Cotidiano

Justiça pune casal por obrigar igreja a realizar matrimônio

Redacão

Publicado em 23 de agosto de 2016 às 15:39 | Atualizado há 4 meses

Uma polêmica decisão de segundo grau pode tonar-se jurisprudência no âmbito das lides que envolvem religão: a 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) julgou improcedente pedido por danos morais formulado por um casal que teve negado o pedido de celebração matrimonial pela Primeira Igreja Batista em Goiânia (PIB).

Cabe recurso da decisão por dizer respeito principalmente a temas constitucionais.

A mulher frequentava a PIB, mas o noivo não.

Úrsula Lince Alfonso e Paulo Henrique Andrade desejavam se casar, mas a mulher estava grávida – o que afronta as regras internas da PIB.

O casal terá que pagar a igreja de Goiânia R$ 50 mil como indenização pelos danos morais causados.

Em relação ao ônus da sucumbência, os autores foram condenados ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 20% sobre o valor da condenação.

Apesar da cerimônia ocorrer a partir da imposição de uma liminar judicial, e estar amparada em um entendimento jurídico (ainda que precário), a igreja procurou seu direito na Justiça.

O magistrado Delintro Belo de Almeida Filho, que agiu como juiz substituto em segundo grau, defendeu a tese de que a instituição religiosa deve seguir seu estatuto e não o que pensa o casal.

Uma outra polêmica que pode ser questionada nos tribunais é o fato do juiz, Delintro Belo, ser religioso. Ele assina a decisão como “diác”, ou seja, diácono, colaborador na Paróquia Santuário Santo Antônio de Anápolis.

O arrazoado do magistrado, todavia, foi aparentemente baseado na legislação e dentro das normas constitucionais.

Assim, na visão do juiz, a igreja pode e deve aplicar suas regras internas e não realizar o matrimônio.

A instituição religiosa disse que o estatuto eclesiástico e às normas religiosas foram feridas em suas bases mais formais. “A liberdade de organização religiosa é decorrência do Estado laico, o qual este não poderá interferir em assuntos internos das igrejas”, disse o juiz.

“Os autores não foram surpreendidos com as decisões do pastor da igreja ré, uma vez que violaram as normas de conduta da religião a que pertenciam e resolveram correr o risco, quanto a manutenção de relações sexuais antes do casamento, de forma que não podem querer, após descumprirem as regras, impor a todos os membros da igreja suas opiniões e vontades pessoais”, diz a decisão.

O relator disse que a recusa não se caracteriza como ato discriminatório, já que não foi dirigida a uma pessoa determinada: “Considerando que não se tratar de uma questão pessoal, mas de uma regra comum de conduta dirigida a todos aqueles que professam a mesma religião”.

 

O casal já havia perdido em primeiro grau quando outra magistrada, a juíza Rozana Fernandes Camapum, negou o pedido do casal.

Úrsula Lince Alfonso e Paulo Henrique Andrade então entraram com recurso de apelação, mas o colegiado manteve a sentença sem reformas.

Delintro Filho reiterou a separação da Igreja e Estado, no sentido de que  “é notório e independe de provas que a religião evangélica não aceita as relações sexuais antes do casamento, sendo que este dogma é da igreja e contra qual o Estado não pode se voltar a título de infringência à Constituição Federal”.

COMUNHÃO

De acordo com a decisão de Delintro, a igreja apresenta em seu Calendário Eclesiástico 2004 as regras que foram enfrentadas pelo casal:

“(…) Para Cerimônias de Casamento (a) O Templo será cedido para uso de seus membros que: – Estejam em plena comunhão com a Igreja;”

“Nesta linha de raciocínio, foi afirmado pelos autores/recorrentes que a primeira postulante, Úrsula Lince Almeida Alfonso, estava em período de gestação, circunstância esta que demonstra a primeira violação à regra de uso do templo, para a celebração de seu casamento”.

O próprio tribunal já indicou que existe jurisprudência neste sentido de negar  a intromissão do fiel ao que dispõe o corpo da igreja:“(…) Limites da ingerência do Estado/Juiz, em assuntos religiosos, na constituição de 1.988, que adotou a figura do Estado Laico. Matéria polêmica, que, por ora, deve prestigiar a decisão tomada pela Cúpula da igreja (…)” (1ª CC, AI nº 82692-9/180, Rel. Des. Vitor Barboza Lenza, DJe de 27.05.2010).

De acordo com Guilherme de Amorim Gimenez, pastor da igreja, o casal jamais voltou no templo religioso após o matrimônio: “O casamento foi realizado mediante cumprimento de decisão judicial, mas após a celebração, os noivos nunca compareceram à igreja para frequentar os cultos ou atividades”.

 

 

 

 


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