Ocupar é resistir
Redação DM
Publicado em 23 de fevereiro de 2018 às 06:09 | Atualizado há 6 meses
A violência é inerente a vida na cidade. O Centro é um reflexo da cidade. As periferias, os bairros nobres, os entornos, diversas realidades desembocam no centro. O centro pode e deve ser ocupado pelas pessoas de toda a cidade. Não é crime estar e vivenciar o centro da cidade.
Das vivências do centro uma que já é clássica é o Chorinho, que foi inviabilizado por um longo período, mas desde agosto do ano passado voltou a ocupar a Avenida Goiás. Às redondezas do Grande Hotel, esquina com a Rua 3, milhares de pessoas se reúnem nas sextas-feiras para cantar, dançar e celebrar, aproveitando uma das poucas iniciativas de lazer e cultura gratuitas e abertas de Goiânia.
Na madrugada após a última edição do Chorinho, na sexta-feira 16, um caso trágico de violência roubou o ar de celebração do evento. Roberto Rodrigues da Fonseca Nardi foi assassinado com um tiro por uma pessoa ainda não identificada. Uma gravação realizada pela organização do show, mostra Roberto dançando próximo ao palco, a vítima não estava envolvida no conflito que acarretou os tiros.
A morte de Roberto foi consequência de uma briga, que aconteceu já no final do evento. Outras pessoas foram feridas, Lucas de Jesus Moraes foi alvejado no abdômen e Bruno Henrique da Luz Romano no ombro. Além dos feridos pelos projéteis um rapaz foi brutalmente espancado.
O CHORINHO NÃO PODE PARAR
Após o caso muitas pessoas ligadas à cena cultural goiana ficaram abaladas com o fato da violência estar minando até os espaços públicos e coletivos de arte e lazer. Artistas e produtores no entanto levantam a bandeira da continuidade do evento, apontando que a violência não foi acarretada pelo fato das pessoas estarem ocupando o centro da cidade. Existe um equívoco quanto as causas da violência, ela não deixa de existir se o setor Central está desértico, ela apenas migra para a invisibilidade das vielas e periferias.
O colunista Valério Luiz postou em uma de suas redes sociais uma mensagem de solidariedade acrescida de um ponto importante de questionamento: “Quero deixar aqui meus pêsames à família e aos amigos de Roberto Rodrigues, vitimado gratuitamente após a última edição do Chorinho, na Av. Goiás; e também meu apoio ao Carlos Brandão. Muitos invertem a ordem causal das coisas: a violência existe não por causa dos eventos de rua, são os eventos de rua que expõem um problema às vezes invisível aos carros, que é a cidade despreparada pro uso dos espaços públicos, para mera convivência entre os cidadãos.
Eventos assim são atos de resistência, e são o gatilho pra resolução dos problemas, se encarados da forma correta. Eu posso não saber, cirurgicamente, a resposta, mas ninguém nunca vai me convencer que é evitar as ruas da minha própria cidade e ficar em casa”.
O produtor cultural Carlos Brandão, parte da organização do evento, fez o seguinte relato: “Desde 18 de agosto, quando a secretaria de cultura me contratou para voltar com o Chorinho, que aquele pedaço da cidade passou a ser um território de pura alegria e boas energias. Duas, três mil, pessoas saíam de casa pra se divertir, semanalmente. Ontem, cerca de 10 minutos após terminar o último show, quando a gente já estava começando a desmontar a estrutura, membros de uma torcida organizada perseguiram um rapaz, jogaram ele no chão e começaram a chutá-lo. Nós da produção e pessoas do público, corremos pra ajudar esse rapaz. Quando conseguimos livrar o jovem dos chutes e agressões diversas, um outro rapaz do grupo, começou a atirar a esmo. Nessa briga, um rapaz que sempre ia no Chorinho e ficava dançando na frente do palco e sempre me chamava pra dançar, acabou baleado e morreu ali mesmo, do lado do palco onde ele sempre dançou.”
“É preciso deixar claro que ações como o Chorinho, ajudam a humanizar a cidade. Essa é uma das funções da cultura: unir as pessoas, humanizar. O Centro de Goiânia, tão abandonado, se revitaliza, todas às sextas. Infelizmente, Goiânia é uma das cidades mais violentas do País, segundo a imprensa. E essa violência, infelizmente, chegou ao Chorinho. Como diz um amigo: a função da cultura é fazer cultura. Segurança pública é com as polícias.” completa Brandão a respeito do episódio e a importância do projeto cultural. Brandão ainda defende que o Chorinho inclusive coopera para um centro mais seguro, visto que o fluxo escasso de pessoas proporciona um ambiente mais susceptível para crimes.
O músico Kleuber Garcez, do grupo Mundhumano, também se manifestou a respeito do caso e do futuro do projeto Chorinho: “O Chorinho é o projeto que consegue em sua totalidade atender a uma demanda de socialização no espaço mais democrático que existe; a rua. Cumpre o papel cultural com música brasileira (sobretudo o samba) dando oportunidade a uma significativa parcela de artistas, bandas, regionais de choro e grupos de samba da cidade. Um lugar onde todo mundo é bem vindo e compõe um cenário de duas a três mil pessoas em frente ao Grande Hotel toda sexta feira. Como diz Carlos Brandao humaniza a cidade. Por tudo isso e por tudo que não está mensurado que a Banda Mundhumano convoca os simpatizantes da banda e do chorinho a comparecerem nesta sexta feira para fortalecer o projeto, vencer o medo e sobretudo homenagear o Roberto Rodrigues.”
GRANDE HOTEL VIVE O CHORO
Local: Em frente ao Grande Hotel, Avenida Goiás esquina com a Rua 3
Horário: 19h – 22h
Participação gratuita
SHOWS:
Banda Mundhumano
Brasil in Trio
Jorjão
Brasil in Trio
Banda Mundhumano