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Amores livres

Redação DM

Publicado em 10 de março de 2023 às 23:49 | Atualizado há 2 anos

Muitos ainda podem torcer o nariz, mas o fato é que há muita gente em dilema com o modelo de relacionamento mais comum na sociedade: o monogâmico. Dentro dele, o indivíduo tem apenas um parceiro, seja sexual ou romântico, durante a sua vida ou durante períodos. Mas os relacionamentos abertos têm atraído cada dia mais adeptos. O assunto está em pauta. Nomes conhecidos, como Will Smith, Bela Gil e Aline Wirley, já revelaram não ser monogâmicos. Este tipo de relacionamento pode ter diversos nomes como: poliamor ou relacionamento livre. Mas o que seus adeptos parecem mesmo querer é fugir de rótulos.  

Este é o caso do  arquiteto Nilo Martins, 40 anos, que há cerca de dois anos se assumiu como uma pessoa não monogâmica. Porém, desde os 21 anos,  quando vivia um relacionamento monogâmico, ele questionava os sentimentos contraditórios de posse e ciúmes em relação à liberdade que almejava para si e para os outros.

 “Na época, minha namorada era bi (sexual) e muitas vezes ela estava com uma amiga e eu pensava: porque não está comigo? Existem outras questões e gêneros e não tinha sentido eu ficar nesse lugar e, também queria conhecer outras pessoas”, conta ele, ao mesmo tempo ressaltando que nunca foi adepto da traição que ele via nos relacionamentos de familiares e amigos. Por isso encara encara a não-monogamia como uma revolução social.

“Muita gente deixa  a namorada em casa e vai trair ela.. É como se a não monogamia só funcionasse para os homens, porque o homem consegue mais separar o afeto amoroso do sexo, enquanto as mulheres têm mas barreiras i. Como a monogamia foi construída em uma sociedade patriarcal, é claro que vai desfavorecer as mulheres e nós já evoluímos como humanidade,  mas temos que evoluir mais”, debate.

Atualmente, ele está em um relacionamento em que evita rótulos e se sente feliz em conhecer novas pessoas e ver a parceira viver outros relacionamentos. Mas ele explica que a forma com que vivencia o amor envolve uma construção que foi se moldando aos poucos. “Não é fácil, mas relacionar-se não é”.

Entre os maiores desafios deste tipo de relacionamento, Nilo conta que é encarar os olhares da sociedade. “Antes de me assumir, fiquei refletindo o que as pessoas iam pensar que aquele primo machista iria dizer  que eu sou corno manso… Mas vi o quão idiotas são esses pensamentos. E acho importante se declarar como tal para as pessoas verem que é possível. Uma vez que você se declara, você vai contra a estrutura e dá essa abertura de paridade de gênero: se eu posso fazer (ficar com outras pessoas), você também pode e você deve “, argumenta. 

 

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  Arquiteto Nilo Martins, 40 anos, vive há dos anos um relacionamento aberto há dois anos

Amores e vibradores

Para notar que não era adepta à monogamia, foi preciso apenas um relacionamento  – com direito à troca de aliança e quando tinha 16 anos – para a estudante Sarah Lopes, 24 anos, perceber que não era sua. Começou a ter acesso às discursivas não-monogâmicas e se identificou.  

“Vi que  os meus relacionamentos não eram próximos à lógica monogâmica e que eu não tinha a menor intenção de formular e estipular o formato ideal para as minhas relações”, explica. 

Atualmente, conta que está em vários relacionamentos, de várias formas diferentes. “Dou uns beijinhos em estranhos, amigos ou nos encontros com alguns amores por aí… Mas estou em um relacionamento seríssimo, e exclusivo, com os meus vibradores” revela. 

Quando questionada a respeito dos desafios e vantagens desse tipo de relacionamento, explica que a questão é variável já que  a sua perspectiva pessoal pode ser muito limitada às suas experiências e impressões, e não, necessariamente, ter relação direta ao que se entende de uma “relação livre”. 

“Mesmo assim, eu arrisco dizer, que a vantagem pode ser a possibilidade de assumir ideais e posicionamentos que condizem com aquilo que realmente faz sentido pra você. A desvantagem pode ser a consequência de certas irresponsabilidades ou do desconforto em ter que trabalhar e demandar tempo e esforço para construir relações cotidianamente, independente da configuração de relacionamento que vocês assumirem”, analisa.

 

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 Estudante Sarah Lopes, 24 anos, optou por ter relacionamentos livres quando começou a ter acesso às discursivas não-monogâmicas

                  Para especialista,  não-monogamia caminha para ser aceita mais amplamente

O conceito de relacionamento aberto tem sido abordado, desde a década de 1970, na época do movimento hippie, com a chegada da pílula e da maior liberdade sexual. Porém, a psicanalista e escritora carioca Regina Navarro Lins, que é autora de 13 livros sobre relacionamento amoroso, entre eles o best seller “A Cama na Varanda” e  “”Novas Formas de Amar”,  em entrevista ao portal Portal Makingof, afirmou que historicamente as relações abertas eram permitidas,  mas apenas para os homens.

“Eles saíam, tinham relações e,  obviamente, não engravidavam. As mulheres sabiam, mas diziam que isso era coisa de homem e aceitavam, até para não criar problemas na manutenção do casamento e da família”, explica na entrevista.

A psicanalista ressalta também que desde o Século XIX, se vive uma era do amor romântico, que prega que as pessoas precisam se transformar em uma só e prega a ideia de quem ama não deseja mais e não transa fora da relação. “Quando a pessoa descobre que o seu amado ou amada está transando com outro ou outra imediatamente ela pensa que não está sendo mais amada”,  argumenta.

