Goiânia

Centro renasce em Goiânia com noite agitada

DM Redação

Publicado em 22 de agosto de 2025 às 20:30 | Atualizado há 5 horas

Muvuca: região vira reduto da juventude urbana durante sextas, sábados e domingos - Fotos: Divulgação
Muvuca: região vira reduto da juventude urbana durante sextas, sábados e domingos - Fotos: Divulgação

Fechada para carros nos fins de semana, Rua Oito faz efervescência da noite retornar ao Centro. Bares, inferninhos e casas culturais surgem no bairro

Marcus Vinícius Beck

A Oito, Rua Oito, reluz às 18h30: alarido crepuscular. No Centro, andarilhos boêmios deslizam pelos labirintos da balbúrdia, acendem cigarros — filtros brancos, vermelhos — e queimam ideias engazopadas. Afagos etílicos entre sorrisos proletários e bitucas apagadas.

“O prazer de se achar na multidão é uma expressão misteriosa do gozo pela multiplicação do número”, escreve o poeta Charles Baudelaire (1821-1867), no livro “O Spleen de Paris”. “Uma grande serenidade se faz nos pobres espíritos, fatigados pela labuta do dia a dia.”

Com notas de cerveja IPA borbulhando em lábios sedentos, os drinques são sorvidos no anoitecer dos olhares e das fumaças que carburam nos Marlboros. A flânerie se mostra mundana. Homens e mulheres nas esquinas, passadas ansiosas até o próximo bar.

Flâneur goianiense se abre para a ressonância da cidade: artistas de vanguarda reacendem espaço – Foto: Divulgação

A luz, contudo, clareia o fundo do desejo. Nas calçadas sobre as quais caminha, o flâneur se abre para a ressonância da cidade. Artistas de vanguarda, ali pelas 21h, reacendem o espaço outrora abandonado, com DJ discotecando, show ao vivo, exposição e sessão de filmes.

Segundo a vereadora Aava Santiago (PSDB), 35, autora da lei nº 11.293, a Rua Oito será fechada às sextas e sábados ao longo da noite. Aos domingos e feriados, porém, o fluxo de veículos motorizados ficará restrito no trecho entre a Avenida Anhanguera e a Rua 4.

Além disso, explica Santiago, a lei prevê que o poder público forneça banheiro químico e segurança aos frequentadores, comerciantes e moradores. “A Rua 8 será ocupada por gente, música, cultura e arte”, afirma a parlamentar, em vídeo publicado nas redes sociais.

Transformação da Rua Oito começou em 2021: efervescência se espalha pela região – Foto: Divulgação

“Depois de três anos de tramitação, aprovação, veto, articulação para rejeição do veto, hoje uma das leis mais importantes do mandato vira realidade”, diz a vereadora, descrevendo a sanção do prefeito Sandro Mabel (União Brasil) como “grande vitória” para Goiânia.

Impulsionada por bares, casas culturais e inferninhos, a transformação da Oito começou entre maio e agosto de 2021. Naquele ano, ainda que se vivesse uma certa flexibilização pandêmica, o Zé Latinhas despertou atração do público. Geral começou a frequentá-lo.

No encalço do bar-restaurante, a Liberté se estabeleceu do outro lado da rua. A proposta soava aprazível para a vida urbana pós-covid: boêmia na rua, coquetelaria entre o clássico e o contemporâneo, tira-gostos veganos e carnívoros — tudo isso com preço camarada.

Labirinto: Anexo atrai público à procura de diversão quando grades dos bares se fecham – Foto: Divulgação

Novidade

Daí, então, veio o próximo passo: uma boate na chamada “rua mais boêmia de Goiânia”. O jornalista Heitor Vilela, 31, ao lado dos sócios Vinícius Gade e Jefferson Radi, criou o Anexo, onde pessoas querendo diversão se reúnem depois que as grades dos bares vão até o chão.

Vilela explica os conceitos artísticos do ambiente. “O pessoal que idealizou o Mudda (Museu do depois do amanhã), no recém-demolido e antigo prédio da Celg, localizado no Setor Oeste, trouxe uma ideia genial, que é a exposição: Epiderme”, conta o proprietário.

Morador do Centro, ele revela que a mostra traz fotografias de paredes desgastadas pelo tempo. “Todas do antigo prédio modernista”, informa. “E hoje”, prossegue, “essa exposição no banheiro do Anexo é, por enquanto, o único lugar que sobreviveu o Mudda em paredes”.

Após a Liberté e o Anexo, o impacto positivo se multiplicou. A Rua do Lazer, a poucos quarteirões, ganhou novo fôlego. Novos bares, como Central Rock e o Biras e Seu Coutinho, apareceram na região. Este último, inclusive, chega com a chancela do Quintal do Jajá.

Inferninho: diversão percorre a madrugada no Anexo e é dissipada quando o sol está prestes a nascer – Foto: Divulgação

Corre a notícia também de que o chef de cozinha Jú Marinho, do restaurante Juá, organiza a abertura do Fubanga Bar. Como se não bastasse, há ainda negociações em curso para a instalação de uma boate onde antes funcionava o antigo Cine Casablanca.

Para a vereadora Kátia Maria (PT), 49, moradora do Centro desde 2009, uma tradição vem sendo retomada. “Sempre acreditei que o Setor Central guarda nossa identidade cultural e precisava ser revalorizado”, pontua Maria, que passeava com a mãe pelo bairro.

Emendas parlamentares de Maria preveem ainda atividades culturais promovidas pela UFG. Nos sábados, há algum tempo, ocorre a Feira Cora Coralina. O Teatro Carlos Moreira integra a nova dinâmica e, com isso, contribui para a democratização das artes cênicas.

Abençoado por Charles Baudelaire, o flâneur tropeça em imagens desde há muito sonhadas — com os pensamentos assumindo as cores do crepúsculo. “Quem são os infelizes que a noite não acalma e que, à maneira das corujas, tomam a chegada da noite por um sinal para o sabá?”


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