo?
A sociedade humana tem certas características de uma dimensão cultural que delimita, que define padrões de comportamento, padrões de interação de relacionamento entre as pessoas e são esses padrões e delimitações com características culturais é que explicitam comportamento dentro da sociedade. O machismo foi um formato construído de relações humanas de padrões de comportamento definidos que pressupunham uma expectativa cultural de comportamento entre homens e mulheres nesta sociedade onde o poder ficava concentrado com os homens e caberia à mulher certos papéis, certos comportamentos que tinham uma importância. No entanto, esses comportamentos, essas ações, eram delimitadas pelo poder masculino. O poder de decisão, de implementação das coisas concentrava-se no homem, e esse padrão de comportamento construído, ele pressupôs inclusive a ausência da mulher de certos espaços. À mulher foi negado, por exemplo, o acesso a determinados conhecimentos, o que implicou em certas dificuldades, como a da mulher ter acesso à educação. Então esse padrão de comportamento construído em uma sociedade que tinha certas características econômicas, sociais e culturais, no mundo contemporâneo, foi colocado em cheque, e há, portanto, toda uma movimentação no sentido de superação do chamado machismo. E essa movimentação, como em tudo na sociedade humana, dado a sua complexidade, dado a uma série de aspectos intrínsecos aos processos sociais e culturais, não é uma mudança que acontece num piscar de olhos. Não acontece como por milagre onde você tem, até um determinado momento, um padrão x de comportamento, e partir da hora tal, do dia tal, você tem um padrão y. O processo é mais complexo e envolve idas e vindas, envolve sobretudo mudanças de pensamento e isso demora gerações. Então o que nós estamos assistindo no momento é um processo onde aquele padrão de comportamento construído em torno do machismo foi colocado em cheque e um novo padrão de comportamento que pressupõe a igualdade entre homens e mulheres ainda não está consolidado. É toda uma construção que envolve uma queda de braço entre valores e cultura tradicional e entre valores e cultura inovadora, transformadora, que é o momento pelo qual estamos passando. O de uma transição entre uma sociedade que era profundamente machista e uma que é a nossa expectativa,ou seja, igualitária.
Sobre a diferenças físicas entre homens e mulheres, o que tem a dizer?
Eu não desconheço a existência de diferenças biológicas entre homens e mulheres. Aliás, é óbvio que existem. O que não se pode, dada essas diferenças biológicas, naturalizar determinadas situações que são sobretudo situações sócio-econômicas e culturais, ou seja, ter como natural certo exercício do poder, certo impedimento da presença feminina em diversos espaços, em diversas instâncias de decisão como sendo fruto de processos biológicos onde a bem da verdade, são fruto de processos econômicos e culturais e que exigem um tratamento a partir desta ótica. É preciso portanto, incorporar às mulheres, aos processos produtivos, não simplesmente com viés econômico, mas com o viés inclusive de produção da cultura, da constituição e da estruturação de todas as situações econômicas, bem como culturais, que caracterizam a sociedade humana.
Há como rotular o machismo a ponto de criminalizar comportamentos machistas?
A dimensão legal é importante num processo de superação de qualquer situação cultural ou econômica da sociedade humana. Há que se trabalhar com a questão da legalidade. Portanto, a existência de leis que assegurem direitos e a existência de leis que punam quem não garante esses direitos é uma possibilidade que pode e que deve ser utilizada no processo de superação de situações como a do machismo. O que nós não podemos ter é a ilusão de pura e simplesmente que, através do viés da legalidade, faremos uma mudança que tem um viés cultural. Essa mudança de cunho cultural precisa ter como basilar, para além das questões legais, a vida humana em sociedade. Ela tem uma dimensão, e essa dimensão tem uma influência central no processo educativo que é básico para qualquer mudança, para qualquer alteração deste tipo. Então, não se pode pensar em uma superação de uma sociedade machista pura e simplesmente pela legalidade. Repito: ela é importante. No entanto, é preciso, pelo processo educacional, pelo processo de construção das relações culturais e humanas, fazer esse processo de forma gradual, possibilitando conquistar os espaços de poder para que as mulheres não continuem sendo discriminadas a partir de conceitos, a partir de elementos do machismo tradicional. Há dimensões que são da legalidade e há dimensões que são da cultura. Nós assistimos, ao longo do século passado, sociedades que tiveram governos com legislação que assegurava de forma muito peremptória esta questão da igualdade entre homens e mulheres e que findo aqueles governos, regrediram. Temos o exemplo da Rússia. Se você não tem uma dimensão de que a igualdade é um processo de construção para além do aspecto pura e simplesmente legal, você não supera conceitos machistas incrustados sem processos de mudanças sociais e culturais cujo processo não se dá por uma questão de legalidade. Eu entendo que uma mudança dessa dimensão de superação de uma sociedade machista e construir uma sociedade de direitos iguais entre homens e mulheres não se dá e nem se dará num processo de uma única geração, sobretudo processual, e aí nós teremos que recuperar o que era o final do século XIX e o que é o início do século XXI, nós temos claro que pelo menos em certas sociedades como a brasileira, nós tivemos avanços absolutamente significativos nessa área. Se pagarmos certos países do oriente,certos países da Ásia, certos países da África, com uma ou outra exceção nos países do chamado ocidente, mas principalmente naqueles países constatamos países que, se é que houve avanços nestas questão do combate ao machismo, esse avanço é quase imperceptível.
