Jornalistas dão adeus a Armando Acioli
Diário da Manhã
Publicado em 23 de fevereiro de 2017 às 01:59 | Atualizado há 4 meses
Faleceu em Goiânia ontem, pela manhã, de insuficiência cardíaca, o jornalista, poeta e advogado Armando Acioli. Nascido em 1934 na cidade alagoana de Murici, registrado como Armando Calheiros Acioli, veio para Goiânia no final da década de 40, do século passado, quando seu pai trouxe a família para, primeiro, Ipameri, depois para Goiânia, ainda em construção e atraindo gente de toda parte do Brasil, que para cá vinha em busca de sonhos.
Acioli estudou no tradicional Lyceu de Goiânia e cursou Direito na Faculdade de Direito da UFG, a “vetusta”, assim apelidada por ter sede em um altaneiro sobrado da Rua 24, Centro. Armando formou-se em l964. Logo depois foi nomeado consultor jurídico da Assembleia Legislativa do Estado de Goiás.
Armando dava expediente pela manhã no Palácio Alfredo Nasser como consultor, mas, à tarde, cobria as sessões plenárias para O Popular, em cuja redação, à noite, redigia reportagens e artigos de opinião.
Foi muito amigo do fundador de O Popular, o jornalista e político Jaime Câmara. Em seu livro, intitulado Lulo-petismo, coletânea de artigos publicados naquele diário, Armando fala com carinho e saudade do velho amigo e antigo patrão.
Armando aposentou-se do serviço público por invalidez, após 30 anos de serviços prestados. Ele teve problemas cardíacos e precisou pôr uma ponte de safena no coração. Continuou, porém, escrevendo artigos para O Popular. Aposentando-se por tempo de serviço, nem por isso ele deixou de trabalhar. Duas vezes por semana ele ia à redação para redigir seus artigos. Poderia escrevê-los em casa, remetê-los por e-mail. Preferia redigi-los na redação do jornal. Adorava o convívio com os colegas, o ambiente de jornal, as discussões animadas.
Por solicitação do deputado estadual Carlos Antônio (PSDB), os parlamentares fizeram um minuto de silêncio durante a sessão ordinária de ontem em memória de Armando Acioli. Ao usar da tribuna, o deputado Manoel de Oliveira (PSDB) prestou condolências aos familiares do jornalista Armando Acioli. Manoel de Oliveira lembrou da trajetória do colega Armando Acioli, com quem, afirmou, “tive a honra de trabalhar e aprender.”
O jornalista Helton Lenine Oliveira, da Editoria de Política do Diário da Manhã, foi colega de Armando Acioli em O Popular, na década de 80. “Armando foi um profissional extremamente ético, com elevada sensibilidade na abordagem de temas sociais. Não gostava de bajular os detentores do poder. Tinha visão crítica aguçada. Marcou época no jornalismo goiano”, afirmou. Segue Lenine: “Armando foi uma fonte de inspiração para mim, aprendi muito com ele. Sua morte me deixa consternado”.
Depoimentos
Ivan Mendonça assinou por vários anos uma coluna de notas políticas em O Popular. Ele diz que Armando estava muito triste ultimamente. “Armando começou a morrer com a morte do jornalismo impresso”, diz. “Ele foi um dos últimos representantes do jornalismo de opinião esclarecida, que exerceria influência política. Trabalhamos juntos por 17 anos e ele me dizia sempre que não queria parar jamais, pois, para ele, o jornalismo era uma terapia.
Outro jornalista de renome que trabalhou com Armando foi Fleurymar de Sousa. “Tive a felicidade de conviver com Armando quando fui repórter político de O Popular. Ele era um crítico intransigente dos maus costumes nacionais. Nunca pediu licença para exercer o seu espírito crítico”, afirmou.
Armando Acioli esteve casado por quase 48 anos com dona Marta Maria Acioli. O casal tem seis filhos, nove netos e 3 bisnetos. Dona Marta informa que Armando deixou inédito um livro de poemas. Ele amava a poesia e fazia versos. Nunca os publicou. Agora serão publicados postumamente, garantiu dona Marta.
O jornalista começou sua carreira no Cinco de Março, o bravo semanário de Batista Custódio, que, ao circular todos os dias, passou a chamar-se Diário da Manhã. E foi neste Diário da Manhã que Armando encerrou sua trajetória. Depois de muitos anos ocupando um canto de página em O Popular, Armando aceitou convite de Batista para trazer para o DM suas opiniões sempre incisivas, sempre contundentes.
Batista Custódio ficou triste com a morte do velho amigo. “Eu acho muito ruim quando as pessoas morrem. A vida leva um pouco de nós com os amigos que morrem”, disse ele.
