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PDT 35 anos: o que comemorar?

“Nós viemos de longe”, já dizia inúmeras vezes Leonel Brizola. Em 1930, Getúlio Vargas destruía as arcaicas estruturas da República Velha e fazíamos uma Revolução. Nascia o conceito de Brasil que conhecemos hoje. Mesmo com o controverso Estado Novo, Getúlio Vargas junto com o povo brasileiro iniciava a construção de nossa identidade nacional. Tornou-se obrigatório o ensino primário (Ministério da Educação), reorganização de nossa economia (Ministério da Indústria e Comércio) e a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT – Ministério do Trabalho) até então inexistentes. Criou-se a Justiça Eleitoral e finalmente o voto secreto e o voto feminino, eliminando o voto de cabresto. Surgiu a Rádio Nacional e a popularização da música brasileira até então restrita ás elites. E um passo decisivo para a nossa industrialização: a criação da CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) e da CVRD (Companhia Vale do Rio Doce). Quando parecia que nossa bandeira realmente seria verde e amarela, interesses da elite brasileira e estrangeira fizeram Getúlio sair de cena em 1945. Com a “redemocratização” nascemos pela mão esquerda de Getúlio como Partido Trabalhista Brasileiro e concebido ideologicamente por Alberto Pasqualini. Assim, Getúlio retorna pelos braços do povo pelo PTB em 1950. Mesmo sob pressões golpistas de Carlos Lacerda e a UDN, consegue instituir uma plataforma nacionalista. Começa a limitar a remessa de lucros do capital estrangeiro no Brasil para o exterior, cria o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), CNPQ (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e a nossa maior conquista: a nacionalização do petróleo brasileiro com a criação da Petrobras. Os projetos da Eletrobras e Telebras já estavam prontos, mas mais uma vez os interesses estrangeiros e de nossas elites fizeram Getúlio dar um tiro no peito e adiar o Golpe Militar por 10 anos.

