Tarifaço derruba exportações, e empresas brasileiras recorrem a férias coletivas
DM Redação
Publicado em 22 de agosto de 2025 às 09:37 | Atualizado há 31 minutos
Alexandre Novais Garcia – Folha Press
As indústrias madeireira, calçadista e de armamentos, que registram queda nas vendas por causa do tarifaço imposto pelos Estados Unidos, adotaram férias coletivas como primeira medida para conter custos. Sem uma reversão das sobretaxas aplicadas pelo presidente Donald Trump ou a abertura de novos mercados, os setores pedem apoio do governo brasileiro para evitar demissões em massa.
Empresas do setor de madeira acumulam estoque sem as vendas para os EUA. A Abimci (Associação Brasileira da Indústria de Madeira Processada Mecanicamente) que reúne fabricantes de compensados, pisos, molduras, pallets e outros relata que a operação do setor está travada, pois os contratos de vendas para o mercado norte-americano foram congelados ou rescindidos. Algumas empresas não têm mais espaço para armazenamento das mercadorias já fabricadas e que seriam destinadas aos EUA.
Muitas companhias estão tendo que remanejar os funcionários. Por exemplo: a Millpar, que é a segunda maior empresa do setor no Brasil e fabrica molduras e partes de portas, primeiro deu férias coletivas aos funcionários da sua unidade em Quedas do Iguaçu (PR). Com a continuidade da crise, encerrou as atividades dessa unidade na última terça-feira (19) para concentrar a produção em Guarapuava (PR).
“Estamos tomando decisões extremamente difíceis, mas necessárias para manter a sustentabilidade do negócio e preservar parcela significativa dos postos de trabalho”, diz Ettore Giacomet Basile, presidente da empresa. Paulo Pupo, superintendente da Abimci, afirma que as demissões ainda são pontuais. Segundo ele, na maioria das empresas, as férias coletivas continuam em vigor. O setor calcula que ainda tem um fôlego de mais uma ou duas semanas antes que as companhias evitem decisões mais radicais.
Cenário adverso alcançou também empresas de outros setores. O ramo de calçados decretou férias aos profissionais. Já a Polimetal, uma subsidiária e fornecedora de peças para a fabricante de armamentos Taurus, colocou 33 dos 50 funcionários em férias coletivas em São Leopoldo (RS). Em nota, a Taurus afirma que a providência faz parte da estratégia de transferir parte da produção para os EUA para “minimizar os impactos da taxação” imposta às armas nacionais.
Férias coletivas parciais ou totais representam a ação inicial das empresas. Essa medida ajuda a solucionar o problema imediato, que são os custos de produção elevados sem vendas, e a pensar com mais calma no longo prazo. Além disso, barateia as rescisões dos trabalhadores, porque, se não tiradas, as férias precisam ser pagas em dinheiro quando da demissão.
Próxima etapa é a demissão de funcionários, dizem os setores. Essa é a saída sem a reversão das tarifas, a abertura de mercados para escoar as vendas que iriam aos EUA ou medidas do governo como a autorização para a suspensão temporária dos contratos de trabalho, de acordo com os empresários. No entanto, trata-se de uma opção que gera grandes custos trabalhistas com verbas rescisórias e indenizações.
Existe ainda a possibilidade de uso do banco de horas, de antecipação de feriados e de fechar acordos diretamente com os sindicatos como alternativas prévias às demissões. A legislação trabalhista não contempla casos especiais como pandemias ou tarifaços.
Programas de demissão voluntária (PDV) também entram no radar. A criação de um planejamento para desligar os trabalhadores que desejam a mudança evita problemas com a Justiça, porque o funcionário que assina um PDV não pode ingressar com ação judicial depois.
Setores cobram apoio do governo para manter os funcionários. Os representantes dos segmentos mais afetados pelo tarifaço elogiam os termos do plano de contingência apresentado pelo governo federal na semana passada, mas pedem ações mais efetivas para manter seus colaboradores, como as adotadas durante a pandemia do novo coronavírus, que começou em 2020.
A medida provisória publicada pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva libera R$ 30 bilhões em crédito para compensar os prejuízos dos exportadores com o tarifaço, exigindo, como contrapartida, o compromisso de não demitir trabalhadores. Também prevê benefícios tributários. Mas muitos detalhes sobre como vai funcionar a ajuda não foram decididos.
“A estrutura do poder público é determinante para a preservação dos empregos. Na pandemia, os funcionários ficaram em casa e receberam uma bolsa auxílio do governo. Os sindicatos não têm poder para isso”, diz Giovanni Cesar, advogado e professor de direito do trabalho.
A Abicalçados (Associação Brasileira das Indústrias de Calçados) apresentou propostas ao governo federal. Em parecer encaminhado na última sexta-feira (15) ao vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin (PSB), a associação solicitou a adoção de mecanismos de redução temporária de jornada e salário proporcionais. Também sugeriu a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho por até 90 dias e o uso de recursos da União para arcar com um auxílio aos funcionários.
“Estamos trabalhando para a criação de medidas de proteção similares às que tivemos durante a pandemia, para mitigar os efeitos desse adicional de tarifa até o problema ser resolvido”, afirma Haroldo Ferreira, presidente-executivo da Abicalçados.