Uma lágrima a Joaquim Jayme: erudito, inventivo e carbonário
Diário da Manhã
Publicado em 19 de fevereiro de 2018 às 22:11 | Atualizado há 4 meses
- Ativista político gauche terminou preso, em 1966, e refugiou-se nas terras de Salvador Allende, deposto em 11 de setembro de 1973
- Com a Anistia, em 28 de agosto de 1979, sob João Baptista Figueiredo, retornou ao Brasil e retomou as suas atividades artísticas
- Homem de tradição iluminista, é da linhagem de tradicional família de Pirenópolis, como de Nilson Jayme, escritor, e Fausto Jaime, médico
Tributo ao maestro Joaquim Jayme. É o espetáculo que a Orquestra Sinfônica de Goiânia, além do Coro Sinfônico da Capital do Estado, assim como os Metais da Banda Juvenil do Município apresentam, nesta terça-feira, 20 de fevereiro, às 20h, no Teatro Sesi. A entrada é franca. É necessário entregar dois quilos de alimentos não perecíveis ou um livro literário. Não custa lembrar: o concerto terá a regência do cultuado maestro Eliseu Ferreira. A homenagem ao artista formado na extinta RDA [Alemanha Oriental] será composta de um repertório com composições próprias e arranjos feitos pelo compositor ao longo de sua carreira. Antes de concerto, uma exposição sobre a vida do maestro estará aberta ao público, no salão do espaço.
FAMÍLIA TRADICIONAL
Linhagem da tradicional família Jayme, de Pirenópolis, cuja genealogia é desnudada por Nilson Jayme, em Família Jayme/Jaime – Genealogia e História, lançado no mercado editorial em 2016, Joaquim Jayme teve destacada participação política contra a ditadura civil e militar. Um golpe de Estado em 31 de março e 1º de abril de 1964 havia deposto o presidente da República, João Belchior Marques Goulart. Um nacional-estatista. Em sua versão trabalhista. Acabou preso, em 1966, com a queda do PC do B [Partido Comunista do Brasil], em Goiás. Uma dissidência à esquerda do Partidão [PCB], ocorrida em 1962, legenda foice e do martelo que fez a opção pela luta armada contra o regime civil e militar no Brasil. Joaquim Jayme deixou a cadeia, refugiou-se no Chile e escapou, como um milagre, do sangrento 11 de setembro de 1973.
Joaquim Jayme era o diretor da Faculdade de Música, em Concepción. Um golpe civil e militar, deflagrado pelo general Augusto Pinochet, com o suporte dos EUA, com Henry Kissinger à frente, depôs o médico marxista Salvador Allende. Errante, o proscrito, depois, embarcou para o Velho Mundo. O músico radicou-se na extinta Alemanha Oriental [RDA]. Um satélite de Moscou. No território da Stasi, a violenta polícia política secreta de Erich Honecker, ele qualificou os seus estudos. Em música clássica erudita. Com a Anistia, em 28 de agosto de 1979, abençoada pelo general João Baptista de Oliveira Figueiredo, retornou à pátria de chuteiras que tanto amava. Uma vida que é um thriller político e revolucionário. Um filme.
Erudito, um homem de tradição iluminista, fundou no auge de sua produção estética e cultural a Orquestra Sinfônica. Um personagem que se realizou na música. Ele exercia um ativismo revolucionário utópico e libertário. De ideias refinadas. O músico curtia uma boemia. Mais: adorava virar a noite. Tempos rebeldes aqueles. Um mix de bebidas, ideias, noites, mulheres, revoluções. Com curso na Universidade Federal da Bahia [UFBA], estudos em São Bernardo do Campo, São Paulo, com passagem pelo Chile e aperfeiçoamento em Rostok, época de guerra fria [1945-1991]. A Alemanha era dividida em dois blocos de influência. Uma da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas [URSS], de linhagem marxista. Outra do capitalismo monopolista ocidental, excludente. Com Estados Unidos das Américas, Inglaterra e França.
INDEFECTÍVEL CAVANHAQUE
Maestro. Revolucionário. Na música. Na vida política. Joaquim Jayme, com o seu indefectível cavanhaque, seria uma espécie de homem que teria morrido três vezes. A primeira, quando, clandestino, sob a ditadura civil e militar no Brasil, deixou a vida legal, adotou codinome, fugiu para o Chile. A segunda, em 2016, sob um Acidente Vascular Cerebral [AVC], devastador sobre o seu organismo, entrou em coma profundo. Para o desespero de Mitzi Segovia, sua mulher de uma vida inteira. De vitórias e derrotas. De Oscar Jayme, seu filho, que mergulhou-se em lágrimas e lembranças. A terceira, em 2017. Com a sua morte física que consternou o mundo da música erudita e os amantes dos clássicos. Das revoluções. Dos homens que marcam o seu tempo.
CONCERTO ORQUESTRA SINFÔNICA DE GOIÂNIA: TRIBUTO AO MAESTRO JOAQUIM JAYME
Data: Hoje, 20 de fevereiro
Horário: 20h
Local: Teatro Sesi
Ingressos: 2 kg de alimento não perecível ou um livro literário
História: livro de Nilson Jaime [2016] – Família Jayme/Jaime – Genealogia e História
Saiba mais
PROGRAMAÇÃO
Veja as composições de Joaquim Jayme [1941-2017]
Hino do Estado de Goiás
Manhã de Goiânia – 1982
Menina de Vila Boa – 1982
Cavalhadas, Percussões, Pirineus – 1995
Quatro Peças para Cordas – 1968
Hino do Aniversário de Goiânia
INTERVALO
Arranjos de Joaquim Jayme
Tedy Vieira/Luizinho – Menino da Porteira
Joaquim Santana – Noites Goianas
Aram Khachaturian [1903-1978]
Valsa da Suite Mascarado
Maurice Ravel [1857-1937]
Bolero
Dimitri Schostakovich [1906-1975]
Abertura Festiva em Lá Maior, Op. 96
Regência: Eliseu Ferreira
Cronologia
1992 é fundado, em Niterói, 25 de março, o PCB
1962 nasce o PC do B, dissidência do PCB
1963 Joaquim Jayme ingressa no PC do B
1964 Golpe de Estado civil e militar no Brasil
1966 Queda do PC do B: Joaquim Jayme preso
1973 Joaquim Jayme foge de golpe no Chile
1979 com a Anistia, Joaquim Jayme retorna ao Brasil
1994 é secretário municipal de Cultura, em Goiânia
2014 Dilma Rousseff ganha eleições presidenciais no País
2015 início da crise política que paralisa o Brasil até hoje
2016 Joaquim Jayme sofre um Acidente Vascular Cerebral
2017 morre o maestro Joaquim Jayme, em Goiânia