Quando achavam que este tiro mataria o trabalhismo brasileiro, eis que surgem João Goulart e Leonel Brizola. Brizola após eleger-se Prefeito de Porto Alegre em 1955, elege-se Governador do Rio Grande do Sul em 1958 e institui um governo revolucionário. Durante sua gestão constrói 6.000 escolas, qualifica 40.000 professores, matricula 680.000 alunos, encampa empresas estrangeiras deficitárias como a ITT (telefonia) e Bond and Share (eletricidade) e institui a primeira reforma agrária no Brasil. Enquanto isso, Jango após ser ministro do Trabalho de Getúlio Vargas, elege-se por duas vezes consecutivas vice-presidente da República, tendo inclusive mais votos que Juscelino Kubitscheck em 1955. Em agosto de 1961, Jânio Quadros renuncia ao cargo em agosto de 1961 e a UDN, Lacerda e os mesmos interesses conservadores articulam-se para impedir a posse de Jango. Até que Leonel Brizola do Palácio do Piratini em Porto Alegre junto com o III Exército realizam a “Campanha da Legalidade” e garantem a posse de Jango, mesmo sob o esdrúxulo dispositivo do Parlamentarismo. Em 1962 Brizola elege-se deputado federal pela Guanabara, sendo à época o mais votado do Brasil. Com o retorno do Presidencialismo em 1963, Leonel Brizola na Câmara Federal, Jango efetivamente na Presidência da República e Darcy Ribeiro no Gabinete Civil da Presidência, encaminhava-se às Reformas de Base. Reforma Agrária, Reforma Urbana, Reforma Educacional, Reforma Administrativa, Reforma Tributária e um maior controle da remessa de lucros para o exterior. Com o PTB, estávamos prestes a mudar o Brasil, mas finalmente os golpistas de 1954 conseguiram o seu intento. Deram o Golpe Militar de 1964 e não somente derrubaram o último governo trabalhista. Destruíram o futuro de várias gerações. Com a Ditadura, os trabalhistas dispersam-se. Quem ficou no Brasil, acabou absorvido pelo MDB (Movimento Democrático Brasileiro). Brizola, Jango e Darcy foram condenados ao exílio e perseguidos pela Operação Condor (cooperação militar entre as ditaduras sul-americanas e a CIA) sendo Jango assassinado na Argentina em 1976. Quase nos destruíram, mas como nas palavras de Brizola: “Somos como plantas do deserto. Uma única gota de orvalho é suficiente para nos alimentar”, em 17 de junho de 1979, em Lisboa, o novo PTB renasce sob o ingresso de Leonel Brizola e Darcy Ribeiro a Internacional Socialista através do primeiro ministro português à época Mário Soares através da Carta de Lisboa. Mas a Carta de Princípios do PT e a articulação conservadora de Ivete Vargas fazem Golbery do Couto e Silva sepultar a sigla PTB entregando-a a Ivete Vargas e a transformando numa legenda de aluguel. Carlos Drummond viu Brizola chorar em seu poema, mas como ele mesmo disse à época: “Renasceríamos mais fortes ainda”, em 25 de maio de 1980 nasce o Partido Democrático Trabalhista agora sob a bandeira do Socialismo e com a liderança de Leonel Brizola, Darcy Ribeiro, Alceu Collares, Neiva Moreira, Jackson Lago e a adesão do Cavaleiro da Esperança Luiz Carlos Prestes que foi o primeiro Presidente de Honra do PDT. Ainda recente, o PDT conquista o Governo do Rio de Janeiro com Leonel Brizola e Darcy Ribeiro como Vice. No Rio, assim como no Rio Grande do Sul, Brizola ao lado de Darcy inicia mais um projeto revolucionário na educação: os Cieps. As primeiras escolas de tempo integral no Brasil sofrem uma forte oposição da burguesia lacerdista da zona sul do Rio e da Rede Globo por integrar as comunidades sempre excluídas dos morros cariocas. A ideia é aproveitada e cria o Sambódromo que nada mais é que um Ciep disfarçado fora da temporada de carnaval. Em 1986 denunciou sozinho a farsa eleitoreira do Plano Cruzado e previu suas desastrosas conseqüências. Retornando as eleições presidenciais de 1989, Brizola e o PDT se candidatam a presidente da República. Não apenas o melhor projeto de nação, como também nossa história e experiência nos credenciariam a retornar ao Palácio do Planalto. Porém as mesmas articulações conservadoras e a imaturidade de Lula, PT e a esquerda abortaram o retorno dos trabalhistas ao projeto de Reformas. Em 1990, Brizola é eleito pela 2º vez governador do Rio de Janeiro contra a vontade da elite carioca e da Rede Globo. Neste Governo, Brizola dá continuidade aos Cieps chegando ao número de 500 “escolões”. Dá início ao projeto de Ginásios Públicos c construindo 78 unidades para alunos do ensino fundamental e médio. Faz a despoluição da Baía de Guanabara e realiza a Eco – 92. Mais um governo popular e contrária aos seus interesses, a Rede Globo e as nossas elites não perdoariam. Começaram fazendo uma associação descabida da imagem de Collor com Brizola e depois aos ataques caluniosos de Roberto Marinho em editorial de O Globo a Brizola que o mesmo ganhou direito de resposta no Jornal Nacional em 1994 amparado pela Justiça. Brizola acabou com a sua votação prejudicada nas eleições presidenciais de 1994 e as novas lideranças que deveriam em tese continuar o PDT, César Maia e Anthony Garotinho traem as bandeiras do trabalhismo, ambos aderindo à direita. Em seus últimos anos de vida, as candidaturas de Brizola (vice-presidente em 1998, prefeito do Rio de Janeiro em 2000 e senador do Rio de Janeiro em 2002) serviram como um foco de resistência e como espaço de denúncia para deterioração do Estado Brasileiro e consequentemente dos partidos políticos. Apoiou a eleição de Lula em 2003, mas teve a coerência de romper com este mesmo governo quando Brizola percebeu à adesão de Lula ao neoliberalismo e à mesma direita que tanto o perseguiu em vida. Antes de morrer, Brizola ao sofrer pressões dentro do PDT para reatar com Lula e o PT, Brizola declarou: “Um dia eu fecho esse partido e crio um movimento de libertação nacional.” Brizola nos deixa em junho de 2004 e prevendo infelizmente o nosso futuro.

