Economia

Dólar cai após discursos de Lula e Trump na ONU

Léo Carvalho

Publicado em 23 de setembro de 2025 às 14:31 | Atualizado há 1 hora

Lula e Trump durante discursos na Assembleia Geral da ONU. Mercado reage a sinais de aproximação Brasil-EUA | Foto: Ricardo Stuckert/Planalto e ONU
Lula e Trump durante discursos na Assembleia Geral da ONU. Mercado reage a sinais de aproximação Brasil-EUA | Foto: Ricardo Stuckert/Planalto e ONU

O dólar está em queda firme nesta terça-feira (23) após os discursos dos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Donald Trump na Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), realizados pela manhã.

Foi a primeira vez que ambos os líderes ficaram no mesmo ambiente desde que Trump aplicou sanções ao Brasil, em maio, e, após deixar o púlpito, o republicano afirmou que irá se encontrar com Lula na próxima semana.

Os mercados agora recalibram expectativas em torno das tensões tarifárias, políticas e diplomáticas entre os dois países. Às 13h, a moeda norte-americana recuava 0,88%, cotada a R$ 5,290. Na mínima do dia, chegou a tocar R$ 5,279. Já a Bolsa tinha forte alta de 1,19%, a 146.846 pontos, renovando a máxima histórica intradia.

Química entre líderes

Ao fim de seu discurso, marcado por críticas às Nações Unidas, Trump confirmou que se encontrou brevemente com Lula antes de subir ao palco e que houve “excelente química” entre os dois.

“Eu só faço negócios com pessoas que eu gosto. E eu gostei dele, e ele de mim. Por pelo menos 30 segundos nós tivemos uma química excelente, isso é um bom sinal”, disse o americano, que discursou após o petista. Ele afirmou que ambos os líderes vão se encontrar na próxima semana, em um aceno à desescalada de tensões entre os dois países.

A sinalização deu fôlego para as cotações, levando o dólar à mínima em mais de um ano e a Bolsa a um novo recorde durante o período de negociações. “Abre-se caminho para o que não tinha acontecido até agora: Trump sentando à mesa para conversar com o Brasil. Pode ter uma flexibilidade nas tarifas de 50%, aumento da lista de isenção… Ele disse pouco, mas é uma sinalização muito valorosa”, diz Daniel Teles, especialista e sócio da Valor Investimentos.

Encontro Lula e Trump

O discurso de Trump sucedeu o de Lula. O presidente dos Estados Unidos estava em uma sala reservada da ONU e acompanhou todo o discurso do brasileiro, recheado de críticas a ações dos Estados Unidos. O petista entrou na sala ao deixar o púlpito. Trump tomou a iniciativa de falar com ele, porque já estava no local quando o presidente chegou, segundo integrantes do governo.

Trump disse que eles precisavam conversar. Lula afirmou estar aberto a fazer conversas, que sempre esteve. O americano então sugeriu que poderia ser na próxima semana a reunião, ao que Lula confirmou.

O encontro aconteceu um dia após o governo Trump ampliar as sanções a autoridades brasileiras e ao entorno do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), em reação à condenação de Jair Bolsonaro (PL) a 27 anos de prisão.

Jlgamento de Bolsonaro

Ao citar o julgamento do ex-presidente no discurso, Lula defendeu a legitimidade do processo. “Bolsonaro teve amplo direito de defesa. Diante dos olhos do mundo, o Brasil deu um recado a todos os candidatos a autocratas e àqueles que os apoiam”, disse, em alfinetada a Trump. Ele voltou a dizer que “nossa democracia e soberania são inegociáveis”.

O discurso de Lula na ONU era esperado por investidores, que, nos últimos dias, demonstraram cautela em torno da possibilidade de novas medidas retaliatórias dos EUA contra a economia brasileira. As sanções aplicadas na segunda-feira atingiram Viviane Barci de Moraes, esposa do ministro Alexandre de Moraes, e não o país, levantando dúvidas sobre uma possível escalada de tensões.

Ministro da Fazenda

Antes dos discursos, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, endereçou a guerra comercial entre os dois países em entrevista ao ICL Notícias. Para ele, a imposição de sobretaxas sobre produtos brasileiros, em especial commodities, foi um “tiro no pé”, uma vez que a medida, “impensada”, penaliza o consumidor americano ao encarecer o “café da manhã, o almoço e o jantar”.

Haddad chamou a ação americana de “ingerência indevida” e “intromissão descabida”, mas que a guerra comercial é uma oportunidade para o Brasil avançar em mudanças estruturais. “É um momento auspicioso, em que podemos fazer o que nunca tivemos coragem de enfrentar”, afirmou.

Ele ainda ponderou sobre a taxa de juros do Brasil, mantida em 15% pelo Copom (Comitê de Política Monetária) na semana passada pela segunda reunião consecutiva.

“Eu entendo que tem espaço para esse juro cair. Acredito que nem deveria estar em 15%. Mas enfim, está, mas tem espaço para cair”, disse, acrescentando que “boa parte do mercado financeiro” também vê espaço para queda de juros.

Estabilidade da Selic

A fala segue a esteira da divulgação da ata do Copom sobre última reunião. O documento atestou que, para o BC (Banco Central), a política monetária entrou em uma nova fase após um “firme” ciclo de elevação dos juros.

Com a taxa Selic estacionada em 15% ao ano, o maior patamar em duas décadas, o comitê pretende examinar os impactos acumulados da política de juros para avaliar se o plano de conservar a taxa no atual patamar por tempo “bastante prolongado” será suficiente para levar a inflação à meta.

Para Leonel Mattos, analista de Inteligência de Mercado da StoneX, a ata confirmou as intenções do BC em manter a taxa Selic inalterada e que o grande desafio, agora, “é ver sinais consistentes de estabilização inflacionária para que a trajetória da política monetária comece a mudar”.

Mercado e trade

“Isso tende a pressionar a taxa de câmbio para baixo, embora a ata apenas expanda o que nós já vimos no comunicado divulgado após a decisão. Ainda que parte dessa conclusão já estivesse precificada, a ata reforça que os juros ficarão em um patamar estável por bastante tempo no momento em que o Federal Reserve retoma seu ciclo de cortes”, avalia.

No mercado cambial, essa dinâmica tende a ser uma boa notícia. Isso porque a manutenção pelo Copom e o corte pelo Fed aumentam a diferença entre os juros de lá e os daqui, e, quanto maior essa diferença, mais rentável é a estratégia conhecida como “carry trade”.

Nela, pega-se dinheiro emprestado a taxas baixas, como a dos EUA, para investir em ativos com alta rentabilidade, como a renda fixa brasileira. Assim, quanto mais atrativo o carry trade, mais dólares tendem a entrar no Brasil, o que ajuda a valorizar o real.

O mercado agora olha para frente, atento a novas sinalizações sobre a política monetária dos Estados Unidos. O discurso de Jerome Powell, chefe da autoridade monetária americana, no início da tarde é, nesse sentido, outro destaque da agenda do dia.

“As falas vão ajudar investidores a calibrar suas expectativas sobre a trajetória de juros nos Estados Unidos e entender qual pode ser a velocidade e a intensidade do ciclo de corte de juros proposto nesse momento”, diz Mattos.


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