Morre Carlos Heitor Cony
Redação DM
Publicado em 6 de janeiro de 2018 às 23:59 | Atualizado há 6 meses
O jornalista e escritor Carlos Heitor Cony morreu, por volta das 23h de sexta-feira (5), aos 91 anos. Ele estava internado desde 26 de dezembro no Hospital Samaritano, no Rio. Em 1º de janeiro, foi submetido a uma cirurgia no intestino e teve complicações. A causa da morte foi falência de órgãos.
Com uma longa carreira de jornalista, iniciada ainda nos anos 1950, e atuação nos principais jornais e revistas do país ao longo das últimas décadas, Cony era considerado um dos maiores escritores brasileiros vivos. Ganhou diversos prêmios e, desde 2000, era membro da Academia Brasileira de Letras (ABL).
É autor de 17 romances, como “O ventre” (1958), “A verdade de cada dia”, “Tijolo de segurança” e “Pilatos” (1973), uma de suas obras-primas. Depois deste último, passou mais de 20 anos sem publicar nenhum outro romance, quando lançou “Quase memória” (1995). A obra, que vendeu mais 400 mil exemplares, rendeu o Prêmio Jabuti.
Cony também escreveu coletâneas de crônicas, volumes de contos, ensaios biográficos, obras infantojuvenis, adaptações e criou novelas para a TV. Foi comentarista de rádio, função que exerceu até o fim da vida, na CBN.
Certa vez, perguntado sobre o que gostaria de ver escrito em sua lápide quando morresse, respondeu: “Meu epitáfio seria: ‘Aqui não jaz Carlos Heitor Cony. Porque, realmente, aquele que for para debaixo da terra não vai ter nada comigo do que sou hoje e do que eu represento'”.
Carlos Heitor Cony nasceu no Rio em 14 de março de 1926. Era filho do jornalista Ernesto Cony Filho e de Julieta Moraes Cony. Dizia que, até os cinco anos de idade, foi mudo e não falou uma única palavra:
“Tive problema de fala durante muitos anos, até os 15 anos, e me refugiei na escrita. Porque eu falava tudo errado e zombavam de mim. E, quando eu escrevia, não zombavam de mim, porque eu escrevia certo. Então, eu notei que escrever, para mim, era um destino – não era uma vocação. E, até certo ponto, cumpri esse destino”.
Mais velho, cursou humanidades e filosofia no Seminário de São José. Começou a carreira de jornalista escrevendo para o rádio e, em 1952, assumiu o cargo de redator do “Jornal do Brasil” – e entre 1958 e 1960 colaborou no “Suplemento Dominical” do mesmo veículo, escrevendo contos, ensaios e fazendo traduções.
Seu primeiro romance foi “O ventre” (1958), que havia sido escrito em 1955, quando o autor tinha 29 anos, para um concurso promovido pela ABL. Depois, vieram “A verdade de cada dia” e “Tijolo de segurança”, com os quais ganhou, por duas vezes consecutivas, o prêmio Manuel Antônio de Almeida. Já em 1961, entrou para o “Correio da Manhã”, nas funções de redator, cronista, editorialista e editor.
Em 1964, após o Golpe Militar, chegou a ser preso em diversas ocasiões e se exilou na Europa e em Cuba. Escreveu, em primeira pessoa, “JK – Memorial do Exílio”, memórias do ex-presidente Juscelino Kubitschek (1902-1976). Mais tarde, trabalhou por mais de 30 anos na revista “Manchete” e foi diretor de “Fatos & Fotos”, “Desfile” e “Ele Ela”.
Em paralelo à carreira jornalística, Cony lançou romances marcantes, como “Pilatos”, originalmente publicado em 1973. Uma de suas obras-primas, o livro fazia uma sátira da situação política e social do Brasil sob a ditudura.
O protagonista de “Pilatos” é um mendigo que, após um acidente, tem o pênis decepado. O personagem vaga pelas ruas do Rio carregando o membro dentro de um pote de vidro. Sobre “Pilatos”, Cony certa vez declarou ser seu livro favorito e acrescentou: “É a minha visão do mundo, e acho que vou morrer com ela”.
Passaria, então, mais de duas décadas sem lançar qualquer romance, retornando apenas com o premiado “Quase memória” (1995), inpirado nas memórias do pai e que rendeu o Jabuti, uma das mais tradicionais distinções literárias do Brasil. Ele também levou o Jabuti pelo romance seguinte, “O piano e a orquestra” (1996).
Entre 1985 e 1990, Cony dirigiu o setor de teledramaturgia da Manchete, tendo sido criador das novelas “Marquesa de Santos”, “Dona Beija” e “Kananga do Japão”. Em 1993, substituiu Otto Lara Resende como cronista diário da “Folha de S.Paulo”. Também entrou para o conselho editorial do mesmo jornal.
Em 1998, foi condecorado pelo governo francês no Salão do Livro de Paris com a disitinção L’Odre des Arts et des Lettres. Em 23 de março de 2000, foi eleito para a cadeira número 3 da ABL. Carlos Heitor Cony foi casado por 40 anos com Beatriz Latja. Ele tinha duas filhas, Regina e Verônica, de outro casamento, e um filho, André, de uma terceira relação.