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Ivan Lins ‘jazzifica’ ouvinte em novo disco

Pianista lança disco com orquestra do saxofonista suíço George Robert. Sete canções do músico brasileiro recebem novos arranjos

Lins e Robert entoam dissonâncias humanas em álbum de jazz - Foto: Divulgação Lins e Robert entoam dissonâncias humanas em álbum de jazz - Foto: Divulgação

Funciona assim: Ivan Lins, 78, nos jazzifica. Sentimos a diástole do coração se dilatando para receber sangue apaixonado. Aquele piano Fender Rhodes, uau!, emite sons salvadores, arrepiantes. Modula sensações. Entoa esperança. O jazz expressa as dissonâncias humanas. Ou as dissonâncias humanas precisam ser expressadas pelo jazz. Nada disso importa.

Apagam-se as luzes e, então, aperto o play na primeira música do disco “Abre Alas”, lançado pelo pianista Ivan Lins com a big band Robert Jazz Orchestra. Passou apenas um minuto e já estou fora do tempo, fui fisgado pela música. Fisgar é um verbo escolhido a dedo. A guitarra desenha solo que abrilhanta a música. Abre teus ouvidos pra vida.

Ivan estourou nos anos 70 quando a cantora Elis Regina gravou o samba-soul “Madalena”. Politizado por necessidade histórica, o artista se engajou na luta contra a repressão ditatorial. Desde então, tem seduzido ouvintes que se excitam com a boa música, caso do pianista carioca Bené Nunes, considerado um dos maiores instrumentistas brasileiros.

Bené se encantou com Ivan. “Não vejo um compositor assim desde que conheci o Tom, há uns dez anos”, disse o músico. Há semelhanças impressionantes entre eles, seja na criação de um cancioneiro vasto, denso e brasileiro, mas também no prestígio conquistado lá fora, no público que adora escutá-los nos discos e, fundamentalmente, entre intérpretes e jazzistas.

Foi o caso de Ella Fitzgerald. Voz santificada da música estadunidense, a cantora gostou tanto de “Madalena” que resolveu cantá-la em português. Não queria dispensar o balanço das palavras. Quincy Jones, produtor, também sentiu um impulso extasiante ao ouvir Ivan, resolvendo espalhar a obra do brasileiro no meio do jazz e da melhor música popular internacional. Até Miles Davis, outra lenda, chegou a lhe telefonar para tecer elogios.

Os dois últimos discos lançados atestam a tese aventada neste texto: Ivan Guimarães Lins é – sim – um artista do mundo. Do mundo e, motivo de orgulho pátrio, é nosso – porque brasileiro. Lançado em outubro do ano passado, “My Heart Speaks” foi pensado para os mercados anglófono (leia Estados Unidos) e europeu. Tal pretensão nos deixou com o queixo lá embaixo – por causa, sobretudo, do brilho artístico dado pela orquestra de Tbilisi.

Os arranjos do Bob soaram tão bonitos e poderosos que ficou fácil cantar e tocar meu Rhodes. Grande vibração e excelente atmosfera o tempo todo Ivan Lins, pianista

Nada ali está fora do lugar: os arranjos sinfônicos construídos por Kuno Schmid, o piano, o baixo, a guitarra, o suingue, a latinidade. Percebe-se, ou melhor, ouve-se o mesmo requinte em “Abre Alas”. Dessa vez, Ivan permitiu que sete músicas de sua lavra recebessem a cintilância da big band liderada pelo saxofonista suíço George Robert, com arranjos criados por Bob Mintzer, maestro estadunidense do grupo de jazz fusion Yellowjackets.

Desenhos de sopro

Bob adicionou à música de Ivan desenhos de sopro, executados com vibração pelos instrumentistas da orquestra. Pela faixa-título, percebe-se o astral dos músicos tocando juntos, o prazer em encontrar novas nuances nas escalas e outras possibilidades para arranjar as composições selecionadas ao repertório. Pode-se dizer, contudo, que “Abre-Alas” é produto estético-artístico, vamos colocar assim, de uma coincidência japonesa.

No país nipônico, num episódio comum aos que frequentam os grandes círculos internacionais, Bob se viu hospedado no mesmo hotel que Ivan. O brasileiro estava em Tóquio, capital japonesa, para fazer uma série de shows no Blue Note. Bob Mintzer, claro, assistiu aos concertos. Queria entender como Ivan tocava com os músicos de sua banda.


		Ivan Lins ‘jazzifica’ ouvinte em novo disco
Capa do disco 'Abre Alas'. Foto: Divulgação

Publicado pela gravadora Mills Records, “Abre Alas” mexeu com George. “A música de Ivan tem sido parte da minha vida. Seu lirismo, sua noção única de melodia e harmonia têm me inspirado há muitos anos”, diz o saxofonista, explicando o desejo de gravar, com George Robert Jazz Orchestra, o álbum com título em português e dedicado à música de Ivan.

Há o inconfundível Fender Rhodes do brasileiro e a guitarra latina do uruguaio Leonardo Amuedo, músico que tocava com Ivans Lins na época em que “Abre Alas” foi gravado na Suíça, em 2009. “Os arranjos do Bob soaram tão bonitos e poderosos que ficou fácil cantar e tocar meu Rhodes. Grande vibração e excelente atmosfera o tempo todo”, afirma o pianista.

Com 53 minutos (talvez os melhores desta semana), o repertório tem “Abre Alas”, “Saudade de Casa”, “Madalena”, “Mi Corazón”, “Boa Nova”, “Começar de Novo”, “Passarela no Ar”, “Canción de Amor”, Velas Içadas” e “Over The Rainbow”. Dê o play e seja feliz.

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