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Inspirado em João Gilberto, Obalalá traz a Goiânia show de Marina Sena

João Gilberto era um eremita, muito fechado. E também perfeccionista. Seu violão, que transformou a música brasileira com apenas um minuto e cinquenta e nove segundos, apresentou aos ouvidos do mundo um minimalismo que deixara o saxofonista Stan Getz boquiaberto ao escutar “Chega de Saudade” (1959). Mas João, contou o maestro Tom Jobim em entrevista ao jornalista Ruy Castro publicada na Playboy, desentendeu-se com o jazzista durante as gravações de “Getz/Gilberto” (1964) e ele, Tom, ficara de intérprete: “diga a esse gringo...”, xingava o brasileiro. 

Deixando as anedotas da bossa nova de lado, João era genial e os discos que fez, há mais de seis décadas, estão aí até hoje. Basta prestar atenção no festival Obalalá, que acontece nesta sexta, 6, a partir das 18h30, no Palácio da Música, no Centro Cultural Oscar Niemeyer (GO-020, saída para Senador Canedo): ao fechar com Marina Sena, uma das atrações do Obalalá, o DJ e pesquisador musical Bruno Caveira teve a ideia de pegar um nome brasileiro por excelência, que vem de uma música de “Chega de Saudade”, para batizar o projeto iniciado em 2017 junto do DJ goiano Sabará. 

DJ Bruno Caveira: "esse festival veio acontecendo" - Foto: Mark James/ Divulgação

“Esse festival veio acontecendo. Quando começamos o Obalalá, era uma coisa que marcava meu retorno à pesquisa em vinil. Eu tinha vinil quando era mais jovem. Aí veio o CD, no começo dos anos 2000, e eu vendi todos os meus discos. Não colecionava. Depois, lá por 2015, 16 meu padrasto me deu a vitrola dele, com alguns discos que ele tinha de música brasileira. Voltei a ouvir. Isso me ajudou muito a olhar para o outro lado, com essa música mais orgânica, desse Brasil profundo”, relata Caveira, que não dispensa a garimpagem de sebos, em entrevista ao Diário da Manhã.

Deu tão certo que o Obalalá virou festival. Prepara-se para sua primeira edição. E o line-up? A estrela da noite será a cantora Marina Sena, sensação da chamada nova MPB com o disco “De Primeira”. Marina foi perfilada pelo DM na edição publicada no final de semana passado. A programação também contará com os sets dos DJs Gabi Matos (GO), Odara Kadiegi (DF), Tata Ogan (RJ) e o Dj Caveira (GO), um dos produtores do evento, bem como a edição da Feira das Pretas, ação que contempla afroempreendedoras ligadas à moda, gastronomia, artesanato e artes visuais.

Segundo a DJ Gabi Matos, ao ser questionada pelo repórter sobre os desafios em trazer uma artista do porte de Marina, os eventos realizados na capital goiana não dispõem de grandes verbas de patrocínio. “É um tiro no pé que você dá, tentando e esperando que as pessoas valorizem a cultura. Acho que a dificuldade maior é tentar conscientizar o público a voltar aos eventos pós-pandêmicos, apesar de ter resquícios do coronavírus”, reflete Gabi, num aceno claramente positivo à arte.

DJ Gabi Mattos: " dificuldade é conscientizar público a voltar aos eventos pós-pandêmicos - Foto: Mayara Varalho/ Divulgação

Sem exageros, Marina Sena é uma artista e tanto. Essa recente revelação da música brasileira estourou não foi à toa. Toda a percepção estética de Marina, assim que lançado “De Primeira”, em agosto do ano passado, logo a fez alcançar 4,5 milhões de reproduções no Spotify. O clipe de “Me Toca”, por exemplo, mostra a cantora num cropped de strass, rebolando ao ritmo sensual da música, brincando com buquê de rosas, bebendo taças de Martini e saboreando pedaços de pizza, com suas peças de roupas coloridas.

O que o público verá no palco do Oscar Niemeyer será algo entre Sônia Braga e Gal Costa, com um quê de Frida Kahlo e até Marisa Monte. Será um show que vai abraçar o disco de estreia solo da artista nascida na pequena Taiobeiras (MG), envolvido em traços de pop, samba, axé e MPB, com intervenções políticas, críticas ao presidente Jair Bolsonaro, referências ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e falas sobre a importância em apertar o botão na urna eletrônica em outubro deste ano. Sendo assim, os goianienses antenados à MPB podem esperar uma apresentação em sintonia com aquela do Lollapalooza, que recebeu críticas elogiosas da jornalista Mariana Rodrigues, na revista Rolling Stone.  

Ou seja, irá muito além do hit “Por Supuesto”: haverá gingado, sensualidade, molejo, música. Mais ou menos tudo o que o Brasil precisa. E, fora o show de Marina, o Obalalá recebe na pista Tata Ogan, que mescla sons de influências ancestrais e futuristas. Saindo Tata do palco, Odara Kadiegi o assume e, de cara, manda ver num setlist repleto de brasilidades e MPB. A cultura nortista, descentralizando um pouco a música do eixo Rio-São Paulo, também marcará presença no festival por meio do set da DJ Gabi Matos, envolvido pelos ritmos tecnobrega, cúmbia, forró, samba e reggae. 

Para o DJ Bruno Caveira, que é um dos organizadores do Festival Obalalá, o que faz a pista ferver é juntar pessoas com diferentes vivências e estéticas distintas. “O Obalalá vai ser o festival do respeito e da ferveção”, antecipa Caveira, que completa o line-up do festival trazendo um setlist com dub, afrobeat e trip hop. Ele destaca ainda que será obrigatório apresentar comprovante de vacinação contra covid-19, tanto para o público quanto para os artistas e organizadores, para evitar a disseminação do vírus.

Sobre a bossa nova, Bruno afirma que ela não é simplesmente minimalista, são arranjos muito bem feitos, atemporais, com letras simples e, ao mesmo tempo, toca todo mundo. “Obalalá, portanto, é uma homenagem à música brasileira e a tudo o que ela influenciou mundo afora. Tem um monte de estilos musicais na gringa que possuem muito desse som. Na França e nos Estados Unidos a galera pira muito nisso. Essa figura do João Gilberto é emblemática. Criamos, lá atrás, um tributo, que virou pesquisa de vinil e agora se tornou um festival para provar que a música brasileira é a melhor do mundo, sem querer ser ufanista”, relata o DJ.

Discos para história: Chega de Saudade, de João Gilberto (1959)
'Chega de Saudade', disco de João Gilberto: nome do festival foi tirado do LP

A quem interessar, a história da bossa nova, que não poderia ter existido sem o violão minimalista e refinado de João Gilberto, foi narrada pelo jornalista e escritor Ruy Castro em “Chega de Saudade”, um clássico da bibliografia musical brasileira em que Ruy, como se quisesse chamar o leitor para ler um romance e não uma obra de não-ficção, detalha anedotas de Tom Jobim, Vinícius de Moraes, João Gilberto, Ronaldo Bôscoli, Roberto Menescal, Lúcio Alves, Nara Leão, Carlos Lyra, Dick Farney, Johnny Alf e Sylvia Telles. É uma obra que, como a bossa, nunca perde o charme. 

Veja a programação e horário do Festival Obalalá

18h:30 - Abertura dos portões

19h - Odara Kadiegi

20h:30 - Gabi Matos

22h - Tata Ogan

23h:30 - Marina Sena

00h:30 – Caveira

Haverá venda de ingressos no local. Será obrigatório comprovante de vacinação

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