Rock dadaísta
Diário da Manhã
Publicado em 14 de janeiro de 2016 às 20:56 | Atualizado há 4 meses
Dan Van Vliet, o poeta, compositor e pintor mais conhecido por seu nome de palco, Captain Beefheart, traçou uma carreira norteada por experimentalismos e vanguarda na música e na pintura. Junto com sua banda de apoio, The Magic Band, gravou 12 álbuns. O mais consagrado deles, ‘Trout Mask Replica’, de 1969, é considerado um dos discos que mais influenciaram o percurso do rock nos anos seguintes nos Estados Unidos. Ao mesmo tempo, é considerado um dos registros mais estranhos e de difícil apreciação já realizados.
Trout Mask Replica é uma espécie de desvio à percepção universal da música, e o Captain Beefheart é considerado uma espécie de iconoclasta da arte. O disco é uma confecção minuciosa de psicodelia e surrealismo. Utiliza na fórmula elementos de blues, freejazz, avant-garde e vários elementos da música americana. É como se ele estudasse os elementos da música improvisada, separasse algumas partes e repetisse-as de forma programada, quebrando qualquer previsão do ouvinte, trazendo algo novo em sua essência.
Anti-rock
Em resenha ao disco no site RateYourMusic, o internauta Laranra, de Córdoba, Espanha, faz um aparato geral sobre suas impressões de Trout Mask Replica. Segundo ele, os músicos inspiraram-se em obras visuais para compor as canções. “Reza a lenda que o Capitão construiu essas faixas com a ajuda de pinturas com diferentes sobras, para explicar aos membros da banda o que ele queria em cada canção”. Ele comenta ainda associações do disco ao movimento dadaísta. “Essa é apenas uma instância da característica pictorial do disco, que tem sido ocasionalmente comparado ao movimento dadaísta”.
O movimento dadaísta surgiu na segunda década do século XX, como um protesto que enxergava o mundo como uma destruição mútua contínua. Para os dadaístas, o movimento não fazia arte. Chamavam seus produtos de ‘anti-arte’. Para Laranra, “Está bem claro que não é um disco simples. Talvez por essa razão eu possa dizer que gosto. Loucamente. Por todas essas razões e pela respiração estranha que me puxa para estranhos gemidos, passagens ‘a capella’ e letras absurdas”.
Outros momentos memoráveis da carreira de Beefheart na música são as canções contidas no primeiro disco, ‘Safe as Milk’, de 1967. A canção “Electricity”, desse disco, é considerada por boa parte dos fãs como sua melhor produção. Para muitos, ‘Safe as Milk’ mostra um lado menos desconstruído do Capitão e sua banda, apesar de várias passagens e arranjos denunciarem uma futura obra ainda mais surreal e derretida. Don Van Vliet morreu no dia 17 de dezembro de 2010 na Califórnia por complicações em decorrência de esclerose múltipla um mês antes de completar 70 anos.
Pintura
Na segunda metade da década de 1980, Don Van Vliet decidiu encerrar sua carreira na música para que pudesse dedicar-se exclusivamente à pintura. A partir de 1985 foi visto poucas vezes publicamente. Seu trabalho como pintor também atingiu êxito, e suas obras tem sido cada vez mais requisitadas. Na época, ele decidiu abandonar a música e o nome artístico para não passar a impressão de que seu trabalho se tratava de ego de músico em fim de carreira. Para ele, não era positivo der suas duas obras associadas.
O estilo de pintura de Van Vliet foi definido como expressionismo abstrato. Sua obra foi comparada à obra do novaiorquino Franz Kline, pintor bastante popular na metade do século XX, que difundiu o gestualismo (ou pintura gestual), onde a ação de pintar se faz presente diante do público. Vliet também teve seu trabalho associado ao movimento CoBrA, um dos poucos movimentos de vanguarda na Europa pós Segunda Guerra Mundial, que unia artistas de três cidades (Copenhague, Bruxelas e Amsterdam – as primeiras letras dos nomes das cidades formam o acróstico CoBrA).