Economia

De FHC a Lula, IOF de cartão internacional mudou seis vezes nos últimos 20 anos

DM Online

Publicado em 30 de maio de 2025 às 17:30 | Atualizado há 1 dia

Personagem principal do debate mais recente sobre as tentativas de aumento na arrecadação da gestão Lula 3, o IOF (imposto sobre operações financeiras) é uma ferramenta de regulação do mercado prevista na Constituição, utilizada pelo governo como forma de controlar a entrada e saída de capital estrangeiro, o consumo e o crédito.
A legislação do imposto sofreu diversas mudanças em quase 60 anos vigência. Desde o fim da década de 1990, no entanto, as alíquotas do IOF passaram por um processo de padronização, impulsionadas pela consolidação do plano real, mas também apontaram aos governos um caminho silencioso para subverter sua concepção original, servindo para suprir demandas fiscais e arrecadatórias.
A pedido da reportagem, a Abracam (Associação Brasileira de Câmbio) fez um levantamento dos últimos 23 anos de variações do IOF em operações envolvendo o cartão de crédito no exterior ou pré-pago internacional e cheque de viagem.
O ano de 2002, já no fim do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), é um ponto de partida importante por dois motivos: naquele período o Brasil se recuperava da desvalorização do real; a aplicação do imposto nas operações de compra de moeda estrangeira e gastos com cartão no exterior, criada em janeiro de 1999 com alíquota inicial de 2,38%, ainda engatinhava no vasto rol de possibilidades do IOF.
Entre dezembro de 2002 e o início de 2008, o IOF sobre os gastos feitos no exterior com cartão de crédito foi de 2%. Em janeiro daquele ano, no auge do governo Lula 2, o imposto foi revisto para 2,38%.
Em março de 2011, início do mandato de Dilma Rousseff (PT), o IOF acelerou para 6,38%. Foi a saída encontrada pela equipe econômica para conter o fluxo de capitais, controlar os gastos feitos por brasileiros fora do país e equilibrar o câmbio.
Com a forte entrada de dólares na economia, o real ficou fortalecido e gerou problemas para a indústria nacional: enquanto o preço das exportações subia, as importações ficaram mais baratas. A moeda norte-americana ainda operava abaixo de R$ 1,60.
Em dezembro de 2013, outro ajuste foi feito, aplicando IOF em compras utilizando cheques de viagens e carregamento de cartão internacional pré-pago. Foi adotada a mesma alíquota de 6,38% dos cartões de crédito.
Apesar da inesgotável crise econômica e política que carregou o Brasil após 2013 e da constante elevação do dólar, o governo federal passou 11 anos sem alterar as alíquotas para gastos com cartão. Neste intervalo, foi aplicada somente uma taxa de 1,1% para a compra de moeda em espécie e remessa para contas no exterior (ambas durante o governo Michel Temer).
PACTO VISANDO OCDE
A partir de 2022, com o crescente interesse do governo Jair Bolsonaro em incluir o Brasil na lista de países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), o então ministro da Economia, Paulo Guedes, estabeleceu o escalonamento do IOF entre 2023 e 2028 com o objetivo de zerar o imposto ao fim do ciclo, retirando sempre 1 ponto percentual a cada ano.
A ideia era promover maior liberalização do fluxo de capitais estrangeiros e de transações invisíveis, prática comum entre os países da organização. A renúncia fiscal estimada do governo seria de R$ 19,1 bilhões ao longo do período.
Para 2023, a alíquota inicial sairia dos já tradicionais 6,38% para 5,38%, caindo para 4,38% em 2024 e 3,38% em 2025.
No último dia 23, no entanto, o governo Lula reajustou para 3,5% o IOF aplicado em compras no exterior, compra de moeda em espécie e transferências internacionais para terceiros, revertendo a norma editada por Bolsonaro.
A Receita Federal prevê uma arrecadação próxima de R$ 20 bilhões em 2025 e R$ 40 bilhões em 2026 com a medida anunciada, junto com o congelamento de despesas.
Para a Abracam, a aplicação do IOF é importante no controle da volatilidade cambial e dos fluxos especulativos, porém a guinada recente do ministro Fernando Haddad mostrou que a utilização da ferramenta econômica serve mais para suprir demandas fiscais do que controlar moeda.
O impacto é horizontal: atinge de setores da indústria a contribuintes que mantém estudantes no exterior e trabalhadores que enviam recursos para sustentar suas famílias em outros países.
Nessa semana, a associação criticou o rompimento do compromisso assumido por Bolsonaro em 2022 e afirmou que o recuo de Lula criava uma “descontinuidade de políticas públicas”.
Para a Abracam, o interesse do Brasil em participar da OCDE serviria como um “benchmark de padrões reconhecidos internacionalmente”, elevando a competitividade da economia.
“A zeragem do IOF era um marco nessa direção, alinhando nossa legislação tributária às práticas adotadas por países membros, e dando um passo no mesmo sentido da autonomia do Banco Central e da modernização da legislação de câmbio. A interrupção desse processo é encarada como um retrocesso pontual”, disse a associação à Folha.
Questionada se pretende judicializar a discussão, a Abracam explicou que o debate vai além do Judiciário e envolve a articulação de um “diálogo construtivo” pela importância de uma convergência internacional visando o bem comum do país, o setor privado e as preocupações do governo federal.
“Com maior previsibilidade regulatória e convergência internacional podemos estimular o fluxo de comércio exterior e a atrair novos investimentos, com um mercado mais competitivo temos maiores condições de contribuir com as preocupações fiscais de forma sustentável e sem prejudicar a sociedade”, pontuou a associação em nota.

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