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História de Goiás

Diário da Manhã

Publicado em 21 de fevereiro de 2018 às 23:39 | Atualizado há 4 meses

No momento em que a classe política perde a credibilidade perante os olhos da população, cresce o prestígio de homens que no pas­sado souberam, pelas suas ati­tudes, pelo seu devotamento, impor-se à admiração popular, transformando-se com o passar dos anos em exemplos.

Nesses tempos em que au­menta o desencanto com relação ao cenário político, ganha im­portância a figura de Pedro Lu­dovico Teixeira, o Velho Cacique, que fez de sua carreira política uma espécie de sacerdócio.

Interventor no tempo de Ge­túlio Vargas, Pedro Ludovico foi o criador de Goiânia, a cidade “construída do nada”. A Revolu­ção de 1930 fez do líder político o personagem de um marco na his­tória de Goiás, graças a virtudes e a tenacidade desse dirigente.

Como o próprio Pedro Ludo­vico revelou, Goiânia foi constru­ída com indescritíveis sacrifícios, consolidando-se como uma das mais jovens capitais do País. Em 1933, foi aprovado o projeto de construção do Palácio das Esme­raldas, que tem a simbologia de uma Meca para os políticos que almejam um dia ocupá-lo. A his­tória goiana recente tem demons­trado que essa morada dos go­vernadores pode ser o princípio e o fim de uma carreira política. Aqueles que fracassarem pode­rão estar sepultados no despres­tígio. Pedro Ludovico governou o Estado em um período difícil.

Em outubro de 1945, quan­do houve o golpe militar contra o presidente Vargas, Pedro Ludovi­co enviou telegrama a José Linha­res com o seguinte conteúdo: “Te­nho o prazer de cumprimentar V. Ex.ª pela honra de ter substituído o maior presidente da Repúbli­ca que o Brasil já teve. Aproveito a oportunidade para depositar em suas mãos o cargo de interventor federal neste Estado.”

Logo após, vieram as eleições para o Senado (dezembro de 1945), quando Ludovico se ele­geu com maioria expressiva, in­terrompendo o mandato em 1950 para disputar o governo do Estado, ganhando as eleições. Como chefe do Executivo esta­dual, permaneceu por três anos e meio, disputou o Senado mais uma vez, tendo sido eleito em 3 de outubro de 1954.

O velho Pedro tinha o hábito de cultivar amizades. Pelos amigos dedicava lealdade incondicional. Certo dia, regressando de Brasí­lia com destino a Goiânia, já como senador, viu um carro parado no acostamento da BR-153, e o moto­rista sendo abordado por policial rodoviário. Pedro reconheceu logo tratar-se do amigo Jairo Camargo Ramos, procurador do Rio Grande do Sul, na época prestando servi­ços para o governo de Goiás. Ime­diatamente determinou ao mo­torista que parasse o automóvel, desceu e gritou: “O que aconteceu, Jairo?” Quando reconheceu o se­nador, o guarda foi logo desculpan­do-se, nervosamente. Disse tratar­-se apenas de inspeção de rotina, nem mesmo chegara a inspeção de rotina, nem mesmo chegara a pedir os documentos ao condutor.

Nas eleições de 7 de outu­bro de 1962. Pedro Ludovico disputou o terceiro mandato de senador, mas não chegou a cumpri-lo integralmente, pois seria cassado em outubro de 1969 pela Junta Militar que na época governava o País.

Em seu último discurso no Senado, o fundador de Goiâ­nia pressentiu que seria víti­ma da ditadura:

“A força, a ameaça, a opres­são podem prevalecer por algum tempo; podem conseguir impor­-se aparentemente, nada conse­guindo construir de sólido, de du­radouro. Podem fazer vítimas, podem agradar a involuídos men­tais, podem até angariar proséli­tos na vasa dos perversos, dos que veem tudo através do seu mesqui­nho ponto de vista. Nunca terão o consenso dos homens que se es­forçam por um mundo melhor, por uma justiça social mais hu­mana, mais consentânea com os mandamentos que a consciência nos indica e nos impõe.”

Antes de sua cassação pelo go­verno militar, o presidente Costa e Silva já havia recebido o proces­so e se negou a puni-lo:

“Eu não vejo motivo para a cassação do senador Pedro Lu­dovico.”

