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OPINIÃO

Tapando o sol com a peneira

Wandell Seixas ,Especial para Opinião Pública

Como jornalista e cidadão atento com os destinos do Brasil, acompanho a vida política, econômica, social e cultural do País. Li declarações de Leonardo Boff, famoso teólogo brasileiro, sobre as recentes manifestações públicas contra o governo Dilma Rousseff. Em sua opinião, era manifestação de ódio. Para mim, Leonardo Boff falou abobrinhas e demonstrou estar “voando” ante os sentimentos nacionais.

Manifestações em mais de 200 cidades de todo o País, de forma espontânea e ordeira, jamais denotaram sentimento de ódio contra quaisquer figuras humanas. O “Fora Dilma” e o “Fora PT” significam, isto sim, um cansaço do governo petista. A sociedade quer mudança e anseia por uma oposição mais confiável. Pelo que denota pesquisa do Ibope, Joaquim Barbosa seria o modelo mais próximo do ideal. Entendo que pelo seu combate corajoso à corrupção.

A contrariedade aumentou porque durante a campanha eleitoral, Dilma prometeu uma coisa e eleita passou a praticar outra. Contrariou o próprio PT. Se o Aécio tivesse ganhado as eleições, colocaria em prática mais ou menos o que faz a Dilma em seu segundo mandato. Mas, do candidato tucano se esperaria isso mesmo. Era o saneamento financeiro da casa.

Não se pode tapar o sol com a peneira. No dia seguinte a sua posse, fez o que já poderia ter feito há meses. Reajustado, os preços dos derivados do petróleo, das tarifas de energia elétrica e por aí afora. Queria ganhar as eleições a qualquer preço. Mentiu à sociedade brasileira que a oposição é “que faria isso, faria aquilo”. Faltou dizer que a oposição se eleita, esfolaria o povo.

Vi, pessoalmente, um depoimento de uma funcionária pública de que as propostas do Aécio eram boas para o País. No entanto, temia pessoalmente pelo seu destino e, assim, votaria na Dilma.

As privatizações foram expostas e ainda o são como medidas antipatrióticas. Ora, meu Deus. O governo de Fernando Henrique Cardoso, que nasceu em berço da esquerda antes mesmo da criação do PT, percebeu o inchaço de empresas estatais como a Cia. Vale do Rio Doce, na área de minérios, e da Embraer, no segmento da aviação, e a Telebras, na área de comunicação. Eram cabides de empregos, semifalidas. Privatizou-as e hoje constituem orgulho nacional.

A Embraer está presente em todos os continentes. As linhas mais modernas de aviões a jato, destinadas a passageiros ou para fins militares, saem de suas pranchetas para a produção em série. Atua em sistema de joint-venture nos Estados Unidos, sede do capitalismo, e na China, comunista. São atualmente empresas que geram lucros, se expandem, geram e mantêm empregos e impostos.

Telefone – Antes da privatização da Telebras, só rico ou remediado podia comprar um aparelho. Hoje, com o fim do monopólio estatal, o telefone celular ou fixo chegou à casa do rico, da classe média e do pobre. Qualquer pessoa possui um celular. E, mais que isso, o sistema modernizou e o público de maneira geral pode dispor de um aparelho porque os preços ficaram compatíveis com o seu bolso.

Se a Petrobras tivesse seguido o mesmo caminho, com certeza, o Brasil não estaria passando por um vexame em sua imagem nacional e internacional. A estatal criada por Getúlio Vargas dentro da gloriosa campanha do Petróleo é Nosso, deixou de ser orgulho nacional para se constituir em vexame internacional. Aliás, abrindo um parêntesis. Na verdade, foi o Collor quem iniciou o processo de privatização ao vender 34 estatais e 32 participações minoritárias, incluindo parte da indústria siderúrgica.

Os partidários do governo sempre tentam transferir os seus desacertos a outrem. Ao invés de punir os seus corruptos e os maus gestores da “coisa pública”, como Dilma começou a praticar nas primeiras semanas de seu governo, atribuem responsabilidades ao governo de FHC. Parece até que, no fundo, amam Fernando Henrique Cardoso.

