MPF investiga falta de identificação em banheiros da UFG
Redação DM
Publicado em 14 de junho de 2016 às 12:34 | Atualizado há 7 mesesO Ministério Público Federal de Goiás (MPF/GO) instaurou procedimento para apurar possível ações, ou omissões, da Universidade Federal de Goiás (UFG) sobre a ausência de sinalização dos banheiros masculinos e femininos nos campi da instituição, identificados apenas pelo uso “social ou unissex”.
De acordo com a MPF, a ação da UFG teria sido tomada supostamente em “prol da igualdade de gênero”, mas para o procurador responsável pelo caso, Ailton Benedito, a falta de identificação “pode acarretar constrangimentos ilícitos a homens e mulheres que frequentem a Universidade e precisem utilizar seus banheiros”.
No despacho, o procurador solicita a preservação das imagens dos sistemas de segurança, e requisita no prazo de 10 dias, informações e esclarecimentos acerca da postura da Universidade “no sentido de fomentar ou coibir essa situação, e os fundamentos que embasam seu posicionamento”.
Ailton é um procurador de algumas polêmicas na UFG.
Ele é o mesmo que, junto de Cláudio Drewes, emitiu, em abril, uma recomendação para que a faculdade não promovesse nenhum ato “de natureza político-partidária” envolvendo o impeachment da presidente Dilma Roussef (PT). A ação repercutiu negativamente e gerou uma forte oposição de professores, que acusavam o órgão de tentar censurar e ferir a autonomia da Universidade.
“Quando se discute se uma transexual pode ou não fazer uso do banheiro feminino, ou seja, do banheiro pertencente ao gênero com o qual se identifica está se discutindo ainda seu direito à identidade e à autodeterminação sexual, à honra, à intimidade e à privacidade. Está se discutindo se essa mulher e tantas outras e outros na mesma situação têm ou não o direito de viver sem marginalização invisibilidade social”
Isabela Gonçalves da Silva, advogada
O Diário da Manhã entrou em contato com a Universidade Federal de Goiás para comentar o caso, mas a instituição informou que não foi oficialmente notificada e que só irá se posicionar quando receber o despacho. No documento encontrado no site do MPF, não consta data.
Debate
No ano passado, uma transexual foi barrada no banheiro feminino em Santa Catarina (SC), e entrou na justiça. No caso levado ao STF, a transexual argumentou que, após ter sido impedida de entrar no banheiro feminino, não conseguiu evitar e defecou nas próprias vestes, tendo depois de voltar para casa em transporte público. O caso ganhou repercussão nacional e a corte votou por uma indenização de R$ 50 mil por danos morais.
“Quando se discute se uma transexual pode ou não fazer uso do banheiro feminino, ou seja, do banheiro pertencente ao gênero com o qual se identifica está se discutindo ainda seu direito à identidade e à autodeterminação sexual, à honra, à intimidade e à privacidade. Está se discutindo se essa mulher e tantas outras e outros na mesma situação têm ou não o direito de viver sem marginalização invisibilidade social”, disse a advogada Isabela Gonçalves da Silva.
Na UFG, a movimentação é geral quanto a liberdade e direito dos transexuais. Os próprios estudantes, sobretudo nas áreas de humanas, retiram ou rasuram as identificações dos banheiros para evitar esse tipo de situação. Na Faculdade de Informação e Comunicação (FIC), por exemplo, um dos três banheiros do prédio é categorizado como “unissex”, identificado com riscos de caneta. Nos cursos de História, Filosofia e Ciências Sociais, escritos incluem “trans e cis” a baixo do masculino e feminino.
O STF discutiu em 2015 o direito de transexuais usarem banheiros conforme sua “identidade de gênero”. Os ministros Luís Roberto Barroso e Luiz Edson Fachin votaram a favor, mas o julgamento foi interrompido por um pedido de vista (mais tempo para analisar o caso) do ministro Luiz Fux.
