Cultura

O homem do catavento (parte 3)

Diário da Manhã

Publicado em 3 de fevereiro de 2017 às 02:10 | Atualizado há 8 anos

(QUARTO DE RAN)

Já se passaram três semanas desde que o velho da casa misteriosa foi morto, ao ser queimado vivo acusado de ser o homem do cata-vento. Ninguém de fato, sequer sabe dizer o nome dele, nenhuma das pessoas que lhe deram um tapa, um soco ou lhe cuspiu. Todos comentam na cidade, através de sussurros é claro, que o velho misterioso morreu. Apenas isso, o velho misterioso… Às vezes eu fico pensando nisso sabe, ele possuía um nome, sentimentos, sonhos, sensações. Mas ninguém esta preocupado, lhe batem agora a consciência, pois todos ajudamos a matar um inocente, mas ele não precisa de nome, era só um velho que não tinha nada.

Hoje é véspera de natal, desde aquela noite o homem do cata-vento não mais atacou, Tomy e eu, ainda somos as duas últimas crianças de Woonderville. Os pais de Tomy não o deixam sair de casa, eu também só posso ficar lá fora quando minha mãe está comigo e ela não deixa de segurar minha mão, nem sequer por um segundo. Ele ainda não está morto, acho que só está esperando…

Enquanto eu estava deitado em minha cama pensando sobre isso, o telefone toca me assustando. Minha mãe atendeu e me pediu para descer.

– Filho era o pai de Tomy ao telefone. Ele disse que Tomy insiste em passar o natal com você.

– Mas, e o homem do cata-vento mãe? Eles não sentem medo que ele possa atacar Tomy?

–  Acho que você não precisa se preocupar com isso filho esse monstro já desapareceu ha três semanas e juntos talvez vocês estejam mais seguros, acho que a melhor coisa para essa cidade foi aquele velho ter morrido mesmo.

No dia seguinte, Tomy e seus pais vieram passar o natal comigo e minha família. Pena que um de nós dois, não continuaria fazendo parte dessa história…

 

(NA NOITE SEGUINTE)

Eu e Tomy estávamos na sala, ele segurava a escada para que eu não caísse enquanto colocava os enfeites na árvore. Sua mãe e a minha estavam na cozinha preparando a mesa para o jantar, papai e o pai de Tomy bebiam cerveja do lado de fora da casa.

–  Tomy me dê essa estrela quero colocá-la no topo.

–  Toma cuidado ela parece ser de vidro. Isso deve ter sido caro Ran

–  Acho que meu pai deu a minha mãe no primeiro natal juntos.

Eu a segurava com todo cuidado, com as duas mãos era de fato um estrela linda. Equilibrando-me com os pés na escada, a estrela era tão perfeita, suavemente a deixei encaixar no topo do árvore. Ela refletia a janela atrás de mim, na imagem do reflexo eu pude ver na estrela, uma figura trajando um terno preto e uma máscara. Ele estava de volta, eu rapidamente me virei para vê-lo o que me fez desequilibrar, Tomy derrubar a escada sobre a árvore, derrubando os enfeites e me fez cair sobre os cacos cortantes, apenas minha perna direita foi perfurada. Infelizmente aquela linda estrela, lá do topo caiu, como uma estrela que morre e perde seu brilho ela se desfez em pequenos pedaços de vidro.

–  Ai! Ai! Ahhh

–  Mas que droga Ran por que você se virou daquele jeito para trás?

–  Ele está aqui Tomy, o homem do cata vento está aqui.

Com o barulho minha mãe e a mãe de Tomy vieram correndo até a sala.

–  Como isso aconteceu meu filho?

–  Eu me assustei mãe, mas, eu apenas cortei minha perna não é nada demais.

–  Sei… Boby! Boby! Por que seu pai não responde? Tomy vá lá fora e chame o pai de Ran

Tomy foi e voltou correndo, dizendo que eles não estavam lá fora. Mamãe foi ao banheiro pegar o kit para fazer um curativo na minha perna, a mãe de Tomy saiu à procura de seu marido e de meu pai.

–  Tomy vá até o meu quarto e pegue a faca que está embaixo do meu colchão.

–  Por que isso agora Ran?

–  Se ele estiver aqui, como eu sei que está, veio para levar um de nós dois. E eu não quero ser a próxima vítima daquele maníaco.

Tomy subiu até o meu quarto, ainda caído no chão eu apenas ouvi… A porta de o meu quarto bater e Tomy soltar um grito tão forte e assustador, que seria capaz de gelar a alma, até mesmo de uma pedra…

“Qual o valor de uma vida?”

Um único grito, prolongado por um longo período de segundos intermináveis. E eu ali estático no chão, esperando alguma reação de meu corpo. O grito de Tomy se cessou ao mesmo tempo em que sua mãe entrou em casa correndo e subiu em direção ao meu quarto, ela olhou para mim por um milésimo de segundos enquanto subia para salvar o seu filho.

Minha mãe apareceu correndo no topo da escada, deu passagem para a mãe de Tomy e veio até mim com as mãos sujas de sangue me abraçou. A mãe de Tomy tentava abrir a porta do quarto, a mesma estava trancada por dentro então enquanto ela gritava desesperadamente ela também socava a porta.

–  Tomy! Tomy! abra a porta filho. Tomy!

