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OPINIÃO

A revolução de 1964 (é possível outra hoje?)

É sempre oportuno lembrar fatos passados, para comparar a História. Reli o artigo “A Revolução de 1964”, do mano Osvaldo Póvoa, e o reproduzo no que interessa:

“Era então Presidente da República o sempre polêmico Jânio da Silva Quadros, eleito espetacularmente por aqueles que acreditaram no seu populismo, que empunhou a vassoura como símbolo de limpeza da corrupção que imperava na administração pública.

Ele renunciou em 25 de agosto de 1961, cerca de sete meses após a posse, forçado pelo que denominou ‘forças ocultas’, que só ele conhecia, empurrando o país para uma grave crise, pois o seu vice, João Goulart, era visto com muita desconfiança por grandes setores da nação, inclusive pelas Forças Armadas. Estando ele em viagem ao exterior, assumiu a chefia do Governo o Presidente da Câmara dos Deputados, Deputado Pascoal Ranieri Mazzili.

(...)

O Ato Adicional que instituíra o novo regime previa uma consulta plebiscitária para que o povo decidisse se desejava realmente o novo regime. Em face da grave crise que se alastrava por todo o país, o plebiscito foi antecipado, e o povo votou contra. A crise se agravou, greves foram deflagradas em todo o país, chegando a ponto de líderes grevistas se recusarem a cumprir determinações da Justiça, como ocorreu com a greve na Petrobras, que praticamente paralisou o país por falta de combustível... Ainda me lembro do que ouvi um dos líderes da greve dizer, após receber enviado da Justiça à entrada de uma refinaria:

- Nós é que mandamos aqui!

No dia 13 de março de 1964, realizou-se em frente à Central do Brasil, na Praça da República, no Rio de Janeiro, um grande comício, com a participação de grande massa popular, que se empolgou com os discursos inflamados de políticos, de sindicalistas de esquerda e do Presidente João Goulart.

(...)

Um grande movimento popular, encabeçado pela Igreja, denominado ‘Marcha da Família com Deus pela Liberdade’, levou às ruas do Rio de Janeiro uma grande multidão calculada em mais de um milhão de pessoas, temerosas da implantação de um regime sindicalista no país.

No dia 31 de março, um movimento militar com a participação dos governadores de Minas Gerais, São Paulo e Guanabara, determinou a tomada do poder. O Presidente João Goulart, que se encontrava no Rio de Janeiro, seguiu para Brasília e dali fugiu para o Uruguai, onde possuía fazendas e ali obteve asilo político. No dia seguinte, o movimento estava vitorioso. Uma junta militar escolheu para Presidente o Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco. A chamada Revolução de Março não fechou o Congresso, mas através de Atos Institucionais promulgados pela Junta Militar que assumira o poder e posteriormente pelos Presidentes de comum acordo com militares, cassou os mandatos de muitos parlamentares, assim como os seus direitos políticos, atos que atingiram também a muitos civis não parlamentares, além de militares simpatizantes do regime deposto.”

Transcrevi, no que interessa, o artigo para comparar a situação daquela época e a de hoje. Coincidentemente, nos anos sessenta, uma greve geral na Petrobras, e a corrupção de um regime sindicalizado, já eram um rastilho de pólvora para que as Forças Armadas interviessem.

A cara-de-pau dos meliantes de hoje busca afrontar todo mundo, porque conta com a proteção dos governantes. Por muito menos, corruptos que desviaram níqueis foram cassados e até banidos, embora se deva considerar que houve excessos. Hoje, com o aparelhamento bolivariano que se estabeleceu, principalmente no Judiciário, parece que está garantida a impunidade.

A Revolução de 64, a poder de atos de exceção, mexeu no Judiciário, aposentando até ministros do Supremo (Victor Nunes Leal, Hermes Lima e Evandro Lins e Silva), que não se curvaram diante dos excessos do regime. Houve uma atitude que marcou: a Revolução baixou um decreto-lei instituindo a censura. A oposição entrou com uma medida no STF, dizendo que aquela norma era inconstitucional, por atentar contra a liberdade de expressão, mas o Supremo decidiu que “não poderia se intrometer nos interesses da revolução”. Indignado com o posicionamento do Tribunal, o ministro Adaucto Lúcio Cardoso, que fora nomeado por Castelo Branco, levantou-se, retirou a toga e disse que nunca mais voltaria ao Supremo, solicitando sua aposentadoria na mesma sessão de 18 de março de 1971, logo após o julgamento.

Há uma grande semelhança entre o Brasil pré-1964 e o pós-2002, só que a situação agora é infinitamente mais grave. O povo sente, mas quem deveria ver faz que não vê.

O Brasil, que não espera uma atitude como a de Adaucto Cardoso no Judiciário, por falta de fibra de certos ministros comprometidos, aguarda de outros setores uma reação, que não seja a dos meros movimentos de rua.

(Liberato Póvoa, desembargador aposentado do TJ-TO, escritor, jurista, historiador e advogado, [email protected])

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