Home / Opinião

OPINIÃO

Minha mãe Genezi

Hoje venho falar de minha mãe, Genezy, reparando uma falha involuntária, de total silêncio a seu respeito, nem mesmo pela ocasião de seu centenário de nascimento, a exemplo das demais acadêmicas. Hoje, então, graças a esta linda iniciativa de nossa presidente, Elizabeth Fleury, carinhosamente chamada de Beth, venho, feliz, a falar sobre minha mãe.

Escrever não é fácil, como diz Clarice Lispector: “Não é fácil, é duro como quebrar rochas. Mas voam faíscas e lascas como aços espelhados.” E estas lascas, digo eu, são como as lembranças cheias de saudade, que nos ferem o coração. Então, sabemos, como já disse alguém, há palavras que choram, e lágrimas que falam. É preciso saber escutar. E nós, as filhas, não esqueceremos nunca a sua vontade de conseguir voltar a andar, agarrada ao corrimão do corredor de seu apartamento, onde havia barras nas paredes, para que ela pudesse tentar trocar os passos, após a paralisia que a atacou. Mas apenas conseguiu, com sua mãozinha livre, voltar a pintar, como nos tempos de mocidade, agora assistida por Sandra, sua professora, para que pudesse criar  seus lindos quadros, como na sua mocidade. Assim, por meio da pintura, como ela imaginou, entrar de manso nas moradas antigas de sua cidade Goiás, e estampar nas pedras de sua morada, sua estranha saudade, porque coladas a elas estavam seus sonhos, sua juventude e seu destino. Então, nada mais limitaria e a prenderia, com sua mão recriou o mundo.

Assim, ser humano especial, ela foi mais que escritora, mais que acadêmica, mais que professora, mais que artista plástica, ela foi um ser único; assim quero recordá-la, para sempre, na dignidade muda de seu silêncio, na doença que a prendeu durante longos oito anos, imobilizando-a na sua cadeira de rodas, onde passava os dias, e que tinha, como sentinela, um relógio que media o tempo de sua trajetória sofrida, o relógio da sala, onde ela fixava os olhos num quadro seu, à sua direita, retratando o seu quarto de solteira na chácara onde morou. E nunca ninguém saberá o que pensava ela, fixando aquele quadro, na dignidade muda de seu silêncio.

Assim, eu, agora, tecendo as palavras, sei que ela, eternamente adormecida, ouvirá esta minha tardia homenagem.

Como disse o poetinha em seu Poema de Natal: “Para isso fomos feitos: para amar e ser amados, para chorar e ser chorados; para enterrar os nossos mortos. Por isso temos braços longos para os adeuses, mãos para recolher o que nos foi dado.”

(Mariza de Castro e Silva Machado. Cadeira nº 13, cuja patrona é sua mãe)

Leia também:

  

edição
do dia

Capa do dia

últimas
notícias

+ notícias