Faltam ainda os votos de outros nove ministros para uma decisão final, ainda sem data para ocorrer. A decisão da suprema corte deverá orientar, ao menos, outros 778 processos semelhantes, que estão parados na justiça.
[box title=”O que pensam os estudantes”]
Alunos afirmam o que pensam sobre a polêmica iniciada com a ação do MPF. Maioria se mostra favorável ao banheiro unisex, mas existe receio com a medida estudantil
Amanda Sales, Jornalismo, 19 anos
“Eu acho positivo não ter a identificação nos banheiros. Levando em conta, principalmente, a representatividade dos transexuais e das ideologias de gênero. Para muita gente parece bagunça, mas eu acho que é só uma questão de costume e educação mesmo. As pessoas que se aproveitam disso, tem de ser punidas até todos se adequarem à realidade, e entenderem o sentido de não ter identificação de sexo. Uma hora, as pessoas iriam acostumar”..[/box]
Frederico Bittencourt, História, 19 anos
“Eu acho válido como símbolo para a galera que não tem espaço. Se isso representa uma vitória para os trans, e fará toda a diferença essa identificação, acho ótimo”.
Caroline Mendonça, Jornalismo, 21 anos
“Não concordo com a retirada de placas de identificação de sexo dos banheiros. Uma das principais justificativas para isso é a ‘igualdade de gênero’, mas acho que ela pode ser posta em prática de forma diferentes, como na cobrança de ingressos de festa, que a mulher para mais barato que o homem. As placas no banheiro dão privacidade para o homem e para a mulher e acho que são totalmente necessárias”.
Miriam Pires, Administração, 21 anos
“Sou totalmente tranquila quanto a gêneros, se a pessoa é trans e tudo isso. Não entendo qual é o problema da pessoa usar o banheiro feminino se ela se identifica assim, mesmo que nem tenha feito a operação. Mas, prefiro manter separado, por questões de segurança pessoal mesmo, apesar de gostar de pensar que caras mal intencionados não iriam se portar como transgênero só para se aproveitar de alguma forma”.
Orion Ribeiro, Ciências Biológicas, 19 anos
“Acho válido [não ter divisão dos banheiros] justamente por causa da inclusão. Se a pessoa trans é do sexo feminino, ou se identifica com o gênero feminino, é só ela ir no banheiro feminino. Criar um banheiro para trans pode ser visto, por si só, como preconceito. O ideal seria ter o masculino, o feminino e o unissex, e cada um iria no qual se sentisse mais confortável”.
Eduardo Cruz, Biotecnologia, 19 anos
Eu acho uma ideia bacana mas, ao mesmo tempo, uma coisa meio desagradável. Porque vai ser ótimo para algumas pessoas, que vão se sentir melhor com isso, mas outras pessoas podem se sentir desconfortáveis. Eu, por exemplo, que nunca entrei em um banheiro feminino, é estranho ver uma mulher no banheiro. Seria melhor fazer um terceiro banheiro unissex. Simplesmente tirar essa divisão eu acho que é demais”.
Melissa de Britto, Design Gráfico, 20 anos
“Banheiros unissex eu não sei. Mas uma pessoa trans, especialmente que já tenha feito cirurgia, deve ter o direito de usar o banheiro ao qual se identifica. Mesmo tendo toda aquela problemática de gente babaca se aproveitar da situação. Mas acho que por enquanto ainda é bom ter a divisão, para prevenir assédio mesmo”.
Calipso Careline, Comunicação Social, 20 anos
“Apesar de não estar completamente inteirada sobre o assunto, creio que a separação dos banheiros não pode ser abolida, isso deixaria as mulheres muito expostas a situações de machismo e violência, já tão comuns no nosso dia a dia. Entretanto defendo também que o banheiro não se restringe unicamente ao gênero biológico, e sim como a pessoa se reconhece. É desumano, por exemplo, obrigar uma mulher trans a utilizar o banheiro masculino, afinal ela não se reconhece como homem e não vive como tal”.