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DM chega aos 44 anos como a casa de jornalistas e escritores de diferentes estilos

Pelas páginas do jornal, ao longo desses anos, conta-se parte das histórias goiana e brasileira

Bernardo Élis, escritor: imortal da Academia Brasileira de Letras - Foto: Divulgação Bernardo Élis, escritor: imortal da Academia Brasileira de Letras - Foto: Divulgação

Foi uma espécie de realeza da imprensa, com todos os estilistas do texto, os artistas do verbo e os sonhadores da transformação social, iluministas que pensam a opulência do cardápio literário e a fartura das ideias revolucionárias. E, como fatalmente se prognóstica, o debate se qualificou a partir de 12 de março de 1980 nas páginas de um jornal vocacionado para a pluralidade. Lia-se Millôr Fernandes satirizando modinhas, Fernando Sabino arrancando suspiros pela sua ternura corriqueira e Carlos Drummond extraindo poesia da vida miúda.

Era um rio de ideias em cujas correntezas nadávamos com José J. Veiga para reconhecer que temos mais poetas do que pessoas aptas a julgar poesia. Um rio de estilo em cujas ondas banhávamos com Bernardo Élis e seu solilóquio sobre um bêbado entristecido pela morte carnavalesca. Letras dançaram no sertão da lauda jornalística. Ideias tilintam a harmonia da máquina de escrever. Dois escritores - dos maiores da literatura brasileira, sendo um deles, Bernardo, imortalizado pela Academia Brasileira de Letras (ABL) - povoaram o Diário da Manhã.


		DM chega aos 44 anos como a casa de jornalistas e escritores de diferentes estilos
Millôr Fernandes: humor no jornal. Foto: Divulgação


Autor de fina ironia e prosa fornida, Élis está imortalizado na literatura. Se escrevia contos de desfecho trágico, como se vê em “Ontem, como Hoje, como Amanhã”, também publicou, na década de 1990, neste jornal, textos inéditos sobre o cotidiano. Esse caminho também foi seguido por José J. Veiga, escritor moderno por excelência. Ele se esquivava quando comparado a Gabriel García Márquez e Julio Cortázar, expoentes da literatura fantástica latino-americana: “minha literatura é uma literatura realista: nem fantástica, nem mágica”.

Desde o princípio, de fato, o DM hasteou a bandeira da democracia. Sob a edição-geral do jornalista, escritor e ambientalista Washington Novaes, a ABL elegeu o jornal como o terceiro melhor do País. A Redação, comandada por Novaes, fundamentava-se num espírito público que colocava o rigor factual em diálogo com a sociedade goiana. Ele capitaneou, no início dos anos 1980, a reforma editorial pela qual passara este diário, num desejo de seu símbolo maior, Batista Custódio, em transformá-lo em um veículo de relevância nacional.

A edição deste DMRevista ficava a cargo do jornalista, poeta, artista gráfico e desenhista Reynaldo Jardim. Considerado o maior nome da imprensa cultural brasileira, o premiado Jardim colecionou inovações por onde passou. Ele “bossanovisou” o DM, por exemplo. Bossanovisou? Isso mesmo, priorizava um estilo de diagramação leve, com fotos abertas e plasticidade. Como se fossem obras de arte, umas se sobrepunham às outras. Seu ensinamento básico? Manter-se adolescente e cercado de jovens para não se desatualizar.


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Reynaldo Jardim, jornalista: editor do DMRevista. Foto: Divulgação


Gabriel Nascente, “artesão das palavras”, editou neste jornal, nos anos 80, o Suplemento Literário (LEIA), iniciativa que tinha como objetivo lançar luz à produção livreira da época. Poeta reconhecido Brasil afora, Nascente emprestou a sinfonia palavrória de sua Olivetti às páginas deste DMRevista durante anos. O jornalista Batista Custódio, fundador do DM, se referia ao amigo como um “nômade onde estiver aqui entre nós”. “Vive do lado de fora desse mundo. Não mora na pessoa. Habita na alma. Gravita na órbita das ideias”, disse.

Escritor de prosa bela, com capacidade de unir o rústico ao belo, o poético ao real, o lírico ao épico, Carmo Bernardes tem lugar de destaque dentre os maiores narradores do sertão já produzidos na literatura brasileira. Por anos, publicou nas páginas do DM textos com que descrevia a goianidade. Mineiro de nascença e goiano de coração, percorria os labirintos memorísticos, seja nas recordações da infância ou nos aspectos existenciais da fase adulta, numa linguagem regionalista que evoca a singularidade da natureza, seus hábitos, sua crença e sua filosofia. Gente simples ainda lhe estimulou a criar a obra “Jurubatuba”.

Segundo registros históricos consultados no Instituto Histórico e Geográfico de Goiás (IHGG), onde o arquivo impresso do jornal está disponível para pesquisa, o DM foi um passo à frente dado pela equipe do “Cinco de Março”, semanário histórico surgido após estudantes serem reprimidos pela polícia, no final dos anos 50. Ambos os veículos reuniram jornalistas, escritores e artistas que obtiveram destaque nos cenários regional e nacional, caso de Jorge Braga, Chico Fróes, Marco Antônio Lemos, Jânio de Freitas e Aloysio Biondi.

Biondi descobriu, inclusive, quão danoso poderia ser o desmonte do Estado por meio das privatizações. Utilizando os números para fazê-los comunicar mais do que as palavras, o meticuloso repórter de economia virou best-seller com o livro-reportagem “O Brasil Privatizado: Um Balanço do Desmonte do Estado”. Neste DM, refutou os equívocos da equipe econômica dos governos militares e exibiu seu conhecimento enciclopédico.

Hoje, continua o compromisso literário do Diário da Manhã. Suas páginas seguem habitadas pelo raciocínio de intelectuais notórios. Especialista em Energia pela Unicamp, uma das melhores universidades do País, Salatiel Soares Correia compartilha com os leitores curiosidades sobre literatura, como os mistérios que cercam o romance “O Jogo da Amarelinha”, de Julio Cortázar. Rogério Lustosa, doutor em História, analisa a sociedade por uma ótica de quem se especializou em discutir regimes autoritários do século passado. Há ainda o advogado e professor universitário Emílio Vieira, escritor e membro da Academia Goiana de Letras.

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