Este repórter também tem algumas palavras a dizer sobre Armando Acioli. Conheci-o no plenário da Assembleia Legislativa de Goiás, no início dos anos 80, eu começando no jornalismo nas páginas de política do Jornal Opção. Na época, Armando e Lenine cobriam a Alego para O Popular.
Eu tinha diferenças ideológicas e filosóficas terríveis com ele. Aliás, nem sempre concordei com suas opiniões. Mas gostava do convívio. Ele era meio casmurro e ao mesmo tempo brincalhão, e nunca soube se a casmurrice dele era um jeito de brincar.
Fumava-se muito no plenário. Eu fumava bastante e Armando tinha sempre um cigarro aceso no canto da boca. Aí ele teve que fazer ponte de safena e parou de fumar. Senti-me como se um dos nossos estivesse desertando. Para, no plano psicológico, driblar a síndrome de abstinência com seus traiçoeiros ataques, Armando mantinha sempre à boca um simulacro de cigarro, um palitinho de madeira pintado de branco. Ficou anos pitando aquele negócio até livrar-se totalmente do vício. Eu só me livrei alguns anos mais tarde.
Só o vi de novo em uma visita que fiz ao meu amigo Mariozan, grande artista do lápis, topei com Armando chegando à redação de O Popular para redigir mais um dos seus artigos. Recentemente eu o vi de novo aqui na redação do Diário da Manhã. Conversamos muito, trocamos impressões sobre “a conjuntura”.
O fato de nem sempre concordar com o que Armando escrevia – e dizia isto a ele – não significa que não levasse em conta suas opiniões. Ele era, sim, conservador. É algo que não o diminui. Seu conservadorismo não o limitava. Era intelectualmente probo e não deturpava fatos para ajustá-los à sua opinião. Escrevia com elegância e correição, como os grandes jornalistas da velha escola. Mesmo criticando, jamais insultou o criticado. Respeitava a dignidade das pessoas. Era sério, sóbrio e objetivo em suas críticas. Não se via em seu texto zombaria, escárnio, deboche. Mas ele sempre deixava transparecer a indignação moral dos que cobram dos políticos o mais alto padrão de moralidade, e que não deixam por menos. Um Catão, um Cícero, um Demóstenes, ou o cego Tirésias – todos os grandes oradores e profetas do passado se encontravam na sua veemência retórica.
Ele foi de um tempo em que os que escolhiam a carreira jornalística tinham que ler muito. Ler a boa literatura, não as bobagens que os professores universitários recomendam. Este contemporâneo de Graciliano Ramos, admirador da poesia de Bilac, tinha vasta erudição para seu próprio uso, jamais para ostentar.
Batista está certo: um pouco de nós se vai com Armando Acioli.
Nota de pesar pela morte do jornalista Armando Acioli
Com pesar, recebi a notícia da morte do estimado e emérito jornalista Armando Acioli, que atuou na imprensa goiana por mais de 60 anos. Sempre tive muito carinho por ele, numa convivência marcada por conversas produtivas e muitos bons aconselhamentos, que eu retive e pratiquei, absorvendo-os com presteza e tendo-os como exemplos da acuidade oriunda de uma figura paterna. Perdi, portanto, um grande amigo, um homem sábio e amável, e um grande contador de histórias.
Armando nos legou uma vida exemplar de dedicação ao jornalismo, numa trajetória que serve de modelo aos jovens iniciantes da profissão. Ele carregava o jornalismo no sangue, pois tinha uma acurada capacidade de reportar os fatos, uma opinião abalizada sobre os temas da política e de nossa vida em sociedade e um texto escorreito, digno dos jornalistas que nasceram com a alma amalgamada com a profissão que escolheram.
Pelo que depreendi de sua vida profissional, na redação do jornal O Popular, onde exerceu seu ofício, a figura de pai se misturava com a do amigo e do colega sempre cordial, como comprovam todas as pessoas que com ele trabalharam e conviveram. Eu mesmo pude comprovar em algumas vezes em que convivi com ele em situações de trabalho.
O jornalismo goiano perde um profissional de estirpe, que construiu, com muita dedicação e galhardia, uma significativa carreira, que também deixa, como legado, a referência de como o trabalho jornalístico respeitoso e competente é importante para a construção de uma sociedade melhor.
Deixo o meu caloroso abraço e meus sentimentos solidários a todos os amigos e parentes de Armando Acioli, em especial à viúva, Martha Maria Conrado, e aos filhos Rita de Cássia, Pedro Paulo, José Emmanuel, Francisco de Assis, Armando Júnior e Humberto, e também aos netos e bisnetos.
Marconi Perillo, Governador de Goiás