Justiça autoriza artista vender na web esculturas de santos inspiradas na cultura pop
Diário da Manhã
Publicado em 8 de fevereiro de 2018 às 00:25 | Atualizado há 4 meses
A artista Ana Smile obtém mais uma vitória na Justiça, ao lhe ser concedida a autorização de comercializar esculturas de santos inspirados na cultura pop na internet. Ela já estava autorizada a fabricar e comercializar as peças em lojas físicas, mas de acordo com a defesa, a situação anterior era esdrúxula, tendo em vista que as vendas eram motivadas pela divulgação nas redes sociais (Facebook, Twitter, Instagram). A Arquidiocese de Goiânia não irá se pronunciar sobre o caso.
Ana Smile, nome artístico de Ana Paula Dornelas Guimarães de Lima, ficou famosa nas redes sociais em 2016, ao divulgar esculturas de santos pintados como personagens da Cultura Pop, como Superman, Galinha Pintadinha e Chapolin. No entanto, o que era para ser um trabalho criativo e divertido, a Arquidiocese de Goiânia entendeu que ele ofende “a coletividade, violando o sentimento religioso, ao empregar escárnio, sátira e ironia”, processando a artista, naquele ano.
Em junho de 2016, o juiz Abílio Wolney Aires Neto, da 9ª Vara Cível de Goiânia, proibiu Ana Smile de fazer e vender as esculturas. O magistrado estipulou uma multa de R$ 50 mil em caso de descumprimento, além de ter determinado a exclusão dos perfis “Santa Blasfêmia” do Facebook e do Instagram, onde comercializava seus produtos. Meses depois, o juiz Wilson Safatle Faiad reformou a decisão. Ele autorizou que Ana fizesse e comercializasse as estátuas, mas proibiu a veiculação de imagens das mesmas nas redes sociais.
A decisão do desembargador Norival Santomé, da 6ª Câmara Cível, no entanto, deu novo parecer favorável ao pedido da assessoria jurídica que representa Ana. O advogado de Ana, Alexandre Alencastro Veiga, disse que, apesar da liberação para produção e venda, a artista praticamente não trabalhou na confecção das peças. “Era uma situação esdrúxula. Ela só podia vender em lojas físicas e nem postar uma foto nas redes sociais, onde ela vendia quase que integralmente seu produto. Por isso, ela produziu em uma pequena escala porque a venda no comércio era praticamente insignificante”, explica.
Em seu despacho, Santomé destacou que a divulgação das peças pela artista “não possuem o condão de, por si só, ferir a imagem ou honra da Igreja Católica”. Além disso, o magistrado advertiu que a situação impedia Ana de desenvolver seu trabalho, o qual era responsável pelo seu sustento, “sem o qual não há dignidade” e que, sem ser realizado, poderia ocasionar “danos de difícil ou impossível reparação”.
Por fim, o juiz explica: “a decisão digladiada, da forma como proferida, tem potencial de cerceamento à liberdade de expressão e manifesto do pensamento, estes tão caros ao vigente sistema constitucional”.
ORIGEM
As esculturas começaram a ser feitas há cerca de cinco anos, depois que Ana viu um meme na internet e se apaixonou pela ideia. Na foto, Batman carregava Robin no colo ao estilo das imagens sacras. “Achei aquilo sensacional, me encantou. Revirei a internet e não encontrei uma para comprar. Então resolvi fazer eu mesma. Fui a uma fábrica de gesso, pintei e postei. Vários amigos e conhecidos começaram a me pedir”, lembra.
Em resposta à interpretação da Arquidiocese de Goiânia, Smile disse que não entendia o motivo da decisão. Ela salientou que o intuito ao fazer as esculturas não era atingir qualquer religião e que as peças são apenas fruto “de um trabalho ligado à arte pop”. “Nunca quis agredir a fé de ninguém. É uma coisa para quem gosta de algo diferente. Sou de família católica e todos me apoiam, gostam do que eu faço e têm exemplares em casa. Minha avó, inclusive, que não sai da igreja, não viu problema algum”, conta a artista. A Arquidiocese ainda não comunicou se irá recorrer da decisão.