Ao perder os direitos políticos, Pedro Ludovico Teixeira recebeu de Juscelino Kubitschek uma car­ta na qual o ex-presidente se con­fessava surpreso e revoltado: “Os cassadores estão mesmo apuran­do a pontaria e só a aplicam nas caças mais preciosas e finas. O que os incomoda é a existência de um grande e autêntico líder que sobrepairou sobre todos os tu­multos e dificuldades e conservou a sua autoridade e o seu prestígio de chefe querido e respeitado.”

Tive o privilégio de conviver com Pedro Ludovico, embora por pouco tempo. Havia falado com ele em 1968, quando ain­da era senador, acompanhado do deputado Anapolino de Faria. Na verdade, Pedro era para mim uma espécie de mito.

A nossa amizade se consoli­dou mesmo quando José Rodri­gues de Queiroz, meu pai, en­fermo no Hospital São Salvador, em Goiânia, recebeu a visita do “Velho Cacique”. Na época, Pe­dro estava cassado e amarga­va o ostracismo de político sem mandato, mas fiel aos amigos.

Num canto do apartamen­to, jovem, politicamente imaturo, ouvi a conversa dos dois, sorvendo os ensinamentos que partiam de duas experiências somadas. Para mim era o começo de um apren­dizado na leitura sobre trajetórias de vidas que se tornaram grandes exemplos a serem seguidos.

Honrado com o convite de Pe­dro Ludovico, passei a frequen­tar a sua residência, e conhecer de perto aquele que durante 30 anos foi o político mais poderoso de Goiás, interventor, criador de Goiânia, governador e senador da República por três vezes.

Pedro Ludovico Teixeira mor­reu pobre.

Luiz Alberto de Queiroz, advo­gado e escritor, autor de 22 livros, entre eles: O Velho Cacique (sobre Pedro Ludovico, 9ª edição), Mar­cas do Tempo (de Getúlio Vargas a Tancredo Neves, 3ª ed. esgotada), Iris, O Carisma (em parceria com Jorge Lyra, 3ª ed. esgotada), Olím­pio Jayme – Política e Violência em Tempos de Chumbo, (1ª ed. – esgo­tada), Memorial de um Rebelde (UDN x PSB), 2ª ed. esgotada).

 

OPINIÕES SOBRE PEDRO LUDOVICO TEIXEIRA

 



 “Goiânia foi fruto do idealismo, da perseverança e da pertinência de Pedro Ludovico, padrão de dignidade, que tudo fez pelo seu Estado e pelo seu povo, realizando um governo austero, voltado para o bem comum e dentro dos mais lídimos princípios de moralidade administrativa.”

Everardo de Sousa, desembargador, 24 de outubro de 1989

“A história precisa ser contada porque é complexa e instrutiva. Pedro Ludovico lega um desempenho ao longo de meio século. Erros e acertos têm de ser aferidos e julgados de acordo com os devidos tempos, as devidas circunstâncias e o devido meio. De uma coisa há sentença irreformável: sua memória tem por merecer o respeito geral, como a memória do senador Ramos Caiado.”

José Asmar, escritor, 10 de dezembro de 1989

“(…) Um homem de sua época, um homem bom, pessoalmente honesto. Pedro Ludovico olhava mais o interesse público, acima do interesse particular. Morreu pobre, vendo que era mais necessário ser administrador do que político, patrimônio esse que Mauro Borges conservou, como eu também herdei do meu pai, Jales Machado.”

Otávio Lage Siqueira, ex-governador de Goiás, 25 de junho de 1997

“Goiânia era a menina dos olhos de Dr. Pedro Ludovico Teixeira. Ele era um homem de bem, mas de temperamento forte e alternativo. A nova capital de Goiás custou-lhe muita luta e muita firmeza.”

Hélio Seixo de Brito, ex-prefeito de Goiânia, 10 de maio de 1997

“(…) Cassado, já octagenário (ou quase), vivia o Dr. Pedro dessa modesta pensão do Senado e de eventuais vendas de gado. Isso lhe bastava porque ele levava uma vida simples, sem ostentação. Certa vez, pensei comigo: se o Dr. Pedro, por acaso, tiver a má sorte de sofrer uma doença prolongada que lhe exija internações hospitalares e cirurgias, aí os seus rendimentos não suportarão os gastos. Felizmente isso não aconteceu.”

Bento Odilon Moreira, ex-delegado substituto da Receita Federal de Goiás, 20 de julho de 1997

“Das injustiças da Revolução de 64, a cassação de Pedro Ludovico Teixeira foi a maior, irreparável, pois este homem merecia respeito e consideração.”

Dante Ungarelli, ex-presidente do Instituto do Desenvolvimento Agrário, 9 de novembro de 1989


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