Um tiro contra a resistência
Diário da Manhã
Publicado em 21 de fevereiro de 2018 às 00:20 | Atualizado há 4 meses
Malcolm X, nascido nos EUA, queria paz para seu povo, mas estava preparado para o confronto se assim a sociedade impunha. Ele lutou contra as relações de domínio e abuso sobre o povo negro, uma história comum entre todos os povos negros trazidos para o continente americano. Hoje ele faria 91 anos se não tivesse sido assassinado aos 40, ou não, pois ele provavelmente permaneceria no perigoso lugar de front de luta.
Malcolm X foi um dos nomes mais importantes do movimento negro na década de 50. Ele tinha inspirações socialistas e acreditava que a luta de classes era crucial para as lutas raciais e que os dois movimentos eram interdependentes. Uma frase dita por ele resumia sua ideologia “Não existe capitalismo sem o racismo.” A violência usada para a autodefesa do povo negro também era defendida por ele.
O militante negro criou um jornal considerado uma afronta pela comunidade branca americana. O nome do jornal era Muhammad Fala, suas publicações já não podiam ser ignorados. Ele já tinha dado a cara a tapa e passou a defender publicamente em programas de TV, no rádio e em rodas de conversa sua posição sobre a segregação racial e a violência contra o povo negro.
O primeiro nome que ele teve na vida foi Malcolm Little, o sobrenome de seus pais. O pai de Malcolm foi sua primeira prova da covardia e intolerância que ele ia ver por toda a vida, contra os negros americanos. Earl Little foi espancado até quase a morte e jogado na linha do trem. A rejeição do seu sobrenome foi uma atitude política, negros tinham sobrenomes atribuídos por brancos durante a escravidão.
A família Little vivia na cidade de Omaha, no estado de Nebraska e viviam dias difíceis de luta cotidiana. Após a morte de Earl, a mãe de Mal com Louise teve que cortar um dobrado para criar seus oito filhos. Louise tinha uma pele clara que ajudava que conseguisse emprego, pois seu progenitor era um homem branco que estuprou sua mãe. Violência sexual contra mulheres negras também é outra marca triste e persistente da história do povo preto.
O moleque Malcom era um bom aluno, cara inteligente, boas notas e achou que poderia ter um futuro acadêmico. Quando revelou a um professor que queria ser advogado ouviu a risada do mundo branco zunir em seu ouvido. Assim ele entendeu que não podia simplesmente integrar-se ao sistema, ele não cabia no sistema. Desde então se tornou um jovem rebelde e causador de problemas na escola.
CORPO PRESO, MENTE EM LIBERTAÇÃO
Malcolm foi morar no Harlem na sua juventude, um gueto negro americano, lá tinha uma vida de boêmia e uma fuga diária dos destinos óbvios: a cadeia, o exército ou a prisão. Acabou entoando para o crime, tráfico e depois assalto a mão armada.
Sua vida de fora da lei o levou a prisão. Nas celas dedicou-se ao estudo e foi lá que amadureceu suas ideias radicais de combate ao racismo. Na prisão entrou para um grupo islâmico que moldou seus objetivos de luta. O nome do grupo era NOI (Nação do Islã) e tinha uma leitura muito específica sobre o islamismo, desenvolvida para cooptar negros marginalizados.
Malcolm X atraiu mais seguidores que o pastor Martin Luther King, que defendia uma linha pacífica para solucionar os martírios da segregação racial. Apesar de ter começado sua doutrinação com ideias fanáticas do NOI acabou se desvencilhando das ideias do grupo. Sua consciência, estudo e experiências mostraram que o caminho de luta que queria seguir não era o fanatismo islâmico.
A LUTA E A IRMANDADE NEGRA
Um de seus amigos foi o presidente do Egito, Gamal Abdel Nasser, que governou o país de 1956 até 1970. Nasser chegou a oferecer um cargo político a Malcolm com medo que ele pudesse ser assassinado nos EUA por seus ideais radicais. Nasser sempre foi um apoiador das lutas árabes e revoluções africanas.
Martim L.King era da igreja protestante e Malcolm X era convertido ao islamismo. Duas pregações totalmente diferentes. Mas era na religião que eles encontravam forças para lutar contra o racismo e a opressão da maioria branca de seu país. Ambos lutaram pelo direitos dos afrodescendentes norte americanos cada um a seu modo. Martin sempre partidário do pacifismo ainda sim respeitava a luta de vertente combativa de Malcolm.
Cassius Clay, ou Muhammad Ali, o nome que adotou, era um dos maiores boxeadores do mundo do século XX. Ali não lutou apenas nos ringues, mas também nas causas do movimento negro. Muhammad foi apresentado ao islã e a luta negra por Malcolm, mas quando X quebrou sua relação com o NOI o boxeador considerou o afastamento uma traição.
Na sua velhice Ali diz ter se arrependido de entrar de cabeça na seita islâmica e ter perdido a parceria de Malcolm. Ali disse em uma entrevista de 89 sobre Malcolm as seguintes palavras “Minha primeira impressão foi: como poderia um homem negro falar sobre o governo, as pessoas brancas e ser tão ousado, não ser baleado?”
Infelizmente Muhammad Ali estava errado em sua primeira impressão. Em Nova York aos 39 anos, Malcolm foi assassinado no ano de 65, há 52 anos. Não foram descobertos os responsáveis pelo crime contra a luta negra, a pessoa que disparou os 13 tiros não tem identidade. Difícil saber quem é o assassino quando a vítima reivindica a voz de todo um povo silenciado a base da violência.