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Quatro décadas depois de sair de cena, Elis Regina volta aos holofotes

Por Julio Maria

Três grandes projetos sobre Elis Regina, com potencial para recolocarem o nome da cantora em destaque com frescor e ineditismo, estão na esteira para serem lançados entre o segundo semestre deste ano e o começo de 2023. Uma época escolhida não por acaso. No próximo dia 19 de janeiro, quarta, serão completados 40 anos desde a morte da cantora. “Quarenta anos de morte não, de saudade de Elis”, prefere dizer seu filho, João Marcello Bôscoli.

Dois dos produtos são ligados ao audiovisual: um documentário em três episódios, a ser lançado pela HBO, vai levar o nome de “Elis por João”, com imagens de programas, shows e entrevistas que Elis concedeu para emissoras de vários países. O produtor é Marcelo Braga e direção ficou com Lea Van Steen. A progressão das cenas terá um eixo cronológico e baseado na narrativa muitas vezes emocionada de João Marcello. Imagens de Elis conseguidas por Braga a mostram em aparições nas TVs de países como Bélgica, França, Portugal, México e Alemanha.

O segundo projeto em fase de finalização, aguardado pelos fãs há anos, é também um documentário gravado pelo produtor Roberto de Oliveira durante os registros, em Los Angeles, nos Estados Unidos, do álbum “Elis & Tom”, lançado em 1974. Roberto tem um material bruto de 3h30 em vídeo e mais 4h em áudio guardados desde então. Agora, editados, eles estão prontos para surgir no longa-metragem “Elis & Tom - Só Tinha de Ser com Você”, pelo canal Arte 1. A expectativa é de que saia no segundo semestre. “Estamos na fase final, mas gostaríamos de lançar quando a pandemia estiver mais controlada para fazermos um evento presencial”, afirma. 

Com15 anos como chargista e desenvolvendo histórias para super-heróis fictícios, como “Super-Homem” e “Mulher Maravilha”, Gustavo Duarte tem sua primeira experiência com um personagem real. “Isso não quer dizer que eu vá fazer uma biografia de Elis, isso já fizeram. Meu papel não será o de um biógrafo. O que vou fazer será uma fantasia biográfica.” O livro, em fase de roteirização, terá cerca de 80 páginas e virá em formato europeu, como as publicações Asterix e Tintim. O autor prevê o lançamento para este segundo semestre, ou início de 2023.

A história de Elis, diz Gustavo, não será pensada para conversar só com as crianças, apesar de serem elas o primeiro alvo. A fantasia terá como gatilhos fatos conhecidos da história. A cantora criança está em 1955 ouvindo discos na sala de sua casa, em Porto Alegre, quando recebe a visita de um pássaro falante. Elis se encanta e conta ao amigo novo que, apesar de ser uma atração conhecida no programa Clube do Guri, da Rádio Farroupilha, é apenas uma menina, e o pássaro responde: mesmo sendo Elis uma criança, sua voz já encanta milhares de pessoas.

Então, o pássaro convida Elis a conhecer este mundo e a conduz por um portal, abrindo a tampa do toca-discos. Elis, a partir daí, viaja por passagens curiosas, como a que encontra em uma esquina de Belo Horizonte um garoto negro de boina, Milton Nascimento, e se assusta quando os abutres, os militares que tomam o País com o golpe de 64, prendem uma alienígena que, na verdade, é uma cantora famosa a ser libertada pela pequena Elis: Rita Lee. “É uma história para que adultos e crianças que não saibam de Elis possam também entender que esse personagem e esse mundo fantástico existiram”, diz Gustavo.

O especial de Elis feito com a coprodutora HBO é fruto do esforço do produtor Marcelo Braga. “Ele vasculhou os arquivos mesmo”, diz João Marcello. Braga conta que, para ele, “o grande diferencial são as memórias de filho narradas por João”. O especial, que será mostrado em três capítulos em data ainda não definida, conta, conforme diz Marcelo, com muita sensibilidade da diretora Lea Van Steen. “Ela trouxe um olhar feminino, de fã de Elis mas também de uma grande documentarista.”

Em 1974, Roberto de Oliveira sentiu que deveria registrar o momento histórico que iria testemunhar como produtor. Depois de ajudar a costurar o encontro entre Elis e Tom Jobim em um estúdio nos Estados Unidos, onde o álbum “Elis & Tom” seria gravado para, de fato, não sair mais da História, ligou para dois brasileiros que trabalhavam com cinema por lá, Jom Tob Azulay e Fernando Duarte, e montou uma equipe para registrar os bastidores da gravação. Mas, ao contrário do que o mundo conheceu recentemente com o excepcional “Get Back”, de Peter Jackson, aquele não era um projeto voltado para as câmeras.

“O que importava ali era o álbum. Quando entrávamos no estúdio com o equipamento, tínhamos de ter muita discrição”, conta Roberto. Assim sendo, Elis, Tom e os músicos são flagrados discutindo sobre os arranjos das músicas, às vezes com alguma tensão (isso no início, quando Tom ficou ressabiado ao saber que Cesar Camargo Mariano seria o arranjador) e diversão (o que é, talvez, um dos aspectos mais saborosos do material). “Ninguém ali estava preocupado com as câmeras”, conta Roberto.

Sobre uma segunda menção, quando lembrado de que o filme de Peter Jackson mostra o parto ao vivo da música “Get Back”, saindo de Paul McCartney aos poucos e fazendo o espectador torcer para que ele encontre a nota que, evidentemente, logo iria encontrar, Roberto diz: “Ah, essa sensação existe por várias vezes no filme de Elis e Tom também”. Em uma delas, antes de cantarem Chovendo na Roseira, Tom fala para Elis algo como: “Vamos descontrair, ficar mais soltos. Não quero cantar igual ao Tom Jobim”. Uma constatação que Roberto de Oliveira pode adiantar: “Todo o disco saiu exatamente como Tom Jobim queria”.

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