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Lula está perdendo a camada de treflon

Todos conhecem, e em de maneira particular as donas de casa, aquelas panelas e frigideiras de alumínio cobertas por um produto escuro chamado treflon, cuja utilidade é não permitir que a comida grude no fundo dos utensílios. Durante muitos anos cristalizou-se no seio da opinião pública a ideia de que o ex-presidente Lula era como treflon e, assim, nenhuma denúncia contra ele colava. Mas nem o treflon resiste se sobre ele for aplicada uma esponja de aço, quando então a vasilha perde a antiaderência.

Com Lula parece ter ocorrido coisa semelhante e, dias atrás, como se fosse para confiar que a verdade tarda mas não falha, a imprensa noticiou amplamente que o ex-presidente sabia sim de tudo sobre o mensalão. O provérbio é antigo entretanto não perde a atualidade e casa-se perfeitamente a recente episódio da vida política nacional, quando o governador de Goiás, Marconi Perillo, revelou de público que o então presidente Lula, apesar dos reiterados desmentidos do líder petista, sabia sim da existência do mensalão. E sabia porque o próprio Marconi contara a Lula, pessoalmente, sobre o esquema que aliciava parlamentares para engrossar a base aliada em troca de propinas pagas regularmente – daí o nome mensalão. O governador teve ciência da trama porque uma deputada federal goiana, do PSDB, tinha sido assediada para entrar no esquema, tendo recusado de pronto.

A revelação de Marconi caiu como bomba e deixou Lula, que, desde aquela época se esforçava para escapar do escândalo, introduzindo no cardápio petista de mentiras esfarrapadas o surrado “ eu não sabia de nada”, ainda mais em palpos de aranha.  Lula se beneficiaria com o instituto da dúvida que assiste os envolvidos na situação da palavra de um contra a do outro, para, da forma contraditória que caracteriza suas atitudes públicas, em uma hora admitir a existência do mensalão, do qual nada sabia e tendo sido traído pelos companheiros, e assim, pedir desculpas aos brasileiros – para, em ocasião a seguir, tentar fazer crer ao distinto público que o mensalão nunca existiu e que seria invenção de desafetos políticos.

Mitingueiro como sempre, Lula continuou batendo nessa tecla até mesmo depois que seus companheiros José Dirceu, Genoíno e companhia limitada foram condenados pela Justiça e trancafiados em razão dos crimes de corrupção praticados no esquema popularmente denominado mensalão.

E, retomando o provérbio inicialmente citado neste artigo, como se não bastasse a inconteste decisão condenatória do Supremo Tribunal Federal confirmando a existência do mensalão, identificando e condenando seus principais autores e atores à pena de prisão e de pesadas multas, surgiu a versão de que uma insuspeita testemunha teria confirmado  que Lula não só sabia de tudo como também se submeteu ao esquema criminoso. Trata-se de um amigo íntimo de Lula, o uruguaio José Mujica, que presidiu o seu país de 1999 até 31 do ano passado.

Apesar de desmentido por Mujica o episódio consta de um livro de memórias que acaba de ser lançado. Segundo os autores da obra Mujica revelou ter ouvido do próprio Lula, em tom confessional, que o mensalão existiu e que dele se valeu para governar o Brasil. O encontro teria acontecido em Brasília, em 2010. O ex-presidente do Uruguai assinalou que Lula justificou sua submissão ao esquema de propinas porque “era a única forma de governar o Brasil”.

A confissão de Lula não foi retirada do livro, de autoria dos jornalistas Andrés Danza e Ernesto Tulbovitz (há 17 anos acompanhando a vida de José Mujica) e teria sido presenciada pelo então vice-presidente uruguaio Danilo Astori. A obra relata que Mujica era um interlocutar privilegiado de Lula, tanto assim que soube, com bastante antecedência, que o petista lançaria Dilma como sua sucessora na Presidência. E fez por estratégia para se isolar dos indesejáveis efeitos do mensalão. “Lula preferia ser o poder nas sombras e, depois do mensalão, não ficar exposto demais”,  explica o amigo uruguaio. Ainda comentando sobre as memórias de Mujica, a imprensa está a noticiar que ele não vê Lula como um corrupto semelhante ao ex-presidente Collor de Melo e antecessores e sim como alguém que viveu esse episódio do mensalão “com angústia e  um pouco de culpa”.

A indiscrição de Mujica veio aumentar as agruras de um Lula que, a exemplo do Partido dos Trabalhadores, parece ter mergulhado em um inferno astral no pós-eleição de 2014 – despencando a popularidade  da qual, folgadamente, vinha desfrutando. O mesmo Lula, que, em sua própria definição, uma metamorfose ambulante, vem encontrando dificuldades cada vez maiores de se afastar não só do mensalão como de outro escândalo mais recente e volumoso – o “petrolão” . Agora, Lula passou a ser alvo de investigação do Ministério Público Federal sobre suposto lobby milionário em favor de grandes empreiteiras brasileiras no exterior, com o uso do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal.

A imprensa também noticiou que o próprio Lula, em um périplo por Brasília, admitiu a interlocutores que não está “numa fase muito boa” e que está vendo seu projeto de voltar à Presidência esfarelar-se diante de novas denúncias e do fato que o Ministério Público Federal passou a investigar uma possível participação direta dele no escândalo da Petrobras. As fontes dessas notícias dão conta de um Lula abatido e preocupado com os reflexos da anunciada delação do dono da empreiteira UTC, Ricardo Pessoa.

(Frederico Jayme Filho, advogado, chefe de gabinete do governador de Goiás, ex-secretário de Segurança Pública e ex-presidente da Assembleia Legislativa  e do Tribunal de Contas do Estado)

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