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A saga dos Guimarães na pecuária de Goiás

Sílvia Helena Guimarães, ao narrar a história de Os Monteiros Guimarães na História do Planalto Central, discorre também sobre o pioneirismo desta família sobre a criação dos primeiros animais curraleiros e o posterior melhoramento genético com a raça Tabapuã. Em seu livro, a historiadora expõe que a família Guimarães, tradicional em Goiás, partiu de Portugal para aportar no Planalto Central ainda no Brasil Colônia.

A família de Monteiro Guimarães, segundo a historiadora, foi formada por cavaleiros que participaram da luta pela independência portuguesa. Os seus patriarcas foram condecorados com o Brasão das Armas em 1494. A família é originária de Dom Martinho Guimarães, com ligação ao El Rei. Seus descendentes tiveram participação direta no processo de colonização do Planalto Central. Entre os episódios relevantes sobressaem as Entradas e Bandeiras, com a liderança do legendário Anhanguera.

Após tomar a galera na praia da Saudade, no Tejo, os irmãos Guimarães desembarcaram em Salvador. Pelo Caminho da Escravaria aportaram na região do Planalto Central. Enfrentaram as intempéries e adversidades naturais da época, passando pelo rio São Francisco chegaram ao novo destino. Se havia a “febre do ouro”, eles continuaram fiéis às suas origens agropastoris.

Nesse trajeto, eles pararam em Catalão, província de minerais, e posteriormente em Formosa. Nesta cidade suas vidas mudariam a então estratificação econômica e financeira da região. Isto, porque ocorreu uma peste que dizimou o plantel eqüino e de muares. Esses animais passaram a ter uma valorização incomum decorrente da lei da oferta e da procura. Eram vendidos ou trocados por ouro e diamantes.

Silvia refere-se ao Cerrado de Goiás, do clima, das árvores como o ipê, jatobá, mogno, jacarandá, aroeira e o pau ferro. Observa, ainda, que grandes bacias fluem para a Amazônia, para o São Francisco e Platina. Discorre sobre as diversas expedições colonizadoras em direção ao Centro-Oeste e até de missionários em 1625 na região, sob a chefia de Cristóvão de Lisboa. Se havia a procura do ouro, havia também a busca dos índios, através do rio Tocantins.

Se as pessoas fundam vilarejos, que posteriormente se transformam em cidades, é lógico que a sua população precisa de alimentos. Sílvia Helena Guimarães observa muito bem em sua obra que o gado vacum, cavalos e muares foram instalados inicialmente no litoral. Os animais eram criados soltos em locais nas proximidades das povoações. “Ao pé dos engenhos, das casas de farinha, comendo olho de cana e pisoteando mandiocais e milharais, incomodando os donos das plantações e roças, fazendo grandes estragos e gerando conflitos, às vezes até sangrentos, entre plantadores e criadores”, expõe a escritora em seu livro sobre a saga dos Guimarães.

Essa situação foi provocando gradualmente maior interiorização do rebanho, conforme observa. Na ocupação dos sertões de Goiás e do Mato Grosso, as manadas contribuíram para a ocupação da vasta extensão territorial brasileira.

Em Formosa, José Monteiro Guimarães e Thereza da Fonseca Borba Gato instalam-se na Fazenda Santo Antônio dos Guimarães, município de Formosa. O casal começa a criação de gado e de equinos. A terra é considerada fértil e a historiadora reconhece que a pecuária desempenhou grande papel na economia colonial. Na verdade, além da carne, fornecia à população couro para arreios, selas, roupas, telhados, portas e móveis. Os animais serviam ainda para o transporte do ouro das minas, entre outros serviços.

Gradual e rapidamente, as fazendas foram se formando ao longo das estradas. A imensidão das terras se constituía em verdadeiros convites à criação de gado. As boiadas eram numerosas. As fazendas exigiam, como hoje, vaqueiros exímios no uso do laço. Ao vaqueiro exigia dinâmica, coragem e destreza. Os animais viviam soltos, muitas vezes se embrenhavam nas matas, dormindo ao relento e alimentando-se das ofertas da natureza e de suas roças. O vaqueiro bebia água da fonte, banhava-se nos rios e comia carne no calor do braseiro, conforme narra Sílvia com riqueza de detalhes. O vaqueiro conhecia a propriedade nos mínimos detalhes e com o cavalo ele se identificava plenamente.

Bernardo Guimarães abriu até estradas escoamento da produção no vale do Paranã numa demonstração de que seus criatórios e as minas de ouro prosperaram. A historiadora ressalta que os Guimarães eram “apaixonados pelo campo, pela terra, pelos animais”. Eles viajaram por esse sertão adentro até às fronteiras com a Bolívia, com tropas que eram vendidas a peso de ouro.

Eles transpunham muitos dos locais pioneiros em canoas conduzindo alimentos produzidos por suas fazendas. Nas fazendas dos Guimarães, o rebanho se reproduzia e garantia a alimentação das minas de ouro e das vilas mais próximas. A família plantava grandes lavouras de milho, mandioca, forneciam couro para arreamento, cavalos para transportes e para serem vendidos em diferentes regiões.

Esses animais eram negociados além das divisas goianas, numa confirmação de que, além de bons fazendeiros, tornaram-se bons negociantes. Seu gado era vendido em Sorocaba (SP), notável feira na época, Mato Grosso e Minas Gerais. O gado da região era o curraleiro, descendente da raça Mirandesa da variedade Beiroa, da península ibérica. Em 1907, Salviano Monteiro Guimarães introduz em seu rebanho touros indianos, adquiridos do pecuarista José Gomes Louza, de Silvânia. Deu início, assim, ao surgimento, pela primeira vez na história da Zoologia, a raça Tabapuã, cruzamento da variedade curraleira mocha, de origem européia com bois indianos multimilenar em sua origem.

Pelo que se visualiza, hoje, as minas de ouro foram esgotadas, mas a pecuária representa uma riqueza em plena ascensão no Centro-Oeste do Brasil. E, sem dúvida, deve-se isso a desbravadores e empreendedores como os Guimarães.

(Wandell Seixas, jornalista voltado para o agro, ex-bolsista em agropecuária pela Histradut, em Tel Aviv, Israel, bacharel em Direito e Economia pela PUC-GO, autor do livro O Agronegócio passa pelo Centro-Oeste e assessor de imprensa da Emater-Goiás)

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