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Lula nega existência de jogos que vão além de bang-bang

Fala de presidente não encontra lastro na realidade e tampouco entre pesquisadores

“The Sims”, vida como ela é - Foto: Divulgação “The Sims”, vida como ela é - Foto: Divulgação

Você está zangado, zangadíssimo. Passou um tempo dando braçadas na piscina de casa e os braços doem. O trabalho não vai bem, os rendimentos caminham com pressa para o vermelho, as contas se acumulam e, mesmo assim, a família precisa sobreviver.

Uma criança implora para que mãe e pai não se separem. Ela chora, coitada, como se a vida estivesse por um fio a cada vez que assiste aos pais brigarem. As lágrimas lhe escorrem pelo rosto até caírem num livro, iniciando-se o drama inicial: marido e mulher jogam para salvar o casamento. O que se extrai da jogabilidade soa bem óbvio: somos melhores juntos.

“The Sims” e “It Takes Two” são dois jogos que desmentem colocação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo o mandatário, não existem games falando de amor, ou educação, apenas que ensinam a “molecada a matar”. “E cada vez muito mais morte do que na Segunda Guerra Mundial. É só pegar o jogo dessa molecada”, afirmou o líder petista, durante encontro com representantes dos Três Poderes no Palácio do Planalto.

A franquia da EA Games tem 23 anos. Jogadores se habituaram a criar avatar, construir casas e se preparar para o trabalho. Depois, casam-se, os filhos nascem e, assim como na vida real, seus personagens morrem - seja com idade avançada ou não. Já a produção da Ninja Theory quer aproximar pessoas, uma vez que não se joga “It Takes” sozinho, você e a “máquina”. É pensando para casal às vias da separação ou amigos separados.

Pesquisas

Três pesquisas desenvolvidas em diferentes cursos da UFG discutem a relevância dos jogos eletrônicos. Segundo o educador Marcelo Freitas dos Santos, em trabalho vinculado à Faculdade de Educação (FE), os games oferecem realidades próximas às nossas, permitindo que o jogador explore e interaja com ambientes. “Sobre assuntos, muitas vezes, tratados nas salas de aula”, aponta, dizendo que essas tecnologias podem auxiliar na aprendizagem.

Já na visão de Victor de Abreu Azevedo, Giovani de Lorenzi Pires e Ana Paula Salles da Silva, em estudo da Faculdade de Educação Física (FEF) disponível no repositório da universidade, os jogos possuem capacidade de fazer com que a criança interaja com corpo. Para tanto, desperta-se sensações por meio de movimentos proporcionados na tela e apontam, por exemplo, relações entre os games com os esportes, como é o caso da clássica franquia “Fifa”, sucesso intergeracional - jovens de ontem e hoje a jogam.

Ao se indignar contra os jogos por causa da violência nas escolas, Lula não levou em consideração o fato de os games serem, na verdade, a expressão artística deste milênio. O pesquisador Walace Rodrigues, mestre em História da Arte, estabelece relação entre videogames e arte e mostra que há, sim, nos jogos elementos técnicos da linguagem fotográfica e cinematográfica. E, segundo ele, são importantes ferramentas pedagógicas.

“A facilidade dos utilizadores de games na compreensão de perspectivas construídas, tais como as perspectivas com vários pontos de fuga, mostram que há benefícios para o uso de videogames em arte-educação, e que estes games não devem ser desprezados enquanto elementos culturais que atingiram nossa juventude atual”, analisa o estudioso, no artigo “Os Videogames Enquanto Forma de Arte Atual na Educação Escolar”, consultada pelo Diário da Manhã no banco de dados da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc).

Sem lastro

Ou seja, nem todo mundo que acumula horas diante de telas consome jogos violentos, embora quem o faça não irá se tornar necessariamente uma pessoa violenta. É mais ou menos o raciocínio do ensaísta Daniel Galera: jogos de tiro em primeira ou terceira pessoas derivam das lutas juvenis e brincadeiras de mocinha e bandido quanto os filmes de Martin Scorsese e Quentin Tarantino, cineastas conhecidos por retratar o bang-bang - Tarantino, inclusive, filmou Hitler metralhado num teatro, em “Bastardos Inglórios”.

O publicitário Felipe Zaiden Rezende lembra, em trabalho apresentado no ano de 2009, que os jogos movimentam elevada quantidade de dinheiro. Ao lado do cinema, diz, é uma costela importante da indústria do entretenimento. Como exemplo, ele cita o game “Second Life”, simulador da vida real no qual o jogador realiza tarefas do dia a dia. Felipe aplica o conceito de cibercultura, ciberespaço e virtualidade desenvolvido pelo filósofo Pierre Lévy, autor das obras “Cibercultura” e “O Que é Virtual”, ambas referências no tema.

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