Cultura

Camisa de Vênus e Plebe Rude se afinam na Arena Multiplace

DM Redação

Publicado em 17 de setembro de 2025 às 19:32 | Atualizado há 22 horas

Dadaísta dos sons: vocalista Marcelo Nova (ao centro) faz rock que provoca ouvidos incautos - Foto: Facebook/ Camisa de Vênus
Dadaísta dos sons: vocalista Marcelo Nova (ao centro) faz rock que provoca ouvidos incautos - Foto: Facebook/ Camisa de Vênus

Marcus Vinícius Beck

Como o poeta Walt Whitman, o roqueiro Marcelo Nova procura a folha na relva. Não tortura o espírito para se justificar, ser aceito ou compreendido. Segue Little Richard e Jerry Lee, admira Elvis Presley e Chuck Berry. É um dadaísta dos sons, um anarquista conservador.

Negando a razão, promove estardalhaços por onde passa. As próximas vítimas, saiba você, estão em Anápolis, amanhã, no festival Retrô, Centro de Convenções. O show que rola depois é em Goiânia, neste sábado, 20, na Arena Multiplace, durante o Rock Revival.

Marceleza folheia a “Fatos e Fotos”, lê uma entrevista com Timothy Leary e pira. “Porra, o cara descobrindo o futuro da humanidade e eu aqui nesta merda, tomando água de coco”, diz o roqueiro baiano na biografia “O Galope do Tempo”, do jornalista André Barcinski.

Jorge Amado? Não, Marceleza conheceu os encantos da literatura lendo Huxley e Proust. Aos nove anos, cercava-se de discos. Meteu o pé na estrada, like a rolling stone: foi para Nova Iorque. De volta ao Brasil, pôs sua verve debochada a serviço do Camisa de Vênus.

Desde então, dedica-se ao honrado ofício de anarquizar a porra toda. Se a Bahia era — e ainda é — a terra sagrada de todos os santos (Gil, Caymmi), também foi o berço do pai do rock brasileiro, Raul Seixas. Ali, além de tudo, nasceu o idiossincrático Camisa de Vênus.

Não chega a causar espanto, na verdade. O fato é que a capital dos tambores, do atabaque e do xequerê pariu uma banda doida por Sex Pistols, Clash e Buzzcocks. Quem a liderava era um locutor da Aratu FM, o próprio Marceleza, a essa altura já descaminhado pelo rock.

Com cinco meses de história, o Camisa reuniu amigos e inimigos numa apresentação em Salvador. Os camaradas, segundo o jornalista Arthur Dapieve, autor de “BRock: O Rock Brasileiro dos Anos 1980”, estavam representados pelos malucos que lotavam os shows, enquanto os detratores, para Dapieve, representavam setores aliados à casta da MPB.

Digamos que a estreia foi uma ejaculação precoce. Assim chamava-se o espetáculo, aliás. O jornal “A Tarde”, de orientação conservadora, aventou — por que não? — a proibição de a banda se chamar Camisa de Vênus — muito indecente, você sabe, fazer alusão à camisinha.

Que a censura — estávamos em ditadura, lembremos — mostrasse sua cara. Hahahahaha. Mas essa bizarra contenda, como sói acontecer, jogou a popularidade do grupo lá para cima, servindo para divulgá-lo. Logo saiu um compacto e, em seguida, havia um elepê nas lojas.

Lançado em 1983, o álbum “Camisa de Vênus” sopra em ouvidos incautos altas voltagens de sarcasmo. É um discaço: “Bete Morreu”, “Meu Primo Zé”, “Dogmas Tecnofacistas”. Marceleza afina — ainda mais — a irreverência em “Batalhões de Estranhos”, de 1985.

Apesar disso, não se acha bom cantor ou guitarrista, embora reconheça a qualidade de seu texto — ainda que músicas como a “Silvia” sejam (com razão) odiadas por feministas e movimentos de gênero. “Nunca fiz música de encomenda, não estou à venda”, disse em 2001.

“Nunca fiz música de encomenda, não estou à venda” – Marcelo Nova, cantor e compositor

Plebe

Se o Camisa de Vênus comemora 45 anos de estrada, a Plebe Rude brinda em Goiânia, neste sábado, 20, os 40 anos daquele concreto que se rachou, no Rock Revival, na Arena Multiplace. Não é pouca coisa, para o rock brasileiro, esse grito punk berrado de Brasília.

Philippe Seabra, vocalista, guitarrista e compositor, detalha em “O Cara da Plebe”, sua autobiografia, a estética do grupo fundado por ele: “Talvez a Plebe tenha inconscientemente começado como uma banda instrumental porque ouvir os discos era uma causa perdida.”

Do it yourself, ou “faça você mesmo”, em bom português: o concreto efetivamente começa a rachar em “Até Quando Esperar”, que abre o clássico disco celebrado na capital. “A plebe ajoelhar esperando a ajuda de Deus”, entoa Philippe, demonstrando consciência social.

Um hino apreciado por marxistas ou bakuninistas. Ouvia-se nas ocupações de 2016 contra a PEC 241: instituímo-lo como background (BG) de um programa que fazíamos na Rádio Universitária. “Tropas de choque / PMs armados / Mantêm o povo no seu lugar”, ressoava.

Publicado em 1986, “O Concreto Já Rachou” espelhava o Brasil. Vivia-se sob o governo de José Sarney e, é claro, esperava-se aquilo que o filósofo italiano Antonio Gramsci chamava de “Grande Política”. Ansiava-se pela Nova Constituinte. Desejava-se a democracia.

À época, havia, segundo o sociólogo Celso Rocha de Barros, uma disputa de visões gerais da sociedade e sua abertura real de possibilidades. De certa forma, a Plebe Rude traduz o espírito do tempo em faixas como “Johnny Vai à Guerra Outra Vez”, “Brasília” e “Seu Jogo”. Camisa de Vênus e Plebe Rude se afinam no tom da rebeldia. 

ROCK REVIVAL

Quando: sábado (20/09)

Onde: Arena Multiplace

Endereço: Alameda Barbacena, Vila Alto da Gloria

Ingressos: Bilheteria Digital


Leia também

Siga o Diário da Manhã no Google Notícias e fique sempre por dentro

edição
do dia

Impresso do dia