Cotidiano

Lula coloca tribunal em sinuca de bico

Diário da Manhã

Publicado em 23 de fevereiro de 2018 às 00:42 | Atualizado há 7 anos

O desembargador João Pe­dro Gebran Neto, do Tribu­nal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), reconheceu ontem, em declaração a vários órgãos de imprensa, que os embargos de de­claração apresentados pela defesa do ex-presidente Lula podem mu­dar a decisão anterior do Tribunal, que condenou o ex-presidente em segunda instância. É uma possibili­dade, admitiu, sem, no entanto, afir­mar que isto pode ocorrer.

O recurso da defesa apontou diversas omissões e contradições no acórdão relativo ao julgamen­to realizado no dia 24 de janeiro e pede que, como consequência da correção desses vícios, o proces­so seja anulado ou ex-presidente seja absolvido. O MPF terá 12 dias para se manifestar sobre a peça da defesa de Lula. Somente depois é que o TRF4 poderá julgar os em­bargos de declaração.

O TRF4 deverá levar, estima­-se, dois meses para julgar os em­bargos de declaração da defesa do ex-presidente Lula, no caso do trí­plex, que condenou o petista a 12 anos e um mês de prisão.

Segundo o advogado Cristia­no Zanin Martins, o recurso proto­colado na terça-feira passada de­monstra que o acórdão contém 38 omissões em relação alegações que constam no processo e que foram apresentadas pela defesa no bojo das razões da Apelação Criminal. Também demonstra 16 contradi­ções com os seus próprios termos, além de 5 obscuridades, ou seja, as­pectos da decisão que revelam difi­culdade de compreensão.

A defesa pede que sejam su­pridas essas omissões, e sanadas as contradições e obscuridades – o que poderá alterar o resulta­do do recurso de apelação julga­do em 24 de janeiro desde que se reconheça a nulidade de todo o processo, ou parte dele.

AS FALHAS DO ACORDÃO

Das principais omissões aponta­das pela defesa de Lula, destacam as seguintes, por si sós capazes de anu­lar o processo, no todo ou em parte.

O TRF-4 foi omisso em rela­ção aos fundamentos articula­dos para afastar a manifesta in­competência do juízo de 1º grau. O defensor quer que o TRF-4 se manifeste sobre a interceptação do principal ramal telefônico do escritório Teixeira, Martins e Ad­vogados como razão determinan­te da suspeição do magistrado.

A defesa aponta omissões re­lativas à realização da intercepta­ção após determinação de encer­ramento – diálogos utilizados – e levantamento do sigilo em usur­pação de competência do Supre­mo Tribunal Federal relativas à no­meação de Lula para o ministério de Dilma, fato que atesta a animo­sidade de Moro em face de Lula, o que o torna suspeito.

Também foi apontada omissão em relação aos eventos (de suges­tiva conotação política) frequenta­dos pelo magistrado, eventos es­tes manifestamente antagônicos ao ex-presidente. Muitos outros fatos indicativos da suspeição de Moro foram apontados na ape­lação, sem que o TRF-4 os apre­ciasse. Das omissões em relação à Suspeição dos Procuradores da República a defesa também de­mandou declarações.

O Tribunal terá que enfrentar es­sas questões relativas à competên­cia do juízo e à suspeição do juiz. Se o tribunal declarar que a 13ª Var­ra da Justiça Federal de Curitiba é competente para julgar o caso, es­tará, segundo a defesa, violando a legislação processual – ensejando recurso para o STJ – e afrontando ju­risprudência remansosa e pacifica­da do STF. Caso o TRF-4 decida por aplicar a legalidade estrita e subme­ter-se à jurisprudência dos tribunais superiores, terá que decretar a nu­lidade do processo desde o início.

Isto não impedirá o Ministério Público de apresentar nova de­núncia contra Lula perante a Jus­tiça estadual de São Paulo. Neste caso, fica prejudicada a aprecia­ção das demais questões pon­tuadas por Zanin.

Durante o processo, o juiz Sér­gio Moro indeferiu inúmeros re­querimentos de produção de pro­vas em favor de Lula. Segundo Cristiano Zanin, essas decisões do juiz violaram o princípio consti­tucional da ampla defesa, consti­tuindo cerceamento do direito de se defender. Tudo isso foi citado na apelação, mas o TRF4 não se pro­nunciou. A defesa quer que o tri­bunal supra esta omissão em re­lação ao indeferimento de provas.

Se o TRF-4 entender que hou­ve cerceamento à defesa de Lula, poderá anular o processo parcial­mente, mandando-o de volta a Curitiba para que seja reiniciado a partir do ponto em que ocorreu a primeira nulidade. Moro terá que exarar nova sentença, levando em conta, porém, as novas provas da defesa. Poderá manter ou não sua decisão anterior, mas terá que mo­dificar seus fundamentos.

A defesa de Lula apontou obscu­ridade no tocante a atos concretos de Lula enquanto “comandante” de amplo esquema de corrupção. Trata-se de uma narrativa estra­nha ao objeto da denúncia. Um texto denominado pela acusação de “contextualização”, onde, por via especulativa, de ilação em ila­ção se constrói um pano de fundo contra o qual se recorta a figura de uma “organização criminosa”, exe­cutando um “projeto criminoso de poder”, sob comando supremo de Lula. Embora as teses fundamen­tais do “contexto” não foram sequer provadas, serviu ele como “prova circunstancial” contra Lula. A defe­sa de Lula considerou “obscura” a abordagem deste tema no acordão.

Disso, segundo a defesa, decor­re como contradição a impossibi­lidade de condenação do embar­gante pelo “comando” ou posição de garante de esquema de cor­rupção, uma vez que isto não foi objeto de denúncia, mas mera fabulação. Outra obscuridade: a afirmada origem ilícita dos valo­res empregados no tríplex.

No tocante ao mérito da causa, Zanin alega omissão sobre o ques­tionamento da defesa segundo o qual a indicação de Paulo Rober­to Costa para a Petrobras não pode ser considerada prova do crime de corrupção passiva. Outra omissão: o TRF-4 não examinou a alegação de Lula a respeito da necessidade de demonstração de ato de ofício. Também Moro passou por cima desta questão essencial, do que decorreu a “criação de uma nova modalidade de corrupção, com ofensa à legalidade estrita”.


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