Maria Bonita: a quadrilha rememora com música a luta do cangaço
Diário da Manhã
Publicado em 21 de junho de 2018 às 23:43 | Atualizado há 4 meses
- A quadrilha no Cabaret Voltaire. Festa também lembra cinco anos das jornadas de junho de 2013
Denominado junho de 2013, o levante popular que levou milhares de pessoas às ruas tem sua áurea resgatada e admirada atualmente por conta do contexto pós-golpe. No entanto, as revoltas políticas e sociais não são nenhuma novidade na história do mundo, tampouco do Brasil. Quilombos, Canudos – narrado brilhantemente na obra Os Sertões, do jornalista e escritor Euclides da Cunha – e Revolta da Vacina são tidos como exemplos de manifestações que marcaram nossa história. O movimento cangaceiro também deixou sua marca visível até hoje nas páginas da historiografia e foi responsável por dar vida a canções de Zé Ramalho e Nação Zumbi. Antes de tudo, o cangaço é uma forma de protesto contra injustiças sociais que atingiram – e ainda atingem – as regiões economicamente mais pobres do País.
O movimento possui em Maria Bonita uma de suas figuras mais importantes. Criada no sertão da Bahia e obrigada a se casar aos 15 anos, o que lhe provocou um matrimônio conturbado e violento, ela virou a primeira mulher a participar de um grupo de cangaceiros. Era considerada à frente de seu tempo, encontrou no grupo a liberdade que precisava. Pegou em armas e enfrentou opressores. Com sua entrada para o grupo de lampião, abriu-se oportunidades para que outras mulheres fizessem o mesmo, iniciativa proibida até então. Um exemplo disso é Sérgia da Silva, mais conhecida como Dadá, que, além de ser responsável pela estética dos bandoleiros, era a única que carregava um revólver calibre 38 na cintura. Ela ainda ajudava na defesa e nos ataques promovidos pelo grupo de Lampião.
Todavia, após quase uma década de atuação no chamado “banditismo social”, Maria Bonita e o restante de suas companheiras foram capturadas pela polícia, mortas e decapitadas, com as cabeças expostas ao público como forma de exemplo caso alguém subvertesse as regras vigentes. Entre passado e presente, eis a conexão: a luta popular contra o Estado. Sim, o movimento cangaceiro reproduzia em certa medida problemas de gênero, como a determinação de papéis específicos para homens e mulheres. Mas o resgate da simbologia em torno de Maria Bonita e seus feitos acabam sendo também uma forma de resistência, seja de classe via o banditismo ou frente ao machismo, com postura contra a sociedade da época.
Em função disso, o coletivo Metamorfose organiza hoje, às 22h, no Cabaret Voltaire, próximo ao Campus Samambaia da Universidade Federal de Goiás (UFG), no Setor Itatiaia, um “arraiá” subversivo com o objetivo de rememorar as lutas travadas pelas cangaceiras. A festa contará com “intervenção junina”, comidas típicas, quentão, música característica do sertão, shows com as bandas Retalha Vento, Cocada Coral e discotecagem de DJ Monique Goyana e Heitor Volta Seca, que irá animar o evento no início. Para molhar a palavra, o público terá opção de beber cerveja Antarctica, que custará R$ 4,00 a lata de 350 ml. A expectativa dos organizadores é de que aproximadamente 400 pessoas compareçam ao evento.
Esperando ansiosamente o pontapé inicial da Maria Bonita: a quadrilha, a cientista política Lays Vieira, 28, explicou que o segundo evento do Metamorfose, assim como a festa Liberté – Maio 2018, tem propósito de manter viva a memória histórica das conquistas femininas. Segundo ela, o primordial é fazer com que o público reflita sobre o que passaram as bandoleiras, além de se sensibilizar em relação a problemas que elas tiveram de enfrentar ao longo da vida. “Tendo em vista esses ingredientes, vamos fazer uma festa com pegada de empoderamento às mana e com cunho reflexivo, já que nossa intenção não é seguir a velha cartilha de eventos não feitos na capital, e sim mudá-la e proporcionar algo novo e inédito para o público”, endossa.
Já a compositora e integrante da banda Cocada Coral, Nathália Kaule, 28, disse que a apresentação do grupo é “de rachar o asfalto”. De acordo com ela, que é autora da maioria das letras, o público irá se deparar com canções que exaltem a liberdade no pensamento e expressão. “A gente coloca em primeiro plano a consciência política e, como não podia deixar de ser, vamos rememorar as lutas promovidas pela Maria Bonita, pois somos um grupo musical formado por mulheres”, afirma ela, que é a vocalista. Para a musicista, o momento atual pelo qual o País passa necessita que haja cada vez mais pegadas assim. “Não há como fugir dessa temática”.
JUNHO DE 2013
“2,85 não, porrada no busão!” Essa frase foi encontrada em diversos cartazes durante a jornada de junho de 2013 e expressa com fidelidade a revolta da população com medidas que atendiam as classes mais abastadas. Ao contrário do que se divulgou à época, as ondas de protestos contra a alta da tarifa do transporte público teve início na capital goianiense e, a partir das barricadas e queimas de pneus em avenidas movimentadas, serviu de inspiração para outras cidades do País fazerem a mesma coisa. As manifestações acabaram provocando reivindicações para melhorias às áreas de educação e saúde, além servir como canal para se contestar o sistema político-econômico do Brasil, abrangendo anarquistas, comunistas e autonomistas.
Há cinco anos, o País inteiro sentiu borbulhar o Levante Popular de Junho de 2013. Divisor de águas na história dos movimentos sociais, Junho de 2013 é considerado um marco na organização dos trabalhadores brasileiros, sendo responsável por gerar novo ciclo de lutas em que a ação direta e horizontalidade ganharam projeção na organização das pautas populares. Além disso, os protestos influenciaram inúmeros focos de resistência nos últimos anos, como as ocupações de secundaristas contra as Organizações Sociais (Os) em 2015, de universitários em 2016, as lutas contra as reformas promovidas pelo governo Temer 2016 e, mais recente, a greve dos caminhoneiros, que paralisou o País durante uma semana.
PROGRAMAÇÃO:
22h – Heitor Volta-Seca (discotecagem)
23h- RetalhaVento(banda)
00h – Intervenção Junina (quadrilha aberta a todos)
1h – Cocada Coral (banda)
2h – Monike Goyana (discotecagem)
SERVIÇO:
Maria Bonita – A quadrilha
Data: sexta, dia 22/06
Horário: apartirdas22h
Local: Cabaret Voltaire – Rua 8, quadra 51, lote 07, Conjunto Itatiaia, 74690-340 – Goiânia
Entrada: 10 reais (sujeito a alteração)