Tudo ficou em silêncio, apenas os gritos de sua mãe eram ouvidos e a cada intervalo de um de seus gritos era possível ouvir de dentro do quarto, um choro triste, assustado, baixinho…

–  Abra essa porta! Você disse que não faria mal ao Tomy, abra essa porta agora!

Eu e minha mãe trocamos o mesmo olhar quando descobrimos que a mãe de Tomy conhecia o homem do cata-vento, mais do que isso, ela sabia quem ele era. Mamãe me suspendeu em seus braços tentando me carregar em seu colo, mas, suas mãos estavam feridas e sangravam cada vez mais que ela tentava fazer esforços para me carregar.

–  Ran eu não vou conseguir levar você para um lugar seguro e você não consegue andar com a perna machucada assim. Então a mamãe precisa que você se esconda aqui tudo bem?

–  Sim mamãe, mas aonde a senhora vai?

–  Vou buscar ajuda gritar por socorro. Ele não vai te levar meu filho.

Mamãe me arrastou pela sala, ate o armário da cozinha. Eu sentia muita dor enquanto ela me arrastava o que tivesse ferido a palma das mãos dela, estava me queimando enquanto ela me arrastava. Mas eu não reclamei, não gritei de dor, eu fiquei com tanto medo, que aquilo era apenas uma fração do que estava para acontecer. Ela me colocou dentro do armário abaixo da pia, antes de fechar a porta ela me olhou nos olhos, pegou uma das facas que ficavam na segunda gaveta e me entregou.

–  Não importa o que ele te diga filho, se ele te encontrar aqui, mate-o. Não quero que você saia daqui, nem mesmo se eu o chamar.

Ela então me deu um beijo na testa, enquanto segurava comigo a faca, fechou a porta do armário e foi embora. Eu fiquei olhando pela fresta do armário ela sair, mas mamãe não abriu a porta da sala, ela subiu as escadas. Eu abri a porta devagar, enquanto a mãe de Tomy ainda gritava, empunhando a faca eu saia silenciosamente da cozinha me arrastando pelo chão, quando ouvi a porta do meu quarto ser destrancada, seguido por um grito de dor e desespero. Ao chegar à porta da cozinha vi o corpo da mãe de Tomy sendo jogado do topo da escada. Parado lá em cima ele a observava no chão, enquanto seu sangue se espalhava, seus olhos ainda abertos e com sinais de vida. Uma última lágrima eu vi escorrer de seu olhar triste e um último suspiro acalentar seu corpo.

O homem do cata-vento voltou para dentro do quarto, trazendo Tomy para fora o puxando pelos cabelos. Eles desceram as escadas, ele olhou em meus olhos ao passar por mim. Eu podia sentir o desespero de Tomy tentando se soltar, ele jogou Tomy para perto do corpo de sua mãe. Tomy acariciava o rosto dela, chorava em silêncio, suspirando. O homem do cata-vento me olhou com aquela máscara negra cobrindo seu rosto, ele entrou na cozinha e eu ouvi uma das gavetas se abrir.

–  Tomy vai embora, por favor, Tomy chame por socorro vai embora.

Tomy passava a mão sobre a poça de sangue de sua mãe espalhada no chão.

–  Ele matou minha mãe Ran. Ele matou a mamãe.

Eu ouvi barulho de metal na cozinha, o Homem do cata-vento veio rápido segurando um facão, Tomy se virou de frente para mim.

–  Ele matou minha mãe!

O homem do cata-vento cortou a cabeça de Tomy com um único golpe. Ela rolou pelo chão e parou próximo a parede. Ele caminhou calmamente até a cabeça de Tomy. Apoiando a ponta da faca no chão eu me arrastei mais depressa, enquanto ele se abaixou para pegar a cabeça de Tomy, eu esfaqueei sua perna. Ele gritou de dor, olhou para mim com uma expressão de ódio e novamente se voltou para pegar a cabeça no chão. Mais uma vez eu desencravei a faca de sua perna e voltei a cravá-la em seu joelho.

O som de uma sirene do lado de fora fez com que ele saísse pela porta dos fundos, ainda com a faca cravada no joelho e mancando. Eu peguei a cabeça de Tomy no chão, se era aquilo que ele queria ele voltaria para pegar.

“–  Me ajude… “Por favor, socorro me ajude.”

O homem do cata-vento estava caído na minha frente, com o terno rasgado e as costas muito machucadas sangrando. Eu fiquei ali, parado olhando ele implorar por ajuda. Eu observava também a faca na minha mão, sua silhueta de metal, seu corte, sua simplicidade e como ela refletia meu reflexo, aquilo era bonito. Eu não poderia matá-lo rápido, eu teria que me vingar de todas as crianças, cortar ele aos poucos… Sujar aquela silhueta de metal, várias e várias vezes com seu sangue, ver ele gritar, implorar e até pedir para matá-lo. E quando ele estiver quase morto eu vou machucá-lo mais e começar tudo de novo. Mas antes eu queria saber quem ele era, eu me abaixe perante ele. Olhei diretamente em seus olhos e ficamos assim, ele agora era a vítima e eu o assassino, eu retirei vagarosamente a máscara de seu rosto.

–  Mas não pode ser como você…

 

… aguarde continuação

 

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