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OPINIÃO

Pobres de nós, professores...

Não sei com precisão quando aconteceu, mas, um dia, anunciaram (impingiram?) ao mundo que o magistério é uma profissão nobre em razão de ela ser, ao mesmo tempo, arte e missão.

A partir dessa afirmação, fundamentou-se que, para o seu exercício, é necessário talento, desprendimento e altruísmo, ou seja, aptidão inata e virtudes inquestionáveis. E foi assim que, por séculos afora, ficou delineado o perfil do professor, retrato ideal de educador, que persiste ainda hoje.

Não se pode negar que é grandiosa a representação do profissional do ofício de ensinar como artista e missionário, simultaneamente. Entretanto, no momento em que se vive um grande desrespeito pelos professores e, refletindo sobre o que realmente se passa, agora, na prática do magistério, esta suprema qualificação deixa de ser louvor para se transformar em obstáculo.

É bem verdade que dá pena dispensar traços assim engrandecedores, porém, convenhamos, dependendo da hora e do lugar, eles se tornam requisitos irônicos, até mesmo zombeteiros.

Eu, que fiz carreira no magistério, pois comecei como professora de curso fundamental, na época chamado curso primário, depois professora de primeiro e segundo graus e me aposentei como docente de curso superior, tenho motivos acertados para dizer: pobres de nós, professores, que escolhemos uma profissão não merecedora de ganho real, menos ainda lucrativa e que, no momento atual, é alvo de profundo desrespeito, até dos alunos.

Por todo Brasil, em todos os níveis, é sentido o descontentamento dos professores, principalmente, em relação às condições de trabalho. E eu questiono a demora da sua solução. Por que os políticos não priorizam e atendem rapidamente as reinvidicações dos professores, que, por sinal, são justíssimas?

Será que a demora da atenção é para deixar claro que não fica bem para os estigmatizados ‘missionários’ reclamarem por vantagens e bens tangíveis, ainda mais quando se está ciente de que uma das maiores qualidades do seu ofício é o seu desinteresse por vantagens materiais?

Ou para mostrar que, hoje, os professores apegam-se mais às próprias ambições do que à relevância de um ideal?

Será para a sociedade acreditar que pensar em melhores condições, sobretudo se relacionadas com moradia, alimentação, vestimenta, aperfeiçoamento intelectual, tudo isso soa rasteiro e sem nobreza para quem traz dentro de si, como valor maior, a realização de uma missão?

Sob esta atmosfera de desmerecimento, faço uma pergunta: quanto vale o trabalho de um professor?

Por experiência própria, respondo prontamente: quase nada, para não fechar a questão em nadica de nada. Todavia, deveria ser bastante valorizado, pois inúmeros estudos concluiram que somente a educação é capaz de transformar uma sociedade, de reduzir a desigualdade e de dar chance igual para todos.

O tempo passa e cada vez mais que atento para o poder da palavra, mais me convenço da habilidade de quem a manipula. Missão e Arte... duas faces de uma mesma moeda, definindo o papel do professor. Privilégio? Valorização? Pode ter sido.

Se é horrível assistir professores serem agredidos violentamente quando reclamam seus direitos, pior ainda é sentir a morosidade política para resolver uma questão que é fundamental para a evolução da nação.

Desconfiada, ainda pergunto: _ A demora não será também uma manobra?

Paulo Freire, um dos maiores educadores do Brasil, assim aconselhou: Apesar de mal remunerados, com baixo prestígio social e responsabilizados pelo fracasso da educação, grande parte dos professores resiste e continua apaixonada pelo seu trabalho. Aos professores, fica o convite para que não descuidem de sua missão de educar, nem desanimem diante dos desafios, nem deixem de educar as pessoas, pois, se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela, tampouco, a sociedade muda.

Portanto, professor, não desanime. Confie na força da sua vocação, acredite na sua luta e, sobretudo, não se acanhe. Arregace as mangas e exija o que lhe é devido, sempre que for preciso!

(Heloisa Helena, escritora)

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