Misteriosa caravana: Tarot
Redação DM
Publicado em 9 de outubro de 2018 às 02:58 | Atualizado há 6 meses
Nuvens coloridas, sensações perdidas pelo espaço tempo. Quando uma manifestação artística diz uma verdade, outro perceber de algo barroso, como não escutar? A banda O Tarot, de Brasília, consegue transparecer com a autenticidade de quem se permite a possibilidade do novo.
O Tarot é composta por Caio Chaim (voz, teclado e letras); Lucas Gemelli (acordeon, guitarra, bandolim e letras); Vinicius Pires (guitarra); Victor Neves (baixo); e Tavares (bateria e percussões). E no mês de agosto, na festa Viva Arte II, a banda pela primeira vez se apresentou em Goiânia.
Talvez um jogo com 22 cartas não seja o suficiente pra contar a história desses meninos que tem tanto a dizer, sobre o mundo, sobre si mesmos e principalmente sobre a fusão entre os dois. “A gente segue a ordem do tarô, a lógica dos arcanos maiores é a jornada do ego, do 0 ao 21.
As 22 cartas são os arquétipos desse processo de descoberta que é cíclico, você chega a um ponto e se renova”, conta a banda. Todos os álbuns do O Tarot são correlacionados aos arcanos maiores do baralho, quiçá a banda seja na verdade uma grande incógnita a ser simplesmente percebida.
Somos um grupo unido em torno de uma ideia de melhora coletiva, essa é nossa principal filosofia, conectar
Entrevista
O que mais senti de vocês é a diferente percepção da realidade, vocês trazem uma ‘coisa’ na arte que pouco se vê na nossa geração, vocês acreditam que arte é política?
A gente acredita que a arte é uma manifestação, ela trás percepções de mundos distintos, nas nossas letras e músicas tentamos criar uma narrativa, história, uma reflexão. Sem dúvidas, a arte é política. Na verdade se a arte fosse encarada como a verdadeira política as coisas se resolveriam bem, como a gente falou no show a arte é a única solução que temos.
Qual o papel da arte nesse momento que vocês vivem, a arte de vocês? Como vocês encaram a arte de vocês?
A arte sempre esteve vinculada com a vanguarda, processos de ruptura, zeitgeist, o status. O que tentamos fazer de forma bem modesta é criar nosso universo com a nossa leitura de mundo para que pessoas se conectem com nossa mensagem construtiva de forma positiva.
Qual a essência de vocês?
Saindo do campo das músicas, somos um grupo unido em torno de uma ideia de melhora coletiva, essa é nossa principal filosofia, conectar pessoas, conexão eu diria. Estamos muito conectamos com a espiritualidade, escolha do nome, a questões das cartas está muito na nossa história, bem metafísico, a carta é um objeto a gente resignifica, as pessoas que escutam O Tarot entendem da espiritualidade e se conectam com algo maior, algo que se sente.
Como a banda percebe as pessoas se identificando com o mundo que vocês criam?
Fiquei pensando sobre isso, a gente fala muito sobre uma visão diferente de mundo, sempre existe aquele clichezão de banda ‘vamos mudar o mundo’, vamos espalhar nossas ideias, a gente está mais interessada em tocar as pessoas mais do que mudar o mundo, porque se você entrar em contato com uma pessoa você acaba mudando o mundo de alguma forma, é muito emocionante chegar nos lugares que a gente não conhece e conhecer aquelas pessoas. A gente recebe com muita felicidade, cada abraço no meio da trajetória, é legal ver que a mensagem chega nos ouvidos que ela tem que chegar. As pessoas que se conectam e por que acreditam de fato. Um termo que usamos para nos descrever e descrever nosso público é a ideia da caravana, pessoas que viajam juntas, vão pro mesmo lugar, a vida é uma trajetória, essa viagem louca. O Tarot prega isso, servimos a mesma idéia, que é a proposta do O Tarot de mostrar as cartas, é um oráculo, a pessoa faz sua leitura e encontra uma forma de resolver o problema.
A arte enquanto manifestação, a arte de vocês tem o propósito de mudar alguma coisa?
Eu espero que sim, tudo que fazemos é pensando em conectar as pessoas, no show a gente vê se a pessoa se conectou, sensação de dever cumprido. Não tem muita política nas nossas letras, mas temos muita base de querer criar relações melhores entre as pessoas, a mudança vem da pessoa, mas a arte é um grande começo, faz você olhar as coisas de outra forma.
É uma manifestação do quê?
Eita! Essa é uma das entrevistas mais profundas que a gente teve até hoje cara (risos). O que é existir? Caramba, existir pra que será que se destina.. Acho que se a gente vai discutir no campo da existência, ela é muito além desse campo terreno aqui, talvez daí que venha essa história dos nosso símbolos e do misticismo, da conexão e de reencontros. Quiçá existir tenha um verbo implícito no existir que eu acho que é uma característica muito humana que é o vencer a morte de alguma forma, de dizer que passamos por aqui, e a arte é um meio muito eficaz pra isso. É a capacidade de se fazer arte que nos diferencia dos outros animais, e o que é curioso é que a arte ela sempre vive um ponto de crescimento, uma grande agitação em momentos de profunda crise: econômica, política, social. Então, esse talvez seja um dos maiores indicativos, uma das maiores provas de que a arte é um canal, uma via de transformação a nível coletivo, nesse sentido eu acho que a arte é uma manifestação política e a arte é uma manifestação da nossa existência. Não há como se existir sem arte!
A música de vocês trás essa essência?
Claro! Muitas das nossas letras, eu diria a grande maioria na verdade, são sobre os grandes mistérios da existência. Inclusive várias delas a gente exclusivamente sobre esse tema: Supernova, Corte, Procura-se.. Enfim, a nossa arte é um ponto de afirmação da nossa passagem por aqui como indivíduos dentro do coletivo, como atores dentro do mundo e da sociedade. No resumo, nós buscamos algo belo! A gente quer viver uma vida bonita, transmitindo energias boas, mensagens bonitas que agreguem e tragam conforto, esperança, choro que lava o coração.
E pra finalizar, o que vocês esperam do futuro?
Em primeiro lugar que ele chegue, porque notícia atrás de notícia, tá foda né? Vai rolar mesmo futuro?! Nós precisamos de estrutura, as pessoas precisam entender a cultura como cadeia de ofício e saber que é uma profissão, a gente precisa de estrutura. Então porra, se a gente tá pagando imposto pra enriquecer um bando de bandido, vamo botar um pouco mais em cultura e arte né? Do futuro a gente espera muito trabalho, aprendizado, conhecimento. Nós somos um grupo que buscamos muito se aperfeiçoar constantemente, não só no quesito técnico, mas como pessoas mesmo. Parece que cancelaram o futuro mas a gente só vai parar quando até chegarmos na última carta! Uma curiosidade, a gente segue a ordem do tarot, a gente fez esse pacto de ir até o 22 álbum, então a gente não pode morrer antes não!
(Entrevista originalmente publicada no site Metamorfose em 28 de agosto)