No entanto, esclarece que a boa notícia, é que esse tipo de amor tem se enfraquecido. E, para ela, já vai tarde.  “Hoje, a grande viagem do ser humano está muito mais em olhar para dentro de si, procurando novas possibilidades em tudo. E o amor romântico é o contrário disso, prega o oposto, a não individualidade. E aos poucos, ao sair de cena, o amor romântico abre espaço para aquilo que é a questão básica deste tipo de sentimento, a exclusividade”

Ela também aborda o fato da sociedade ainda não aceitar as relações abertas, mas acredita que, assim como aconteceu com o divórcio, que nas décadas de 60 e 70, em que foram feitas as primeiras separações, eram marginalizados, aos poucos, vai ser mais aceita.

“Sempre foi normal e cheia de tabus as transições de valores, principalmente,    quando não existem parâmetros para se apoiar. Então, essa questão da não monogamia vai passar por todo esse processo também até ser aceita mais amplamente”, analisa.

                                    “Há uma busca por relacionamentos saudáveis e menos controladores”

 

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  Com Poliana Queiroz,  Gabriel Coelho, vive um relacionamento livre há quatro anos e meio

A frase é do psicólogo e mestre em psicologia com especialidade em conjugalidades e demandas não-monogâmicas, Gabriel Coelho. Ele se dedica aos estudos em terapia de casal e família há 20 anos. Ele também é adepto do relacionamento aberto e, atualmente, mantém dois relacionamentos estáveis e livres em uma rede afetiva composta por quatro pessoas. Em entrevista ao DM, fala do aumento da procura por casas que desejam viver essa experiência em Goiânia e também como lidar com eventuais ciúmes nas relações e julgamentos da sociedade. Veja trechos da entrevista a seguir.

DM – A procura por casais que desejam abrir a relação tem aumentado em Goiânia?
Gabriel Coelho – Eu tenho a sensação que cada dia mais pessoas e conjugalidades se interessam por viver, ou experimentar, algum tipo de não-monogamia, não só em Goiânia, mas no Brasil inteiro. Em meu consultório, a busca por acolhimento de demandas relacionadas à não-monogamia tem aumentado consideravelmente nos últimos dois anos, o que confirma essa sensação.

DM – A que atribui esse aumento?
Gabriel Coelho – Atribuo esse aumento ao crescimento de movimentos que questionam o amor romântico e a estrutura relacional monogâmica e patriarcal como o feminismo, o movimento LGBTQIAP+ entre tantos outros que têm ganhado espaço nas redes e mídias, conquistando cada vez mais adeptos que buscam na quebra de padrões relacionais viverem relacionamentos mais saudáveis, livres e prazerosos. Os motivos que levam as pessoas a serem não-monogâmicas podem ser variados, mas todos passam pelo questionamento do amor romântico e da exclusividade sexual compulsória, como validador do relacionamento amoroso. A busca, em geral, é por relacionamentos mais saudáveis e menos controladores e possessivos. Características que contribuem para as violências, abusos e chantagens nos relacionamentos tradicionais.

DM – Como é o trabalho, na terapia, com os casais que almejam o relacionamento aberto?
Gabriel Coelho – Me dedico aos estudos em terapia de casal e família desde o início de minha graduação na PUC-GO no ano 2000. Em minha abordagem terapêutica atual não digo mais que faço terapia de casal, mas sim terapia conjugal, pois estou aberto a receber outras conjugalidades, que não apenas o casal, trisal, redes de afetos e outras formas de viver a relação afetivo/sexual são mais do que bem vindas em meu consultório.  Em termos de rotina, o atendimento procede da mesma maneira, com atendimentos quinzenais e sessões com duração de 90 minutos. O diferencial é que trago para a clínica o conhecimento teórico e vivencial das relações abertas, livres e/ou não-monogâmicas.

DM – Como lidar com o ciúme que pode ocorrer neste tipo de relacionamento?
Gabriel Coelho – O ciúme pode e certamente fará parte de qualquer relacionamento não-monogâmico. Todos fomos criados e educados sobre a perspectiva do amor romântico, que valida o ciúmes como prova de amor. Desta forma, o ciúmes constitui culturalmente nossa afetividade. Em uma perspectiva não-monogâmica, o ciúme não é visto como prova de amor, mas sim como um sentimento que dá vazão para nossas inseguranças pessoais e relacionais. Então, a proposta é que encaramos ele como responsabilidade de cada um, que pode ser compartilhada pelas pessoas que compõem a rede afetiva desta pessoa (amigos, familiares, afetos, amores e metamores), sendo que a pessoa que vivência o ciúmes é a primeira responsável por criar estratégias e ferramentas para lidar com esse sentimento de maneira saudável, sem culpar outras pessoas.

DM – Como lidar com os pré-julgamentos na sociedade?
Gabriel Coelho – Ser uma pessoa não-monogâmica em uma sociedade monogâmica é estar em constante destaque. Olhares e comentários curiosos, julgadores e fetichizados serão comuns no dia-a-dia. As estratégias, devem ser desenvolvidas por cada pessoa e/ou conjugalidade. De todas as formas,  processos terapêuticos, leituras e estudos sobre o tema e a formação de uma rede de apoio segura, preferencialmente composta de outras pessoas não-monogâmicas contribuem para a construção de um posicionamento pessoal e político mais sólido,  que ajuda a enfrentar e encarar esse olhares e comentários.

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