Cotidiano

Governo Lula estuda criar nova categoria de organização criminosa e agência nacional antimáfia

DM Online

Publicado em 27 de maio de 2025 às 22:50 | Atualizado há 1 dia

O governo Lula (PT) deve apresentar nos próximos meses um projeto de lei para mudar a classificação de organizações criminosas no país. O texto, chamado por autoridades e especialistas de Lei Antimáfia, prevê inclusive a criação de uma agência nacional que coordene o combate ao crime organizado.
Apesar do apelido do projeto, o termo “máfia” não aparece no projeto, segundo o assessor especial da Secretaria Nacional de Segurança Pública, João Paulo Martinelli. A expressão usada no texto é “organização criminosa qualificada”.
Na versão atual, essas organizações qualificadas se diferenciariam de quadrilhas convencionais quando exercem domínio sobre um território, controlam atividades econômicas locais, influenciam eleições e fazem lavagem de dinheiro.
O uso de intimidação para silenciar moradores e impedir investigações também é uma dimensão que será levada em conta na definição das máfias, segundo o secretário.
Martinelli deu alguns detalhes do plano nesta terça-feira (27) durante o 2º Seminário Internacional de Segurança Pública, Direitos Humanos e Democracia, promovido pelo Iree (Instituto de Reforma das Relações entre Estado e Empresa) e pelo IDP (Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa).
“A gente tem um dispositivo nesse projeto que diz respeito a prisão preventiva. Quase tudo diz respeito a mediar cautelares patrimoniais”, afirmou Martinelli. “Precisamos mudar essa cultura de só correr atrás de autoria e materialidade, e atrás do patrimônio.”
Segundo o assessor, uma minuta do projeto está atualmente no gabinete do ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, para análise. Uma vez aprovado por ele, o texto deve ser enviado para a Casa Civil e, então, para o Congresso Nacional. O plano inicial é que isso aconteça até o fim de junho.
No projeto, deve constar um artigo que cria uma agência nacional de combate ao crime organizado. Ainda não está definido se o funcionamento desse novo órgão será definido por meio de portaria do ministério ou decreto do presidente.
Martinelli diz que a criação dessa agência “pode mitigar a falta de integração” entre polícias e outras instituições que integram o sistema nacional de inteligência.
Entre os principais objetivos do projeto está o aumento de pena para lideranças de grandes facções criminosas, como PCC (Primeiro Comando da Capital) e Comando Vermelho, e dar um tratamento mais eficiente ao dinheiro e ao patrimônio apreendido com membros de organizações criminosas.
Outra preocupação do governo é permitir, com maior segurança jurídica, a revogação de contratos públicos de maneira cautelar, a partir de evidências de envolvimento de concessionárias ou fornecedores com organizações criminosas —aos moldes do que foi feito com duas empresas de ônibus na cidade de São Paulo, a partir da Operação Fim da Linha.
Há a previsão, por exemplo, de agravantes na pena para casos em que se comprove corrupção de agentes públicos, segundo Martinelli. Além disso, há também a ideia de que juízes possam nomear administradores judiciais para empresas com atividade lícita que tenham suspeita de envolvimento com o crime organizado.
O tema foi debatido em vários painéis do evento. Alguns especialistas alertaram para o risco de banalização do termo e de excesso na perseguição contra empresas que têm atividade lícita mas receberam dinheiro do crime pontualmente, em alguns casos sem saber da origem ilícita de pagamentos —é consenso entre estudiosos do tema que essas organizações atuam também no mercado formal.
“Se nós chamarmos tudo de máfia, nada vai ser máfia”, afirmou o ex-deputado Marcelo Freixo (PT), hoje presidente da Embratur.
Freixo disse estar aberto ao debate sobre a classificação de algumas organizações criminosas como máfia, mas alertou que há grande diferença na atuação de facções e milícias, por exemplo.
Durante o painel, Martinelli disse a Freixo que o governo está atento ao risco de banalizar o termo e que tem tomado precauções contra isso na redação do projeto. Ele sugeriu a possibilidade, inclusive, de revogar o crime de milícia pois, segundo ele, “milícia é uma espécie de organização criminosa qualificada”.
“É muito preocupante quando se começa a expandir as fronteiras dessa organização criminosa para todo e qualquer sujeito que tenha com ela feito um negócio, prestado um serviço, ainda que ilícito”, disse o advogado criminalista Fábio Tofic Simantob. “É preciso que haja uma demonstração clara de um conhecimento e de uma intenção de ser membro daquela organização.”
Um dos idealizadores do projeto, o promotor Lincoln Gakiya, do Ministério Público de São Paulo, afirmou que a legislação é necessária para combater o crime organizado com mais eficiência.
“Daqui a dois ou três anos vamos ver empresas ligadas ao PCC disputando grandes licitações públicas e ganhando, porque aí a concorrência é desleal” alertou Gakiya. “A legislação é necessária, mas entendamos que a gente também vai defender as empresas lícitas, os empresários de bem.”
“A gente quer separar o joio do trigo e tratar de maneira desigual os desiguais”, afirmou.

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