Após a morte de Brizola, o partido parecia dar sinais que iria continuar o seu legado de independência com a campanha de Cristovam Buarque à Presidência da República em 2006. Mas a adesão ao projeto famigerado Lula/PT desde 2007 ocupando atualmente o Ministério do Trabalho mostra a incapacidade da atual Direção Nacional do PDT comandada por Carlos Lupi de colocar à disposição do povo brasileiro toda a carga histórica contida no PDT na atual conjuntura política brasileira. Hoje o PDT padece de um mal comum a maioria dos partidos políticos brasileiros: a ausência de democracia interna e autoritarismo das direções partidárias. O PDT desde sua fundação sempre pautou seus congressos e encontros na figura de delegados, mas Brizola sempre fazia questão de abrir as plenárias do PDT para a militância e contemplá-los nas instâncias partidárias. O mesmo acontecia com uma eventual oposição. Hoje as plenárias do PDT são concentradas nas figuras de dirigentes e parlamentares que em muitos casos não representam as nossas bandeiras, interessados apenas em uma legenda para se elegerem como típicos políticos profissionais e dirigentes interessados consequentemente em suas benesses e cartórios. Assim a militância pedetista outrora forte, vem sendo enfraquecida ano a ano, a ponto de na última reunião da Direção Nacional do PDT no Rio de Janeiro, ser relegada a ficar do lado de fora do Diretório assistindo a reunião por um telão. Algo simplesmente ridículo em tratando-se de um partido que se denomina socialista. Os nossos movimentos partidários que já foram orgulho para o PDT, hoje estão fracos e burocratizados. A Fundação Leonel Brizola – Alberto Pasqualini e a Universidade Leonel Brizola não cumprem sua função de formação política dentro do partido. Abandonaram o Projeto Brasil Trabalhista iniciado por Brizola que seria o Projeto de Nação do PDT para o Séc XXI e funcionam apenas como uma espécie de cursinho preparatório para candidatos em período eleitoral. A Juventude Socialista que já funcionou como uma força motriz à esquerda do partido muitas vezes questionando o próprio Brizola, hoje encontra-se com um presidente velho, fraco, inábil, sem qualquer requisito mínimo para ocupar um espaço de liderança no próprio PDT, além de ser vulnerável a ações intervencionistas de parlamentares e dirigentes estaduais e que tenta prorrogar seu limite de idade para se perpetuar no poder. Nos Estados, apenas no Rio Grande do Sul que é berço do trabalhismo, o PDT mostra força e um nível de organização. No Rio de Janeiro, já foi o maior partido do estado. Hoje é a 5ª força e aliados ao PMDB inimigo histórico dos trabalhistas cariocas e fluminenses. Em Goiás pode-se considerar um dos casos mais gritantes. O PDT aqui mais parece a UDN de Carlos Lacerda e é respaldado pelo Presidente Carlos Lupi e a Direção Nacional do PDT que nada tem a ver com um partido que integra a Internacional Socialista.

A verdade é que o PDT parou no tempo. Nega-se a debater uma proposta para eleições diretas e admite-se um presidente há 11 anos em um partido democrático e socialista como se fosse um déspota esclarecido, criando uma auto-suficiência entre os dirigentes nacionais que através de sua história pensam que o PDT é um partido intocável. Nestes 11 anos não foi feita nenhuma autocrítica da conduta ideológica do partido. Nossas bandeiras estão sendo abandonadas e substituídas por retóricas vazias e sem qualquer fundamento. Sem formação política, cria-se uma militância alienada ao aparelho partidário e sem personalidade. Não à toa que caímos na dicotomia burra entre PT x PSDB caindo na vala comum dos partidos em cheque das Jornadas de Junho de 2013. Muitos trabalhistas estão fora do partido pela impossibilidade de defender o legado de nossos principais líderes e por isso nos afastamos cada vez mais das lutas populares e caímos na mais profunda vaidade inútil. Se Brizola fosse vivo hoje com certeza seria expulso do PDT por sua rebeldia e coerência. Nosso passado é belo e glorioso, nosso presente inútil e vergonhoso e nosso futuro é sombrio e incerto.

O PDT chega aos 35 anos. O que comemorar? Nossas contradições nos afastaram do povo. Apegamos-nos ao passado e nos esquecemos de construir o nosso futuro. Quem tem o maior Presidente da História do Brasil que é Getúlio Vargas, o presidente que apresentou a maior agenda de reformas no menor espaço de tempo que é João Goulart e o maior líder político brasileiro da segunda metade do séc. XX que é Leonel Brizola não pode se contentar com filhotes da ditadura e laranjas podres infiltrados em nossas fileiras. Neste momento de crise das instituições políticas, o PDT deve abrir suas portas ao povo com humildade e simplicidade como foi às origens de nosso fundador. Brizola vive nos militantes descentes e honestos dentro e fora do PDT. Nos poucos parlamentares que dignamente representam o legado do trabalhismo, pois é este trabalhismo que é o verdadeiro caminho para o socialismo.

(Yuri Brandão - Fundador do Fórum Trabalhista Independente, fundador dos grupos PDT e JS - PDT no Facebook, liderança nacional da Juventude Socialista do PDT, filiado ao Partido Democrático Trabalhista e bacharel em Direito pela PUC/Goiás)

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