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OPINIÃO PÚBLICA

“Crapulice”

Não encontrei a palavra “crapulice”, que o Word tratou de grifar de vermelho, em nenhum outro lugar, além de Clara dos Anjos, de Lima Barreto. Então, não me admiro de eu não tê-la conhecido antes. Deve ter sido “desdicionarizada” por ter caído em desuso, sendo substituída por crapuloso, que é a “qualidade” de quem é crápula. Esse grave defeito está mais associado ao homem, mas o mal não é prerrogativa do gênero masculino. O crápula não parece humano, por ter um defeito tão destruidor quanto fatal.

Vejamos o que diz o Dicionário Aurélio, de Aurélio Buarque de Holanda, cujo livro Mar de Histórias foi recolhido pelo governo do estado de Rondônia. Crápula: modo extravagante de vida; desregramento; devassidão, libertinagem; indivíduo vil, canalha, calhorda. O crapuloso é o que tem crápula (a tal desvirtude), libertino, devasso, patife. Usa-se esse adjetivo em situações do dia a dia, para desqualificar alguém de conduta extrema, especialmente más atitudes na vida e nas relações amorosas, pois usa o desprezo e o deboche no seu modo de agir, desrespeitando o outro, e com sua grande falta de afetividade pula de aventura em aventura, enquanto forma um harém. Alguns seres manifestam esse tipo de comportamento, e as mártires raivosas usam palavras inexatas para detratá-los.

Outras palavras namoram o crápula, como mau, perverso e manifestações de mau-caratismo como biltre, cafajeste, cruel, um tipo de gente que é melhor nem conhecer. O tema é pesado, mas piores são as pauladas recebidas pelas suas vítimas. Umas enlouquecem, outras se suicidam, algumas superam a dor do abandono e encontram pessoas melhores para amar, ainda que muitas fiquem vacinadas diante do sofrimento. Fechando-se em luto, se mantêm num eterno balanço.

A maldade e a bondade andam em dupla, assim como o ódio e o amor. Aqui, a psiquiatria abre um capítulo para analisar itens como loucura, maldade e insensibilidade desse tipo indiferente a dor alheia. Cada um sabe de si, ou, pelo menos deveria saber, e se o abandono dói, maior dor sentirá quem buscar amparo na fonte do seu problema, pois receberá desdéns e insultos.

Quem se preza, recolhe suas armas e sentimentos, sai de cena e se esconde em seu casulo. Ali, enfrenta uma batalha interna, e, um dia conseguirá desenvolver asas, para, enfim, voar liberto do amor desfeito. No enfrentamento, o melhor é pensar que tudo um dia terá fim. A dor passa, não duvide e, fortalecido, sem necessidade de muletas, grandes voos serão alçados na direção escolhida.

Cada um se lembrará de um crápula em particular, e a ele, o esquecimento ou a lei. Para quem venceu esse infortúnio, que lhe venha artifícios mentais para superar o trauma e coragem para novamente confiar.


		“Crapulice”
Médica e escritora. Mara Narciso

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