Cultura

Planet Hemp revisita 30 anos de fumaça no Goiânia Arena

DM Redação

Publicado em 16 de outubro de 2025 às 19:46 | Atualizado há 2 horas

Quebrando tabu: Marcelo D2 (à esquerda) diz que banda puxou discussões necessárias para o Brasil - Ronaldo Land e Fernando Shclaepfer
Quebrando tabu: Marcelo D2 (à esquerda) diz que banda puxou discussões necessárias para o Brasil - Ronaldo Land e Fernando Shclaepfer

Marcus Vinícius Beck

Pela última vez em palco goianiense, o Planet Hemp queimará até a última ponta nesta sexta-feira, 17, no Goiânia Arena, a partir das 22h30. O grupo carioca — pega a visão — mantém o respeito, dando um pega diante da galera que fez a cabeça nos últimos 30 anos.

Pô, cumpadi, passa a bola — não enrola. Os cães ladram, diz o Planet aqui no som, mas a caravana não para. Vai ter aquele punk rap furioso do primeiro CD, “Usuário”, de 1995, que consagrou o raprock’n’rollpsicodeliahardcoreragga fecundado no underground.

“O Planet Hemp surgiu com menos de 10 anos após a ditadura”, diz o rapper Marcelo D2, destacando que o grupo foi vanguarda ao falar das drogas. “Puxamos conversas que foram necessárias para a sociedade, levantando assuntos que nem podiam se falar nos anos 1990.”

Uma camiseta da banda punk Dead Kennedys interessou Luís Antônio da Silva Machado (1967–1994), o Skunk. Filho do patrão e da empregada, o poeta perguntou se Marcelo Maldonado Peixoto, o Marcelo D2, curtia mesmo o grupo californiano formado em 1978.

Resposta positiva, começou a testá-lo, inquirindo-o sobre músicas e discos. “Skunk era assim mesmo, abusado, sem-vergonha e cara de pau, um perfeito relações públicas”, sublinha o biógrafo Pedro de Luna, autor de “Planet Hemp — Mantenha o Respeito” (leia na página 14). A amizade entre eles, marcada pela intensidade, resultou na fundação do Planet Hemp.

Antes de lançar o primeiro CD, a banda conquistou público fiel na noite alternativa do Rio de Janeiro e São Paulo. Em 1994, no entanto, veio o baque: Skunk morreu de forma precoce, aos 27 anos, vítima de Aids. Velho conhecido do Planet, o rapper BNegão assumiu os vocais.

“O Planet tem essa coisa singular de ser uma banda underground que habita o mainstream de forma convicta. Isso vai ser levado às últimas consequências”, avisa o rapper BNegão, que assina quatro faixas no CD “Os Cães Ladram Mas a Caravana Não Pára”, de 1997.

Até “Usuário”, o bagulho era louco: os caras do Planet atropelavam um verso no outro pra que a polícia não sacasse a letra. Falar de maconha? Proibido. D2 recorre ao mestre: “Bezerra [da Silva], eu peço licença para falar em seu nome”, canta na segunda música do disco.

Vigorava no Brasil, desde 1976, a Lei de Tóxicos, que estabelecia “medidas de prevenção e repressão ao tráfico ilícito e indevido de substâncias entorpecentes”. Ou seja, o Planet leva a descriminalização da maconha à esfera pública, como diz o cientista social Pedro Mundim.

É o que se pede nas 17 composições de “Usuário”: legalize já. Na música que hasteia a bandeira pró-cannabis, a banda salienta que o “álcool mata bancado pelo código penal”. Confessa, em “Fazendo Sua Cabeça”, que “maconha, meu irmão, não pode lhe prejudicar”.

Facetas: Planet Hemp foi formado no underground, mas consegue habitar mainstream – Foto: Fernando Shclaepfer

Durante a divulgação do CD, o Planet teve mais dores de cabeça. O Ministério da Justiça, à época comandado por Nelson Jobim, vetou a exibição do clipe de “Legalize Já” antes das 23h. Dirigido por Márcia Leite e Raquel Couto, o vídeo trazia um cara bolando um baseado.

Na madrugada do dia 9 de novembro, domingo, os músicos Marcelo D2, Black Alien, Formigão, Bacalhau, Zé Gonzales e Jacksom foram presos por policiais da Delegacia de Tóxicos e Entorpecentes, em Brasília. BNegão escapou, pois estava no Rio de Janeiro.

Hoje em dia, se diria que o Planet viralizou. O segundo álbum do grupo, “Os Cães Ladram Mas a Caravana Não Para”, vendeu 300 mil cópias naquela semana. Foi uma enorme exposição midiática, com espaço na imprensa e debate sobre a legalização da maconha.

Ironicamente, o juiz Vilmar José Barreto Pinheiro, que expediu o mandado contra os artistas, foi condenado à aposentadoria compulsória pelo Conselho Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios por receber R$ 40 mil de propina para soltar um traficante.

No disco “A Invasão do Sagaz Homem Fumaça”, de 2000, o Planet retomou o episódio de Brasília. “Advinha, doutor, quem tá de volta na praça”, debochou em “Ex-Quadrilha da Fumaça”. Ao falar do “Contexto”, porém, a banda ironiza: “Se a polícia chegar, eu jogo tudo no banheiro.”

Após hiato, sai “Jardineiros”, em 2022, cujas letras tratam de política com a verve furiosa que tornou o grupo um clássico do rock brasileiro. “Fizemos um belo trabalho nesses 30 anos de carreira, mas tudo tem um final. O Planet tem uma energia muito forte que não queremos que se apague”, afirma D2. É o que Goiânia irá ver hoje. D2, mas mantenha o respeito.

PLANET HEMP – BASEADO EM FATOS REAIS

Quando: nesta sexta-feira (17/10)

Onde: Goiânia Arena

Ingressos aqui


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