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Fica chega à segunda semana com mostras que mostram diversidade cinematográfica

Se tem um filme que honra o legado de Washington Novaes - jornalista que faz história no Dário da Manhã e foi pioneiro na imprensa brasileira em cobrir meio ambiente - essa obra é “De Onde Viemos, Para Onde Vamos”. Dirigido pela goiana Rochane Torres, o longa compete no Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental (Fica) numa mostra que leva o nome de Novaes e começa nesta terça-feira, 31, estendendo-se ao longo da semana no Cine Teatro São Joaquim, das 15h às 17h, na Cidade de Goiás.

Intenso, bem filmado e com uma montagem que faz a narrativa fluir, “De Onde Viemos, Para Onde Vamos”, cuja estreia foi no Festival de Brasília em dezembro ano passado, pode ser considerada uma das grandes obras do cinema goiano nos últimos anos. Rochane compreende a ficcionalização do real e, no filme, persegue a imagem irrepresentável, como se a história contada hipnotizasse o espectador no primeiro minuto da homenagem ao indígena Diomar Mytxywalla: é um doc bonito, sensível e necessário.

“O homem branco, para criticar e denegrir a imagem dos indígenas, passa a chamá-los de carajás, que significa macaco preto. Mas, na verdade, eles não carajás, e sim Iny: isso tem no filme e é maravilhoso”, diz Rochane, que dirigiu uma obra urgente num Brasil que vê a escaldada de destruição dos povos originários na pandemia e pelo desmatamento. Seu longa-metragem, como se fosse um estudo antropológico, mostra que os jovens indígenas estão enfrentando - além da histórica opressão à qual foram submetidos - um conflito de identidade, com questões da cultura e resistência

Mas o páreo para Rochane, vencedora de dois prêmios e detentora de uma menção honrosa no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, não é fácil. Também na mostra Washington Novaes concorre o documentário “Barragem”, obra que dialoga com o poema “Lira Itabirana”, publicado por Carlos Drummond de Andrade no jornal O Cometa Itabirano, em 1984. Nele, num esperto trocadilho, o poeta denuncia a Vale do Rio Doce: “o Rio? É doce./ A vale? Amarga”. Já o diretor Eduardo Ades, no doc, registra a luta dos atingidos pelo desastre para obter uma justa reparação.

Exibido no Festival do Rio, uma das vitrines do cinema brasileiro, o filme contextualiza o rompimento da barragem de mineração da Samarco, mostrando o impacto da “catástrofe” para os moradores de Bento Rodrigues, que ficaram sem suas casas e sem suas fontes de renda. Ades, como manda a tradição do documentário, pinça um panorama de desinformação, desunião e manobras apenas ao alcance dos poderosos – essa dor e esse sofrimento estão no livro “Tragédia em Mariana: A História do Maior Desastre Ambiental do Brasil”, da jornalista Cristina Serra.    

Ainda na seara do documentário, a diretora francesa Oriane Descoult abandona sua vida confortável de classe média na Europa para morar a nove mil quilômetros de distância. De uma hora para a outra, com seu aval e com sua vontade falando mais altos que qualquer outra coisa, Descout registrou as intercorrências que ela enfrentou e descobriu uma nova maneira de viver, mais ligada ao aspecto rural, buscando uma coletividade ecológica em detrimento de um capitalismo destruidor e, não raro, opressor: é uma das obras fazem com que questionemos tudo.

Será que é isso mesmo que queremos? Ah, detalhe: no Brasil, ao apaixonar-se perdidamente por um sujeito, Descout leva-o para ser seu companheiro de vida, com quem compartilha momentos, confessa apreensões, fala sobre sensações, revela medos, explana receios, verbaliza desejos e, sobretudo, versa sobre uma vontade de colocar o amor acima da ganância. Muito além de retratar a vida abrupta de vida vivida por uma francesa, “Castelo da Terra” mostra-nos que uma alternativa de vida possível.

A discussão ambiental, marca tradicional do Fica, continua na mostra que honra o nome do jornalista Washington Novaes. Num filme difícil de digerir, por meio dos crimes ambientais de Mariana de Brumadinho e suas filas de destruição, o diretor Tomás Amaral discute em “Herança Maldita: Do Ciclo do Ouro ao Neoliberalismo” os modelos de mineração que proliferam em Minas Gerais e, com uma linguagem que aprofunda o debate, investiga os impactos na vida das pessoas e do meio ambiente.

Força do cinema

Na mostra Washington Novaes, cuja temperatura a respeito de discussões ambientais girará nas alturas, serão exibidos ainda “Nós”, de Letícia Simões, “Para Não Esquecer”, de Gabriel Leal, além das produções estrangeiras “I´M So Sorry”, de Zhao Liang, “Kombinat”, de Gabriel Tejedor, e “Um Corpo em Fukushima”. Também serão apresentados curtas-metragens na mostra competitiva internacional. Já na mostra goiana, panorama da produção local, os cinéfilos vão poder assistir obras como “O Retrato do Mal”, de Márcio Jr. E Márcia Deretti. Haverá ainda a mostra de videoclipes, com diretores de Goiás, Rio Grande do Sul, Pernambuco e São Paulo.

Quem pulsa é o nosso cinema. Na semana passada, o longa “As Duas Irenes”, que foi gravado na Cidade de Goiás, entrou no catálogo da Netflix. Escrito e dirigido por Fabio Meira, com Marco Ricca e Susana Ribeiro, o filme estreou no Festival de Berlim, um das mostras mais importantes do mundo, e ganhou quatro Kikitos (a láurea mais importante) do Festival de Gramado. “O filme estar disponível no catálogo da Netflix é uma oportunidade de alcançar novos públicos e mostrar a nossa cultura e a beleza de nosso Estado a todo o Brasil”, afirma o diretor Fabio Meira.

Veja programação da mostra Washington Novaes

Barragem, RJ, 96 min. Direção: Eduardo Ades

Castelo de Terra, MG, 2020, 95 min. Direção: Oriane Descout.

De Onde Viemos, Para Onde Vamos, GO, 2021, 97 min. Direção: Rochane Torres

Herança Maldita: Do Ciclo do Ouro ao Neoliberalismo, MG, 2021, 116 min. Direção: Tomás Amaral

Kombinat, Suíça, 2020, 76 minutos. Direção: Gabriel Tejedor

Nós, PE, 2021, 84 minutos. Direção: Letícia Simões

Para Não Esquecer, GO, 2022. 73 minutos. Direção: Gabriel Leal

Um Corpo em Fukushima (A Body in Fukushima), Japão e EUA, 2021, 114 minutos. Direção: Eiko Otake

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