Ora, o PT não surgiu para corrigir os erros dos demais partidos? Então, parem de conversar fiado. Parece coisa do chavismo na Venezuela. O desajuste de um governo medíocre é culpa da CIA. Tem a santa paciência. É isso que a sociedade verde-amarela acordou a tempo e encontrou nas ruas a maneira pacífica de se manifestar. É o panelaço bem ao estilo do brasileiro.

Na tentativa de desfigurar a passeata gigantesca, aparece cada figura ridícula que em sã consciência não dá para acreditar. O deputado Sibá Machado, líder do PT na Câmara, chegou a dizer que o protesto de domingo, dia 15, era patrocinado pela CIA, o serviço secreto dos Estados Unidos. Comportamento assim é um desrespeito à inteligência dos brasileiros.

O Brasil cansou de tanta corrupção e está indo às ruas para dizer de forma pacífica, sem infiltração de penetras favoráveis ao governo, um basta aos ratões. Assim, como compartilhava o PT dos velhos tempos. Agora, aparecem uns para denegrir um movimento de mudança, dizendo que os protestos são dos ricos e da classe média. A classe trabalhadora ficou em casa. Que absurdo. Vi gente de todas as classes sociais nas ruas. Vi garçons de um hotel cinco estrelas aplaudindo os 70 mil manifestantes em Goiânia.

Ora, é só fazer as contas. Se o derivado do petróleo sobe, com ele acompanha os preços do pão, do arroz, do açúcar, do leite, da carne, do ônibus, enfim de tudo. Se a tarifa da energia fica mais cara, o banho do pobre no chuveiro elétrico fica mais curto ou então ele enfrenta água fria. O assalariado é quem sofre mais com qualquer reajuste nos preços e com a inflação acima de 7%, juros crescentes. Sofre o risco de perder o emprego porque caíram os investimentos e a economia de maneira geral entrou em parafuso.

Quem compareceu às manifestações, penso eu, eram simplesmente pessoas. Um milhão de pessoas na Avenida Paulista, em São Paulo, é um número a considerar. E, veja bem. Por ironia do destino. Quem estava conclamando contra ações golpistas era ninguém mais, ninguém menos, que o FCH, tão crucificado por petistas.

Parem de atribuir tudo ao FHC. Sejamos mais justos e competentes. Li dias atrás no Facebook um internauta defensor do petismo, este sim com procedimentos arrogantes, dizendo que o Fernando Henrique Cardoso usa ternos da marca Prada. E, daí? Trata-se de um professor de sociologia respeitado em toda a América Latina, um intelectual sofisticado, com livros publicados, ex-presidente da República, que está sempre ministrando conferências nacionais e internacionais nos fóruns mais respeitáveis. Sua renda é compatível com o apuro no vestir.

O Lula que veio dos sertões do agreste nordestino para São Paulo na carroceria de um pau-de-arara, foi torneiro mecânico, líder sindical, ex-presidente, também usa roupa de grife italiana, perfumes franceses e come nos melhores e mais caros restaurantes. Algo contra? Se ele aprendeu a gostar do que é bom, vamos saudá-lo.

O político brasileiro, seja de que partido for, precisa refletir mais sobre as manifestações populares. Sobretudo, quando elas surgem espontaneamente. Protestos públicos em mais de duzentas cidades brasileiras devem deixar as autoridades constituídas antenadas. Segundo o instituto de pesquisa Data Folha, quase 80% da sociedade brasileira desaprova Dilma. Isto nos primeiros dois meses de governo. É culpa do FHC? Ou do Pedro Álvares Cabral por ter desviado do caminho das Índias e aportar no Brasil?

Até o papa condenou publicamente a corrupção, em recente visita à cidade italiana de Nápoles. Claro, a corrupção não é apenas nossa. Mas, cabe a todos nós combatê-la de forma sistemática. Caso contrário, esse câncer entrará no seio de nossa família e destruirá algo nobre que deve ser a ética e a moral. É a família, afinal de contas, que deve norteará os futuros cidadãos.

(Wandell Seixas, jornalista voltado para o agro, bacharel em Direito e Economia pela PUC-GO, autor do livro O Agronegócio passa pelo Centro-Oeste, ex-bolsista em cooperativismo agropecuário pela Histradut em Tel Aviv, Israel)

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