Cultura

O macaco não era capitalista

Diário da Manhã

Publicado em 8 de fevereiro de 2017 às 01:18 | Atualizado há 8 anos

“O bipedismo foi, provavelmente, o resultado de todo um conjunto de pressões seletivas para o animal parecer maior e mais intimidante, transportar objetos, utilizar armas e aumentar a visibilidade” (Pilbeam, apud Laraia, 2006, p. 54)

 

Se todas as revoluções do século XX não conseguiram abrir caminho para o socialismo, o que dizer do papel da consciência sobre a conformidade existencial, condição intelectual amorfa da sociedade? A sabedoria marxiana avisa que “não é a consciência que determina o ser, ao contrário, a sua existência ou luta pela sobrevivência é que determina sua consciência”. A categoria consciência espelha qualidades do ser social nascido com herança. No lado reverso, e, na mesma moeda, a desqualificação exclui do trabalho o marginalizado a partir do ventre que o vomita à miséria da razão.

A conjuntura sociopolítica mundial divide campos da atuação (des) humana, hoje, estruturada em mercado. A diferença cultural separa o joio do trigo no balaio das vaidades. Uns creem na salvação e puxam de um lado a corda bamba que os separa dos descrentes, estes, certos de que o inferno existe, aqui e agora. A luta de classes retrata o poder da classe que dita regras e ostenta “status”, abençoados que ocupam a primeira classe no avião que leva ao céu, lordes centenários que detém o capital, as rédeas e o chicote do poder de manipulação no pago do salário parco embutido na mais-valia extraída do modo de produção capitalista selvagem. A segunda classe mal respira, sufocada no estigma e anomalia de pertencer e ilustrar os gráficos na linha em vermelho, e, mais abaixo, da falaciosa inclusão a partir da exclusão social, velha política pública designada à classe dos lazarentos, hoje, escravos modernos de Iphone às mãos, os quais digladiam no trânsito em carros superfaturados de potência um-ponto-zero.

O recorte histórico que emoldurada o século XX estampa o fenômeno da era na qual “tudo sucedeu e aconteceu”, inclusive, a descoberta de vacinas contra a epidemia do sexo livre ao som do vinil, da alergia na virilha por culpa do jeans e a barbárie de duas guerras mundiais. Essa reprodução social só acontece na sociedade em movimento, que projeta e fomenta a categoria da reprodução sociobiológica cuja gênese engendra a esfera dos seres vivos em guerra. Desigual e dialética a matéria orgânica ou o conjunto de reações físicas e orgânicas–do mais simples para o mais complexo–reação física igual o resultado da soma dela mesma com a química do intelectual orgânico. A totalidade é a síntese dessas partes e projeta-se a partir da arte do objeto para o todo e do todo para o ponto central ou verve da transformação da natureza. A Biologia superpovoa o sistema universal e toma emprestada uma parte sua, a Terra, tratando logo de espargir a reprodução da vida ao borrifar gotículas de sangue em água derramada.

Para os mamutes da ciência descartável, algo como a “filosofia da goiaba, que dá a goiabeira, que dá a goiaba”, fenômeno da expansão da acumulação do capital quando o homem passa a pagar pela goiaba com direito ao bônus do bicho que vive dentro dela. A espada de Darwin separa a teoria da peleja racional e lógica do jus naturalismo enquanto corrente jurisfilosófica que remonta às representações primitivas da ordem legal de origem divina. Essa visita os sofistas e estoicos, padres e escolásticos, racionalistas dos séculos XVII e XVIII enquanto ferramenta da causalidade e bênção divina sobre as espécies perpetuadas no milagre do sêmen ou semente, conforme a crença.

Todo ser vivo opera em intercâmbio material com o seu meio o processo de transformação da natureza e busca no alimento proporcionar sua sobrevivência. A luta cotidiana o faz pensar e articular a forma, transformar a matéria-prima pelo trabalho em seu habitat, a partir do “homo sapiens” que se transforma em ser pensante, pré-histórico, primitivo, agente da produção feudal, atabalhoado pela época moderna contemporânea a promover a invasão da terra, sua divisão e negação enquanto mercadoria com valor de troca. Aquele que detém o capital pretende a modernização do mundo na face oculta e reversa de uma moeda cunhada nas cores da falácia, exclusão, coação, dominação, trapézio da manipulação do mundo e de sua gente.

O trabalho é categoria fundante por separar o ser biológico do ser pensante tido pelos teóricos enquanto ser social. É a forma final, palpável ou não, resultado no intercâmbio material do homem com a natureza articulado entre o intelectual e a prática em campo capaz de transformar matérias orgânica e inorgânica, ideia em ideação na ação, explorar as propriedades do corpo humano. Por isso, a sociedade política aparece a partir do momento em que surge a sociedade produtiva explorada em seu trabalho–gênese da divisão de classes. Frágil, a abelha ensina ao elefante o que é então o trabalho, enquanto isso, a cigarra canta e encanta o verão, sem preocupar ou esperar pela morte por inanição, fome e frio no inverno. A ideação diferencia o arquiteto da abelha pelo pensamento e idealização antes de se fazer capaz de produzir a cera, sua obra cuja qualidade é alcançada na inteligência de sua construção. Se a Ciência avisa que ideia não abre coco, faz-se urgente produzir o machado, transformar e mudar a natureza, tirar dela as benfeitorias proporcionadas pela terra, água, sol e ar, umas das consciências que o indivíduo externa.

Nesse intervalo de respiro da alma a descoberta, também, de que por ser ainda inocente, a cria ou criatura sempre engole aos pedaços, e cru, seu criador, sobrevive a ele. Este é o processo de generalização que estende a outros meios de transformação ou catarse que vão surgir com diferentes intenções de usualidade, busca da lucratividade, lucro na ansiedade, novas oportunidades ou formas de exploração e expropriação da mais-valia obtida a partir do moer matéria bruta e gente no funil do cifrão. Processo de evolução da involução de uma sociedade moderna estampada na cor do sangue que define nas telas o teatro de Dante.

E o pulso, ainda pulsa!

 

(Antônio Lopes, escritor, filósofo,mestre em Serviço Social, pesquisador em Ciências da Religião/PUC-Goiás;aluno-ouvinte em Direitos Humanos/UFG)

 

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