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‘Oeste Outra Vez’ debate masculinidade tóxica

DM Redação

Publicado em 14 de agosto de 2025 às 19:48 | Atualizado há 37 minutos

 Filme goiano foi pré-indicado ao Oscar. Western se passa na Chapada dos Veadeiros, em Goiás, e tem direção do anapolino Erico Rassi

Marcus Vinícius Beck

Dirigido pelo cineasta anapolino Erico Rassi, o western “Oeste Outra Vez” disputa uma vaga para representar o cinema brasileiro no Oscar de 2026. O anúncio foi divulgado ontem pela Academia Brasileira de Cinema. Ao todo, dez produções querem chegar ao tapete vermelho.

O faroeste, vencedor do Kikito na categoria de melhor longa-metragem no último Festival de Gramado, se passa na Chapada dos Veadeiros, no nordeste do estado. É protagonizado pelo ator Angelo Antônio (Totó), mas traz Babu Santana (Durval) em papel de destaque.

Como declarou o produtor Cristiano Miotto no ano passado, em Gramado (RS), o cinema produzido em Goiás precisa que o dinheiro e os recursos cheguem aos realizadores. Assim, afirmou, os profissionais poderão mostrar seu talento e contar suas histórias.

“Acho importante dizer que, para o cinema fora do eixo, o cinema do Centro-Oeste, o cinema tão pulverizado do Brasil continuar acontecendo, nós precisamos de políticas públicas”, destacou o produtor, durante premiação no maior evento do cinema nacional.

Além do Kikito de melhor longa, “Oeste Outra Vez” obteve também reconhecimento com o prêmio de melhor fotografia. O artista André Carvalheira foi o responsável por enquadrar as paisagens áridas cerratenses, a paleta terrosa, os planos abertos e os closes contidos.

Nesse faroeste sertanejo, as relações humanas se esvaziam diante de comportamentos primitivos. Há apenas uma aparição feminina: Tuanny Araújo (Luiza). Não à toa, sua personagem acha uma idiotice a briga entre os machões que tentam disputá-la a todo custo.

São amargurados, esses infelizes. Homens brutos, insensíveis, que não conseguem compreender suas fragilidades. Incapazes de lidar com o ciúme, demonstrar sensibilidade, expressar sutileza — de forma que, a partir disso, lhes sobra o vazio humano do sexismo.

De cara, Totó se volta contra Durval. O infeliz levou um pé na bunda. Mas Tuanny, óbvio, já não se via mais atraída nem por aquele pobre diabo, nem por esta triste figura. Dessa forma, restou-lhes uma empatia às avessas, do tipo masculina e, principalmente, de forma ilógica.

Os machões não conseguem ir muito além dessa cumplicidade tóxica. Aliás, em dada altura do filme, diz um deles: “Parece que tá melhorando (a perna baleada do amigo)”. Resposta do outro: “Pode ser que tá.” Pergunta: “O senhor acha que não?” “Muito não”, replica.

Há que se prestigiar, de fato, a atuação do compositor Rodger Rogério. Muitos irão lembrar dele em “Bacurau”, na pele do personagem Carranca, mas o que poucos sabem é que se trata, na verdade, de um estreante em produções cinematográficas. E olhe: um dos bons.

Rodger Rogério recebe elogios pela atuação como Jerominho, ex-capataz alçado a jagunço

Seu personagem, Jerominho, é coadjuvante dos dramas e conflitos de Totó. Trata-se de um sujeito simples, trabalhado na lida do campo, ex-capaz promovido a jagunço. Não por acaso, Rogério recebeu o Kikito de ator coadjuvante e foi parabenizado por Angelo Antônio.

Sobre esse personagem-amparo, Antônio disse à “Folha de S. Paulo”: “Acho que é um dos trabalhos que mais gostei de ter feito. Talvez eu tenha feito tudo para chegar nesse momento aqui agora, estar com Rodger e esse elenco. É ele quem me ajudou a ancorar o personagem.”

Seria um filme machista? Não, longe disso. Uma diretora, em Gramado, elogiou Erico Rassi por ter criado uma obra que critica os trejeitos masculinos. Detalhe: faz isso sem mulher, homem com homem, machismo versus machismo. Lugar de fala ficou para lá.

Tem-se um “vislumbre” de mulher em “Oeste Outra Vez”, como observou o crítico Luiz Zanin Oricchio no “Estadão”. Mas, a propósito, seria feminista um filme sem mulher? Eis a questão: pode-se interpretar tal ausência utilizando o viés da brutalidade e insensibilidade.

Ou, talvez, faça mais sentido ler a coisa pela perspectiva da estupidez. No caso, estupidez masculina. Rassi, por sua vez, revelou em Gramado a origem de suas referências: “Tive muitas referências da literatura. Enquanto escrevia, li ‘Sagarana’ três vezes em sequência.”

Rodado ao longo de anos, o faroeste goiano teve recursos financeiros modestos. O dinheiro contado, entretanto, não prejudicou a fotografia, a direção de arte, as atuações ou o roteiro. Um bom filme que será exibido amanhã, às 2h10, e no domingo, às 23h15, no Canal Brasil.

Concorrem ao Oscar com “Oeste Outra Vez” os badalados “O Agente Secreto”, de Kleber Mendonça Filho, e “Homem com H”, de Esmir Filho. Será que o cinema daqui chegará em Hollywood?

Conheça pré-indicados ao Oscar

– “A Melhor Mãe do Mundo”, de Anna Muylaert

– “A Praia do Fim do Mundo”, de Petrus Cariry

– “Baby”, de Marcelo Caetano

– “Homem com H”, de Esmir Filho

– “Kasa Branca”, de Luciano Vidigal

– “Malu”, de Pedro Freire

– “Manas”, de Marianna Brennand

– “Milton Bituca Nascimento”, de Flavia Moraes

– “O Agente Secreto”, de Kleber de Mendonça Filho

– “O Filho de Mil Homens”, de Daniel Rezende

– “O Último Azul”, de Gabriel Mascaro

– “Oeste Outra Vez”, de Erico Rassi

– “Os Enforcados”, de Fernando Coimbra

– “Retrato de um Certo Oriente”, de Marcelo Gomes

– “Um Lobo entre os Cisnes”, de Marcos Schechtman e Helena Varvaki

– “Vitória”, de Andrucha Waddington

Fotos: O2 Play/ Divulgação


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