‘Kind of Blue’, disco clássico de jazz, completa 60 anos
Diário da Manhã
Publicado em 21 de agosto de 2019 às 10:30 | Atualizado há 6 anos
Leon
Carelli
Executado
por um icônico sexteto de músicos, sob administração de Miles Davis, o álbum
“Kind of Blue” – o disco de jazz mais vendido de todos os tempos – é um retrato
do auge do gênero durante a transição das décadas de 1950 e 60. Admirado por
músicos de vários estilos e gerações, o disco completou 60 anos no último dia
17 e recebeu várias homenagens de artistas, críticos e de fãs espalhados pelo
mundo.
No
último dia 16, o escritor David Yarsley apresentou-nos um panorama de como os
60 anos do álbum foram percebidos ao longo de sua história. “Kind of Blue
vendeu como brownies. Sua popularidade só aumentou ao longo dos anos.
Frequentemente considerado o disco de jazz mais vendido da história, alcançou o
quádruplo status de platina em 2008.
Até
lá, cerca de quatro milhões de cópias foram vendidas nos EUA. Aos sessenta,
chegou a cinco milhões”, conta. Yarsley também traz o relatório técnico da
produção do disco: foi gravado em dois dias, com seis semanas de intervalo,
entre 2 de março e 22 de abril de 1959, com sessões vespertinas e noturnas.
Com
Miles Davis no trompete, John Coltrane e Julian “Cannonball” Adderley
nos saxofones, Bill Evans no piano, Paul Chambers no baixo e Jimmy Cobb na
bateria, somos apresentados aos 46 minutos de “Kind Of Blue”, considerado, por
sua simplicidade, um desembaçar de lentes que conectou o jazz ao grande
público, solucionando complexidades e estigmas que criavam uma barreira entre o
estilo musical e as pessoas.
“Miles
originou uma criação distintamente moderna para as massas em 1959 e a
capacidade do álbum de soar tão simples ao ouvido nu é um verdadeiro testemunho
de sua longevidade”, comentou a autora Faye Fearon, no último dia 30 de abril,
em colaboração à revista britânica GQ.
Modal
Para
conceber “Kind of Blue”, Miles Davis consultou previamente as teorias do
compositor George Russell, expressas no livro “Lydian Chromatic Concept of
Tonal Organization”, lançado em 1953. O material ajudou a substancializar o
conceito de jazz modal, presente anteriormente no disco “Milestones”, de 1958,
e purificado, principalmente, através de “Kind of Blue”, e do quarteto de John
Coltrane na primeira metade dos anos 1960.
De
acordo com o músico Art Farmer, o livro de Russell “abre a porta para inúmeros
meios de expressão melódica”. Ainda segundo a descrição do site Rate Your
Music, o jazz modal foi um precursor para o jazz de vanguarda, e elevou o nome
dos principais jazzistas da época ao destaque mundial.
A
autora Faye Fearon também fala do impacto de “Kind of Blue”, e do jazz modal,
no destino da música do século XX. “Basicamente, era totalmente moderno. E
chegou ao jazz com Davis, que primeiro empregou a técnica com a faixa
Milestones em 1958, mas verdadeiramente absorveu sua natureza definitiva
através de Kind Of Blue”, explica.
O
pacote entregue pelo sexteto, de acordo com a autora, foi batizado a partir do
temperamento das músicas, e elucida as nuances de seu espírito. “O álbum rola
como um humilde ambiente de tributo ao jazz, através de melodias esfumaçadas.
Davis concebeu o nome através do seu humor, abraçando o blues de uma forma
modal que soava fresca, moderada e atrativamente suave”.
Miles
A
postura provocativa do músico é lembrada como uma de suas características
marcantes na dissertação de Maria João Pereira para a Universidade de Aveiro,
em Portugal. Ela cita parâmetros comportamentais que permanecem vivos em sua
lenda.
“Este
grande músico é conhecido pelo público pela sua genialidade, pelo seu mau
feitio, pelas suas relações difíceis com as mulheres e com alguns filhos, pela
busca permanente do novo, (drogas, Ferraris, pintura) e pelo horror ao racismo
que sofreu na pele no seu próprio país por ser negro”.
No
campo musical, Miles é conhecido pelo perfeccionismo, pelo experimento de
ritmos e instrumentos, e pela capacidade de conduzir os sons. Seus ensaios
musicais, segundo Maria João Pereira, resultaram em fórmulas para vários
subgêneros do jazz.
“Além
de ser um excelente músico foi também, naquela altura, um inovador quanto ao
estilo novo de jazz, o cool-jazz, e mais tarde iniciou o seu próprio estilo,
usando elementos do rock, criando assim o hard-bop”. O músico era aberto às
novidades. “No fim da vida, um dos seus músicos de eleição foi Jimi Hendrix com
o qual Miles tentou nos anos setenta ter uma sessão de gravação, o que não se
realizou devido à morte de Jimi”.