Poesia visual
Redação DM
Publicado em 7 de outubro de 2016 às 02:23 | Atualizado há 5 mesesO primeiro espetáculo da companhia goianiense Treição, que reúne teatro, dança, música, audiovisual e ritual e, será encenado hoje no Teatro Sesc Centro, às 19h45, tem emocionado plateias de Goiânia e de algumas cidades do Estado. A montagem intitulada Treiçã o– Os Beija-Flores Vêm Beijar Seus Corações estreou mês passado no Teatro Sonhus, em sessão lotada, depois passou por Pirenópolis e Morrinhos. Como rastro deixou um público emocionado, que ao final do espetáculo até se manifestou.
“Creio que Treição foi uma das peças que mais me marcaram. Ainda estou apreendendo o conteúdo e em especial proveniente das fendas e frestas que se abriram em meu ser”, escreveu à companhia a psicológa Marciclene, após ver a peça.
Embalados por músicas e danças que evocam canções tradicionais dos nativos brasileiros, a montagem tem forte influência do povo indígena, uma relação que vai desde a música e figurino, até a forma pacífica com a natureza. A relação com o meio ambiente, juntamente com a discussão de questões sociais, aliás, é o mote do espetáculo. Contudo, de acordo com o ator e co-diretor do espetáculo Charles Rosa Rodrigues, nada é passado de forma massante.
“Este é um trabalho que traz reflexões, mas sem ser chato, didático ou panfletário. Muito pelo contrário, fala direto ao coração priorizando a beleza, a magia e o encanto com cenas que são verdadeiros poemas visuais”, explica o ator, que divide a direção do espetáculo com os Silvana Castro. A seguir, o artista contou, em entrevista ao DMRevista, um pouco da história da companhia e as intenções e significados de seu primeiro espetáculo, confira a seguir.
Entrevista Charles Rosa Rodrigues – ator e co-diretor do espetáculo
DMRevista – Treição significa traição, correto? Por que escolheram este nome para a companhia e espetáculo?
Charles Rosa Rodrigues – Treição, como magistralmente nos explicam os autores Bariani Ortencio e Hélio Moreira, em sua origem, nas fazendas, era um ajuntamento de trabalhadores para capinar uma roça, plantar, colher, fazer benfeitorias… Enfim, uma ajuda completa a um amigo necessitado de mão de obra. Depois vinha a compensação: o pagode; aliando assim a mão de obra dos vizinhos à festa proporcionada pela reunião de grande número de conhecidos num ambiente de alegria e franca camaradagem. Chamava-se apenas treição ou mutirão de traição. Assim, “treição” foi como a palavra ficou sendo pronunciada pelo caipira. Quem recebia a ajuda a recebia de surpresa. Ou seja, por não saber, era “traído”. O mutirão simples era um acontecimento lindo pela união e ajuda mútua entre as pessoas, podendo ser convocado e organizado pelo próprio fazendeiro que recebia a ajuda. Esse espírito de colaboração nas fazendas é herança da sabedoria dos povos nativos que viviam e vivem em comum-unidade, dando prioridade sempre ao coletivo. Mas, ao longo dos anos, essa tradição foi se perdendo e o que era “um por todos e todos por um” (e consequentemente, Deus por todos) foi-se tornando “cada um por si e Deus contra todos!” com o advento das grandes cidades e do capitalismo selvagem, onde predomina a competição e o “salve-se quem puder!”; gerando as mais horrendas desumanidades. Escolhemos este nome para a Cia e para o espetáculo por ser uma palavra vinda das nossas raízes goianas e porque ela é carregada de todo esse significado de ajuntamentos humanos para um novo mundo e uma nova humanidade que está em curso.
DMRevista – A peça estreou mês passado e – pelo pouco tempo de estreia – já passou por muitos lugares. Como a peça tem sido recebida pelo público?
