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OPINIÃO

Voando ou de perto todos os pilotos parecem normais

João Joaquim ,Especial para Opinião Pública

O mundo todo vem se perguntando sobre a tragédia com o avião da Germanwings (ligada a Lufthansa)  que se espatifou nos Alpes Franceses em 24/03/15. Foram 150 mortos. Estremece-nos a causa do acidente. Segundo as autoridades que apuram a ocorrência, o copiloto, que se encontrava sozinho na cabine teve um surto suicida, baixou a avião para que este se chocasse nas montanhas geladas dos Alpes. O piloto tinha se ausentado para ir ao banheiro. Que fatalidade, justamente num momento  de um imperativo fisiológico como este imprevisto do comandante titular (urgência gastrointestinal).

Como medida de segurança contra ação terrorista, essa porta de acesso à cabine de comando das aeronaves abre sob o controle  de uma senha de 4 dígitos. Digita-se o código, tem-se 5 segundos para puxar a porta, abrir  e ela se fechar novamente, ficando não responsiva  por vários segundos. Assim ocorreu nessa fatídica viagem: o piloto estava fora do comando do avião, o copiloto ficou a sós e responsável no controle do voo, quando num surto suicida fez com que houvesse perda de altitude e a aeronave se chocasse nas cordilheiras alpinas  da França.

Tragédia é tragédia e o que se pode tirar dela é alguma conduta ou estratégia para evitar outras de igual natureza ou causa. Eu penso que esta será mais uma para questionamentos, perguntas de como, do porquê  que ela se repetiu. As próprias autoridades aeronáuticas já fizeram uma retrospectiva estatística de outras tragédias aéreas por causa de surtos suicidas de pilotos. O que fazer para evitar a próxima? Há um princípio ou axioma que preconiza: “Quem não conhece bem a história está fadado a repeti-la”. Parece que é o que se passa  com os órgãos e autoridades da aviação civil no presente episódio. Dada a magnitude e crueza desse desastre com o voo da Germanwings nos Alpes Franceses, as agências reguladoras da Alemanha e outros países europeus já tomaram uma primeira medida. De ora avante, todo voo tem que ter na cabine de comando 2 pessoas. Piloto mais copiloto. Supõe-se que necessariamente haverá no mínimo 2 copilotos na tripulação . Desses três comandantes, vez ou outra um deles terá uma imprevisível urgência fisiológica gastrointestinal, como no presente caso. Urgência evacuatória não tem hora para ocorrer. Uma outra saída mais simples e barata seria piloto e copiloto usarem fraldas. Assim, numa premência intestinal faz-se a necessidade  na fralda e ninguém perceberá .

As autoridades da aviação civil europeia estão chamando essa medida preventiva de princípio dos 4 olhos no comando do avião. Seria o cúmulo do azar pensar em dois suicidas  numa tripulação de 5 ou 6 pessoas. Outra questão que trago à baila são as informações que nos chegam  sobre a sanidade mental do copiloto, Andreas Lubitz . Segundo consta, ele padecia de depressão, já tinha expressado ideias suicidas e tinha omitido ou rasgado atestado médico de sua inaptidão para a função. Seu histórico psiquiátrico era de longa data, como o atestam uma ex-namorada e prontuário clínico apreendido em sua residência .

Sabemos que tais doenças  # depressão, transtorno de ansiedade, transtorno bipolar, esquizofrenia, tendência suicida#  são enfermidades  que geram um grande estigma social, discriminação e muita rejeição ,seja no ambiente familiar ou funcional. Disto resulta casos de omissão pelo paciente ou mesmo familiares.

Sabe-se que no âmbito médico existe o chamado sigilo ou confidencialidade profissional. Aqui no Brasil é assim,  o que expressam os normativos e código de ética médica?  O paciente tem o direito ao sigilo ou resguardo do seu diagnóstico. Nenhuma empresa ou patrão tem o direito de saber o diagnóstico expresso nominalmente ou em  código internacional de doença (CID) do funcionário. Se ela assim o fizer, está cometendo uma infração ética e legal contra aquele empregado. E atenção: tais garantias individuais ao sigilo do seu estado de saúde é quebrado diariamente , por médicos que são co-autores dessas infrações ético-legais, de forma intencional (dolosa) ou por  desconhecimento de decisão já antiga do Conselho Federal de Medicina.

Todavia, nas atividades profissionais de risco, caso por exemplo de motoristas, operadores de máquina pesada, policiais, piloto e mesmo o médicos; deveria haver uma exceção. Numa avaliação pré-admissional( medicina do trabalho) ou periódica desses profissionais, que fosse lícito e medida compulsória  o médico atestador  comunicar diretamente à empresa sobre a incapacidade e proibição daquele funcionário de  exercer a sua atividade. Se assim tivesse sido feito, essa tragédia inominável com o voo Germanwings teria sido evitado. Quantas vidas e danos materiais se pouparia com um simples comunicado à direção dessa empresa de aviação sobre o veto desse copiloto em estar na direção de uma aeronave desse porte  .

Deixo portanto, essa sugestão ao nosso Conselho Federal de Medicina. Dessa forma poderemos evitar muitas outras tragédias por doenças psiquiátricas tão encontradiças, aqui, na Alemanha e no mundo! Nossos gestores e guardiões da profissão médica aqui no Brasil poderiam ser os primeiros com uma medida tão simples, mas altamente salutar na prevenção de tragédias tão impactantes para muitas familias e a sociedade.

(João Joaquim, médico articulista do DM. [email protected]  www.jjoaquim.blogspot.com)

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