O Hamlet de Inhumas
Diário da Manhã
Publicado em 12 de junho de 2018 às 23:40 | Atualizado há 4 meses
Desde que foi escrita, entre 1599 e 1601, na virada do século XVI para o XVII, A tragédia de Hamlet, príncipe da Dinamarca, um dos textos mais famosos do dramaturgo inglês William Shakespeare, já foi reinterpretado e atualizado por vários autores. A história do príncipe que, numa Dinamarca em guerra com a Noruega enfrenta o drama familiar da perda do pai e o casamento remoto da mãe com o tio, imortalizada principalmente através dos versos “ser ou não ser, eis a questão”, apresentados através de um monólogo, ganhou nas mãos de Celina Sodré e do ator inhumense Luciano Caldas uma nova adaptação. Com apresentação única no Teatro Sesc (no Setor Central), a partir das 20h do dia 14 (quinta-feira), a peça Complexo de Hamlet estreia na capital de Goiás.
O espetáculo – que é um verdadeiro intercâmbio de experiências artísticas entre Rio de Janeiro e Goiânia – possui patrocínio da Lei Goyazes e foi produzido em parceria entre o Instituto do Ator do Rio de Janeiro, da Maricota Produções e da Gato Arte e Comunicação. A classificação indicativa é de 16 anos e os ingressos, que podem ser adquiridos com antecedência através do site Bilheteria Digital variam de R$ 8,00 (para trabalhadores do comércio) e R$ 22,00 (inteira). Celina Sodré é responsável pela tradução e adaptação, e direção da peça. Celina nasceu no Rio de Janeiro em 1954, e é conhecida principalmente pela densa gravidade que costuma colocar em seus espetáculos. Sua carreira teve início ainda nos anos 1980, através da peça Motivo Simples.
ENCONTRO
O ator Luciano Caldas (que também é roteirista) atua nas artes cênicas desde 1985. Possui formação técnica em interpretação na Casa das Artes de Goiânia, e é o criador da Cia Municipal de Teatro de Rio Verde – onde foi diretor municipal de Cultura. Em 2006 passou a trabalhar com a Cia de Teatro Imagem, de Goiânia. Em 2013 Luciano foi premiado no XIX Festival de Teatro de Rua de Guaçuí-ES. O contato com Celina Sodré nasceu a partir de uma residência de Luciano no Instituto do Ator do Rio de Janeiro, dirigida por ela com assistência de Conrado Nilo. O resultado deste trabalho, Complexo de Hamlet, esteve em cartaz no Rio durante uma temporada de seis meses. Em Goiás, teve pré-estreias realizadas em Inhumas e Goiânia.
De acordo com a diretora, toda a apresentação funciona na forma de um monólogo. “O solo traz à cena uma espécie de esquartejamento da personagem central da tragédia shakespeariana”, afirma. Nesta releitura, o texto se comporta de forma volátil, oferecendo ao público uma espécie de enigma a ser decifrado. “Nessa operação dramatúrgica e cênica, o texto de Shakespeare é desconstruído, desmantelado, como num quebra-cabeças quando embaralhamos as peças: cabe ao espectador encaixá-las para ver a figura que surge diante dele. A presença do ator em palco guia o público através dos caminhos obscuros na releitura de uma das crises existenciais mais famosas da história. “Hamlet é uma espécie de chave-mestra: funciona para abrir muitas portas.”
SHAKESPEARE
A tragédia de Hamlet toca fundo na questão das emoções humanas e suas consequências físicas. O protagonista, em meio às crises, questiona-se inclusive se a vida é algo que valha a pena prosseguir. Em meio aos arranjos de casais que precencia dentro da própria família em luto fresco, Hamlet recebe a revelação de seu falecido pai, em espírito, de que o responsável pela morte dele fora o próprio tio, que agora ocupava o cargo de Rei da Dinamarca. A sede de vingança se acende dentro do órfão ressentido, e leva-o ao delírio dos questionamentos sobre a razão da vida diante dos acontecimentos inesperadamente chocantes e trágicos. Através de histórias como as desse personagem, Shakespeare toca na ferida do ser humano em pleno século XVI.
Àquela altura da humanidade, o mundo saía aos poucos dos domínios das ruínas da Idade Média, e esse tipo de autorreflexão não era algo comum, o que explica o status de revolucionário das artes adquirido pelo ator. Shakespeare também era de enorme talento na hora de dramatizar personagens históricos, como fez com Rei João e Henrique IV. O professor Stanley Wells, diretor da fundação Shakespeare Birthplace Trust Shakespeare, comenta a importância do autor em uma análise sobre Macbeth, outra de suas obras. “É uma história empolgante e emocionante mas é muito mais que isto. É uma peça que funciona em muitos níveis de uma vez. A razão de ela ser saudada como uma grande peça, ao invés de apenas um bom melodrama é o jeito como ela explora aspectos fundamentais da condição humana.”