Mãe denuncia à PC comportamento suicida de filha após contato com redes sociais
Diário da Manhã
Publicado em 6 de abril de 2018 às 01:43 | Atualizado há 4 meses
No dia 27 de março, a mãe de uma adolescente de 13 anos acionou a Polícia Civil, no Setor Nova Suíça, para denunciar “comportamento suicida” de sua filha. A mulher relatou que, desde os 11 anos, quando a filha ganhou o primeiro aparelho celular, começou a apresentar atitudes de automutilação, provocando ferimentos pelos braços e pernas. Há cerca de 3 semanas, a mãe afirmou ter encontrado uma carta da adolescente com teor suicida, na qual a garota se despedia dos pais. Ao inspecionar o celular da menina, a mulher alegou encontrar grupos de redes sociais que estimulavam a prática suicida. A irmã da menina, no entanto, disse que a carta não foi escrita pela adolescente e que existem “modelos de carta suicida” disponíveis na internet, tais como a que apresentou a jovem aos pais.
A Delegacia Estadual de Repressão a Crimes Cibernéticos (Dercc) está investigando suposta relação entre casos de suicídio e grupos de redes sociais. De acordo com a Dercc, a investigação teve início após dois adolescentes cometerem suicídio em 21 de fevereiro, em Goiânia. Os grupos estariam incentivando jovens a tirarem a própria vida. Embora a Polícia Civil acredite que haja relação entre os grupos e as mortes, a delegada responsável pelo caso, Sabrina Leles Lima Miranda, disse que a investigação é sigilosa e que não vai se manifestar sobre o caso.
Goiás tem pelo menos um suicídio por dia
Em 2017, segundo a SSP, 470 pessoas tiraram a própria vida no Estado. Até março deste ano, a pasta foi notificada 114 vezes sobre casos de suicídio
O número de suicídios em Goiás aumentou 6,5% em 2017, em relação ao ano anterior. De acordo com dados da Secretaria de Segurança Pública de Goiás (SPP-GO), 470 pessoas tiraram a própria vida no ano passado. Em 2016, 441 mortes deste tipo foram registradas. A média por dia é de 1,28 ocorrências, sendo que as cidades com maior população registram maiores números. Em Goiânia foram 107 casos, 53 em Aparecida de Goiânia e 43 em Anápolis. Somente neste ano, a SSP recebeu 114 notificações desses casos, com destaque para janeiro e março, que tiveram 42 casos cada um, superando o mesmo período do ano passado, onde se registraram 37 e 32 ocorrências, respectivamente.
Os números divulgados no Sistema de Estatísticas Criminais da SSP se referem aos boletins de ocorrências registrados via Registro de Atendimento Integrado (RAI), responsável pelo registro único das ocorrências de segurança pública em Goiás. De acordo com o Departamento de Informática do SUS, o Datasus, 428 pessoas cometeram suicídio em Goiás no ano de 2015. Já no sistema da SSP, os números acusam 274 mortes desse tipo no mesmo ano, número muito abaixo dos 441 registrados em 2016, pelo mesmo órgão. Considerando os dados do Datasus e da SSP, nos últimos seis anos, o número de mortes anuais por suicídio aumentou em 18%.
O gerente do observatório de segurança pública da SSP, Major Geison Borba, explica que a diferença entre os números dos dois sistemas acontece porque a pasta registra somente os casos em que as forças policiais são acionadas, já que suicídio não é crime. “Se não há indício de crime e existem elementos suficientes para indicar que foi suicídio, a gente registra, porque fomos acionados”, explica. O Datasus reúne dados das SSPs e dos serviços de óbitos municipais. O departamento disponibilizou os dados sobre suicídio até o ano de 2015.
Em 2017, a SSP registrou oito casos de “induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio” no Estado. Neste ano, apenas um caso foi registrado, em março. Já para casos de tentativa de suicídio, foram 181 notificações no ano passado. Em 2018 já foram 51 casos, com destaque para os meses de fevereiro e março, que tiveram 19 e 21 casos, respectivamente. No mesmo período do ano passado, foram 10 tentativas de suicídio em cada mês. Em todos os anos, o mês de abril registra um pico no número de suicídios, que sofre uma queda entre maio e julho e tem nova ascensão entre setembro e novembro. (Gráfico 1)
O professor de filosofia e sociologia, João Gabriel da Fonseca, que estuda o tema do suicídio, pontua questões que podem gerar esse mal-estar social, usando a educação como exemplo. “O modelo educacional o qual nós temos é extremamente competitivo. A expectativa e a frustração estão em extremos, ou você tem muita expectativa e se frustra ou tem frustrações demais e isso quebra suas expectativas”, exemplifica. Para ele, os sentimentos de culpa e fracasso são depositados excessivamente sobre as pessoas. “A gente recebe muita expectativa de querer ser aquilo que não damos conta”.
Para falar sobre suicídio, Fonseca se fundamenta no filósofo Friedrich Nietzsche e no sociólogo Émile Durkheim, ambos teóricos do século 19. “Resolver o problema do suicídio é completamente ilógico. Não é possível proibir ou coibir o suicídio. Para tratar a questão, é preciso conversar de maneira séria, quebrar os tabus a respeito da existência e o preconceito sobre suicídio, inclusive afastar o valor religioso, que criminaliza esse tipo de morte”, comenta. O professor defende uma política de conscientização nas escolas e nos locais de trabalho para diminuir a pressão sobre estudantes e profissionais, tais como os médicos, que possuem elevadas taxas de suicídio.
Não é possível proibir ou coibir o suicídio. Para tratar a questão, é preciso conversar de maneira séria, quebrar os tabus a respeito da existência”João Gabriel da Fonseca, professor de filosofia e sociologia
SSP-GO