Homens e Mulheres são iguais?
Nós temos diferenças físicas, que são as biológicas. A questão, na dimensão do que estamos discutindo aqui é a igualdade do ponto de vista político. Do ponto de vista político, não há dúvida de que homens e mulheres são iguais, e essa dimensão da igualdade, na dimensão que ela deve ser pensada, em conformidade do pensamento mais contemporâneo, é uma igualdade que reconhece a diversidade e que pensa muito na equidade. Portanto é preciso pensar que há determinadas situações em que aspectos físicos e biológicos, jogam no sentido de facilitar ou dificultar determinado tipo de presença ou atividade que nós precisamos trabalhar socialmente, como a igualdade de oportunidades, de saber respeitar a diversidade. Se eu digo que há diferenças, eu digo que se pegarmos somente os homens, observamos que há profundas diferenças entre homens com capacidades diferentes, com habilidades diferentes, e a mesma coisa se dá entre mulheres, e se dá ainda mais quando envolve homens e mulheres. Então a sociedade por excelência tem uma diversidade que quando falamos em igualdade, as pessoas imaginam uma igualdade que não existe no mundo real. Ela é portanto, segundo o que eu estou trabalhando, uma igualdade política que pressupõe a diversidade e portanto vê que há possibilidades, que há capacidades diferentes, habilidades diferentes, e essas capacidades, habilidades, essas diferenças não se dão simplesmente entre homens e mulheres mas do conjunto desta sociedade, e o que enriquece essa sociedade é exatamente essa diferença ou essa diversidade. Agora, o que nós precisamos de fazer é um esforço social e cultural no sentido de assegurar a equidade, reconhecendo a existência dessa diversidade e diferenças.
Há um conjunto de conflitos que caracterizam toda e qualquer sociedade humana. A questão que precisamos discutir e verificar é se o apelo à violência é a forma de equacionar essas violências. Me parece que a trajetória da história humana tem demonstrado que paulatinamente está sendo superada esse formato de resolução de conflito como o adequado. E aí, o que caracteriza a própria instituição da sociedade humana é a capacidade da política, e a política não é outra coisa senão a solução dos conflitos pela intermediação, pelo diálogo, pela construção de pontes, e isso eu acredito que não só é possível mas deve ser feito, não só nas questões macro, relativas ao poder e ao Estado, mas também nas relações pessoais e em especial nas relações de casais, o que não justifica em absoluto a utilização de violência como forma de equacionar, de resolver conflitos.
A construção de uma sociedade justa e fraterna entre homens e mulheres não é uma construção fácil, mas a trajetória histórica humana demonstra que é aquela que melhor constrói uma sociedade onde seja garantida uma vida de qualidade para se alcançar a felicidade. Esse é o caminho. Quanto mais construirmos saídas neste sentido, com essas características, assim estaremos transformando a sociedade, e mais felizes serão aqueles que convivem nesta sociedade.
A questão LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais ou transgêneros) trata-se de uma orientação sexual”
O que eu vejo de nocivo dentro do contexto religioso é um fundamentalismo conservador que tem avançado nos dias de hoje, não só no Brasil mas no mundo todo, onde igrejas extremamente conservadoras fazem apologia ao machismo”