Charles Rosa Rodrigues – Isso. Estreamos no Teatro Sonhus com casa lotada no dia 4 de setembro. Em seguida circularmos por Morrinhos, Pirenópolis e Aparecida de Goiânia. Depois voltamos pra casa no Goiânia Ouro nos dias 1º e 2 passados. E agora fecharemos a primeira rodada da Treição com essa apresentação no Teatro Sesc Centro. Mesmo antes da estreia do espetáculo, o projeto tem sido muito bem recebido pelas pessoas que tornaram ele possível numa verdadeira treição. Foram patrocinadores, “matrocinadores” (termos que carinhosamente cunhamos para uma parcela das pessoas que nos ajudaram), apoiadores, colaboradores e benfeitores de um financiamento coletivo que fizemos online. Esse projeto foi e continua sendo feito com o suporte de muita gente, sem as quais ele não seria possível.
DMRevista – O espetáculo mistura teatro, dança, performance, audiovisual e ritual. Como estas linguagem são mostradas no espetáculo?
Charles Rosa Rodrigues – O uso dessas linguagens não foi uma decisão racional a priori antes da criação do roteiro do espetáculo. Todas elas foram entrando e se encaixando nos seus devidos lugares através dos insights que foram surgindo durante a criação do roteiro e durante os meses de montagem do espetáculo. Como artistas, fomos apenas servindo ao natural fluxo de criação que perpassava por nós. E achamos natural o surgir dessas artes integradas, pois, em sua origem, não havia essa divisão estanque das artes em compartimentos e todas as linguagens que percebemos separadas hoje estavam presentes juntas num único evento ritual. E um ritual é acima de tudo o que é essa Treição.
DMRevista – Os atores também cantam ao vivo?
Charles Rosa Rodrigues – Sim. Cantamos canções populares, sagradas, músicas tradicionais de vários povos nativos do mundo inteiro. Foram algumas escolhidas dentre as várias que nós da Treição conhecemos em vivências de autoconhecimento das quais participamos regularmente.
DMRevista – A relação dos índios com a natureza é a principal influências do espetáculo?
Charles Rosa Rodrigues – Sim. Mesmo não sendo perfeitos, já que humanos, os povos nativos ao menos viviam e ainda vivem ecologicamente em equilíbrio com o meio ambiente onde habitam; com a Mãe Terra. No geral, são mal vistos e mal retratados por nossa voraz e destruidora sociedade ocidental consumista. Quisemos fazer a nossa parte para fazer justiça a essas, que são algumas das pessoas mais lindas que existem no planeta hoje. Além dessa justa homenagem aos povos nativos, essa é uma obra que fala principalmente de amor e consciência. Fala de ecologia no amplo sentido da palavra; homenageando especialmente a nossa grande Mãe Terra. Fala de compaixão por todos os seres vivos, fala do sagrado, fala de ajuntamentos humanos e de um novo paradigma de humanidade.
DMRevista – Pode nos contar um pouco da história da companhia?
Charles Rosa Rodrigues – Tudo começou a mais ou menos 14 bilhões de anos com uma grande explosão… Peraí! Vamos encurtar a história, né? Rs… Todos nós, integrantes da Treição, somos pessoas humanas sensíveis à realidade absurda na qual ainda vivemos (mas que já está em galopante curso de transformação) e que, indignadas com tudo isso, procuramos fazer a nossa parte, dando o nosso melhor. Todos nos conhecemos em contextos de autoconhecimento, aperfeiçoamento do se ser humano e de curas de todos os níveis (espiritual/energético, físico, emocional e mental). Vivências que são realizadas no Instituto Serra da Portaria em Paraúna através da Psicologia Transpessoal e vivências com plantas de poder enteógenas da Medicina Tradicioal das Florestas em vários lugares do nosso País.
Espetáculo: Treição – Os Beija-Flores Vêm Beijar Seus Corações
Quando: Hoje, às 19h45
Onde: Teatro Sesc Centro (Rua 15, esquina com Rua 19, Quadra 34, Setor Central, Goiânia)
Ingressos: R$ 5 (comerciário), R$ 7,50 (meia) e R$ 15 (inteira)
Censura: 7 anos