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Da música ao cinema: Paulo Miklos criou importante obra nas duas áreas da cultura - Foto: José de Holanda/ Divulgação
Foi uma loucura a última vez de Paulo Miklos no Oscar Niemeyer. Pelo menos 10 mil pessoas saíram de suas casas para vê-lo com a formação clássica dos Titãs gritar versos lendários do pop punk concretista brasileiro. Utilizando o palco com perfeição, de um lado ao outro e tocando seu sax tenor, ele cantou absurdamente bem até nas alturas da revolta em “Bichos Escrotos”. Houve muito mais do que um show naquilo que vimos em junho de 2023.
Se a passagem pelos palcos goianos da turnê Encontro revelou a verdadeira dimensão dos Titãs, é certo que o encontro realizado no próximo domingo, 4, em dois horários - às 15h e às 20h - será interessante: veremos a versatilidade artística de Paulo Roberto de Souza Miklos, saxofonista, bandolinista, guitarrista, violonista, compositor e ator. Suas aparições no cinema costumam ser elogiadas, como a do filme “O Homem Cordial”, do cineasta Iberê Carvalho, que rendeu a Miklos um Kikito de melhor ator no Festival de Gramado, em 2019.
É quase um personagem autobiográfico. Nos anos 80, o roqueiro Aurélio fazia parte de uma famosa banda, mas - décadas depois - tornou-se alvo do cancelamento após vídeo circular nas redes mostrando-lhe envolvido numa confusão. Claro que o público começa a vaiá-lo nos shows: está cancelado, foi linchado e um Brasil se descortinou aos nossos olhos. Por ser figura pública - como o personagem -, Miklos o interpretou com propriedade e acredita que o longa colocou País na tela grande, “sem concessões e com uma linguagem radical”.
Aos 65 anos, homem do cinema e da música, o eterno titã é artista de versatilidade. Já viveu no teatro o jazzista Chet Baker - cujo papel, de acordo com o crítico Nelson de Sá, dispensou maquiagem, trompete ou voz. E entra em cartaz no próximo dia 22 o filme “Dá Licença de Contar”, no qual Miklos interpreta o sambista João Rubinato - nome real de Adoniran Barbosa. Vem aí ainda “Estômago 2 - O Poderoso Chef”, dirigido por Marcos Jorge, e está no streaming em “Jesus Kid”, adaptação para o romance escrito por Lourenço Mutarelli.
Quando recebeu convite do diretor Beto Brant para protagonizar o longa “O Invasor”, Miklos achou estranho. Me querem atuando, como assim?! Deixando pra lá as dúvidas, após claudicar um bocado e se questionar se isso de fato funcionaria, ele descobriu-se ótimo ator: viveu um assassino de aluguel. O rapper Sabotage lhe ajudou a construir o personagem ao compartilhar suas experiências no tráfico e, hoje em dia, para se ter ideia, é considerado pela Abraccine um dos melhores filmes brasileiros produzidos neste século.
Disco emocionante
Além da frenética atividade cinematográfica, Miklos emocionou muita gente com o disco “Do Amor Não Vai Sobrar Ninguém”. O álbum veio ao mundo em 2022 e, na primeira faixa, “Ao Teu Lado”, diz que canta para trazer alegria. “Eu estarei sempre aqui, ao teu lado, ó meu filho. E quando chorares sem solução, as tuas lágrimas colho pra mim”, declama o artista, após bela introdução tocada no piano elétrico. É como se fosse um pedido de casamento, um desejo de marcha nupcial, descontrai o artista num comunicado à imprensa.
Essa ação - casar com alguém - costura as músicas. Ouve-se isso, por exemplo, na abertura: “Nós vamos trocar alianças, não vai nos faltar esperança, eu estarei sempre ao teu lado.” Miklos se revela apaixonado, gosta de estar assim e, amando, é capaz de burilar versos de linhagem docemente romântica. Uma explicação para a escolha da temática pode estar na vida pessoal, já que o eterno titã - de cuja banda, aliás, saíra em 2016 - redescobriu o amor. Sua paixão a essa altura é Renata Galvão, com quem se casou há quase cinco anos.
Nem tudo foi perfumado pelo amor, entretanto. Na década passada, Miklos chorou partida da ex-mulher, vitimada por um câncer - era sua companheira desde 1982. A música “Todo Esse Querer” evoca a matéria-prima consagrada por Paul McCartney nas suas composições: o amor. Amando os novos sabores e gostando das cores mais vivas, Miklos recita que os olhos querem a amada: na pintura, vê o rosto dela; na música, ouve a voz dela; no vestido, delicia-se com a pele dela. E, com estilo, diz: “Fica pra sempre, só uma noite, eu descobri.”
Se esse minuto é toda vida que não viveu, o artista se encontra mais leve para celebrar Sabota, o rapper que lhe falou como foi possível escapar do crime com vida, no set de “O Invasor”. Com sopro de metal ao fundo, a música “Sabotage Está Aqui” apresenta um rock de balanço funkeado e paisagem de verão. “Já escapei tantas vezes só com meus versos. Sempre foi assim. Já escapei tantas vezes. Desses perversos. E sumi”, diz a letra, que tem uma alma menos folkeada do que as outras de “Do Amor Não Vai Sobrar Ninguém”.
Esse disco - terceiro sem os Titãs do profícuo compositor - é para ser ouvido no embalo do amor. Recomenda-se que isso seja feito ao som da bela “Ao Teu Lado”, da essencial “Se o Amor Ainda Existir” ou da comovente “Do Amor Não Vai Sobrar Ninguém”. O álbum “Do Amor Não Vai Sobrar Ninguém” se mostra, indiscutivelmente, um grande acontecimento da música brasileira. Da new wave colorida dos Titãs - passando pela porrada na cabeça dinossauro ou pelo estado violência daquele jesus sem dentes no país dos banguelas - até a poesia tocante do amor, Miklos tem talento versátil: é homem de música e cinema.
Paulo Miklos na mostra O Amor, a Morte e as Paixões
Domingo, 4
Às 15 e 20h
Oscar Niemeyer
Avenida Deputado Jamel Cecílio, 4490
Entrada franca
