Ilha do Bananal, o refúgio dos índios no século XVII
Diário da Manhã
Publicado em 21 de setembro de 2016 às 02:05 | Atualizado há 4 mesesLocalizada no estado de Tocantins, em uma área de mais de 20 mil metros quadrados, a Ilha do Bananal é dividida entre o Parque Nacional do Araguaia e a Terra Indígena Inãwébohona. É considerada, por sua riqueza hídrica, fauna e flora, uma importante área de preservação ambiental. Segundo pesquisadores, graças ao formato geográfico da ilha fluvial, bem como seu regime de inundações, serviram como fatores de proteção para um número significativo de aldeias indígenas no momento do contato inicial entre portugueses e índios da região, em meados do século XVIII. Dados apontam para a existência de nove aldeias do subgrupo karajá e outras 12 do subgrupo javaé na ilha, além de um pequeno grupo de avá-canoeiros que evitam qualquer contato com outros humanos.
O livro Parque Nacional do Araguaia–TO, publicado em 2001 pelo Ibama e pelo Ministério do Meio Ambiente, com elaboração de nove pesquisadores de diferentes entidades, traz um panorama geral da ilha, abordando dados históricos, culturais e geográficos. Ao notar a presença dos karajás, colonizadores portugueses adentraram a ilha na intenção de escravizar índios, como contam os pesquisadores. “A Ilha do foi descoberta no dia 26 de julho de 1773 pelo sertanista José Pinto Fonseca, quando com seus ‘batedores de mato’ campeavam pelos sertões atrás de malocas de índios para abater e vender como mercadoria bastante valorizada àquela época.” A ilha foi chamada inicialmente de Santana, e rebatizada mais tarde devido a abundância de bananeiras.
Os autores apontam a riqueza natural da ilha como fonte de subsistência de várias tribos. A começar pela água: “É bastante significativa a situação hidrográfica dentro da ilha. Além dos rios Araguaia (braço maior na encosta oeste), Javaés (braço menor, na encosta leste), existem ainda, no interior da Ilha do Bananal, os rios Randitoró, Riozinho e Mercês. Todos esses rios são perenes, piscosos, abundantes em tartarugas e jacarés.” A alimentação da população também depende da preservação dos recursos: “Há também um grande número de lagos, alguns circundados de pitoresca vegetação ciliar. Para uma grande parcela da população, principalmente indígena, os rios são a única fonte de proteína, fornecidas pelos peixes e animais que habitam suas margens e várzeas.”
Preservação
No artigo científico ‘A invasão e a ocupação da Ilha do Bananal’, da pesquisadora Patrícia de Mendonça Rodrigues, podemos observar que, a partir do contato inicial entre brancos e índios da região da Ilha do Bananal, houve momentos de grande disputa territorial. No século XX, vários agricultores tentaram estabilizar-se na ilha para utilizar sua área como pasto. A estabilização de dois povoados marcou o ápice dessa disputa. “Na época, dois povoados, situados às margens do Rio Javaés, estavam consolidados dentro da Ilha do Bananal: Porto Piauí e Barreira do Pequi. Segundo dados da Sucam, havia 11.000 moradores não-índios na Ilha do Bananal em 1990 e, de acordo com a Funai, 300.000 cabeças de gado utilizavam suas pastagens naturais em 1991.”
Antes disso, nos anos 1970, a apropriação de terra indígena já era comum, como explica a autora: “Calcula-se que, nos anos 70, havia cerca de 200.000 cabeças de gado na ilha durante a estiagem.” Em alguns casos, os próprios indígenas negociavam suas terras com não índios, o que dividia opiniões entre os membros das aldeias. Os javaé buscaram formas de resolver a situação. “Insatisfeitos com a invasão crescente de seu território, o que os impedia de circular livremente, em 1989, um grupo de índios javaé denunciou a invasão de posseiros junto à Procuradoria Geral da República. Nos anos 90, a Funai realizou um levantamento fundiário e deu início à retirada dos moradores não-índios.”
Patrícia de Mendonça Rodrigues também fala do refúgio natural o qual se tornou a Ilha do Bananal nos primeiros anos de contato entre índios e brancos, citando seu regime de inundações (desconhecido para os colonizadores e já conhecido pelos índios) como um ponto a favor daqueles que já habitavam a região milênios antes da chegada dos portugueses. “O médio Araguaia é caracterizado por um regime de inundações periódicas que divide o ciclo anual entre a estação da seca (entre maio e outubro) e a estação da cheia (entre novembro e abril). O regime de inundações produz o alagamento da Ilha do Bananal e planícies adjacentes às margens dos rios Araguaia e Javaés, tendo sido um impeditivo histórico à colonização mais intensa da região.”